O amanhecer chegou tingindo o céu de tons pálidos, mas a paz da floresta tinha sido quebrada muito antes disso. Os uivos de Viktor e seus guerreiros ecoaram por toda a mata, espalhando o cheiro de sangue e vingança no ar. Os caçadores seguiam rastros, destruindo tudo em seu caminho.
Lysandra permanecia na clareira, os braços envolvendo os joelhos, os olhos baixos enquanto o calor do corpo de Aric ainda a envolvia. Por um breve instante naquela madrugada, ela se permitira acreditar que o mundo poderia ser diferente. Que podia haver liberdade. Que podia haver amor.
Mas ambos sabiam que o preço viria.
Aric se agachou diante dela, tocando seu rosto com suavidade.
— Eles virão por você, Lysandra. Não posso protegê-la de todos, não esta noite.
Ela ergueu os olhos para ele, o coração apertado.
— Eu não me importo. Se for para viver acorrentada, prefiro morrer aqui, com você.
Aric a beijou de leve, um gosto agridoce de desespero e ternura.
— Eu vou lutar por você. Mas agora, você precisa correr.
Antes que pudesse responder, um som de galhos rompendo-se e passos apressados os alertou.
Foi então que Helena surgiu, os olhos ardendo de fúria e medo, acompanhada por dois guerreiros da matilha. Um olhar só bastou para que a dor atravessasse Lysandra como uma lança.
— Mãe…
— Cale-se! — gritou Helena, e num movimento ágil, lançou uma corrente de prata sobre o pescoço da filha.
O contato queimou a pele de Lysandra, que urrou de dor, caindo de joelhos.
Aric avançou, em forma humana, os olhos dourados cintilando.
— Não toque nela!
Um dos guerreiros sacou a lança, mas antes que pudesse atacar, Aric se transformou num lobo gigantesco, avançando sobre o homem com uma força brutal. Os dois rolaram pela clareira, sangue e pelos se misturando ao solo encharcado.
Helena se aproximou de Lysandra, os olhos marejados, mas duros.
— Você nos desonrou. Traiu sua matilha… e a mim.
Lysandra tentava lutar contra a corrente, mas a prata drenava suas forças.
— Mãe… eu só queria ser livre.
Helena tocou o rosto dela com a ponta dos dedos, a expressão amarga.
— Liberdade, minha filha, é um luxo que nós, filhas de alfas, nunca tivemos.
Um segundo guerreiro golpeou Aric com uma lança de prata, fazendo-o recuar, ferido, mas não abatido.
Os olhos dele se encontraram com os de Lysandra pela última vez naquela madrugada. E neles havia uma promessa silenciosa.
"Eu vou te encontrar."
Helena deu ordem aos homens:
— Levem-na. Para o cativeiro.
Lysandra gritou, mas a corrente apertou, e logo desmaiou.
Quando os olhos se abriram novamente, estava em uma câmara subterrânea da aldeia. As paredes de pedra úmida e o cheiro de terra abafada denunciavam o cárcere. No tornozelo, uma argola de ferro, presa por uma corrente curta.
A única luz vinha de uma pequena abertura no alto.
Lysandra tentou se levantar, mas o corpo doía, e a prata queimada em sua pele ainda ardia.
As lágrimas brotaram, e ela encostou a cabeça na parede fria.
Foi então que ouviu o som de um uivo distante. Aric. A voz selvagem dele cruzando a noite.
Lysandra sorriu, mesmo com a dor.
Ela sabia.
Aquela história ainda não tinha acabado.
E quando a lua voltasse a subir, eles iriam se reencontrar — nem que precisassem derramar o céu e a terra para isso.