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Capítulo - 11 O Retiro Que Quase Deu Certo

Emilyke notou a ausência de Umberto assim que acordou, mas curiosamente não sentiu falta. A solidão naquela manhã não parecia hostil, e sim bem-vinda. Sentou-se à mesa com aquele sanduíche simples, completando o café da manhã com um chá de camomila que encontrou entre as poucas opções no armário. Bebeu em silêncio, contemplando a dança lenta do vapor que subia da caneca.

O sabor era discreto, quase apagado, mas tinha algo de reconfortante. Naquela calmaria, Emilyke se entregou a um raro momento de reflexão. Estava mesmo ali, cercada de árvores, longe dos arranha-céus, das buzinas e das taças de cristal. E, de maneira inesperada, não era ruim. Enquanto levava o último gole à boca, um som do lado de fora chamou sua atenção. Algo caíra na água...ou saltara dela. Peixes? Ela levantou, curiosa, aproximando-se da grande janela que dava vista ao rio.

E foi então que ela o viu.

Umberto, em seu estado mais... natural, dava pulinhos desajeitados na água fria, tentando mergulhar com a empolgação de um adolescente. Cada tentativa rendia um respingo alto e uma risada solta, como se o mundo inteiro tivesse deixado de existir e só sobrasse, naquele momento, leveza e liberdade.

Emilyke arregalou os olhos com uma certa incredulidade. A primeira reação foi o espanto, claro... ele está nu!!!! mas, depois, um sentimento de leveza cresceu em seu peito. Uma mistura de surpresa divertida e alívio.

A vida ao lado de Umberto, por mais caótica que parecesse às vezes, nunca era entediante.

Riu sozinha. Fechou a cortina com delicadeza, como quem guarda um segredo.

Depois, pensativa, foi até o quarto, vasculhou a mala e encontrou seu biquíni. Por que não?

Minutos depois, descia em direção ao rio, envolta por um roupão branco e o rosto levemente rosado, tocado por um raio de sol que ousava fugir entre as folhagens, dando cor e leveza para a pele branca. Talvez aquele dia tivesse mais a oferecer do que ela imaginava.

Ao descer as escadas de madeira rangente, ainda amarrando o nó do roupão, Emilyke teve sua atenção capturada por um barulho suave, quase imperceptível, vindo da lateral da varanda. Algo se mexia ali perto.

Curiosa, aproximou-se devagar.

Entre folhas secas e um punhado de penas espalhadas, um pássaro de plumagem azul-acinzentada se debatia fracamente. Era pequeno, mas algo em sua postura torta e no tremor quase incontrolável denunciava: ele havia caído, talvez de um galho muito alto, e estava gravemente ferido.

Emilyke se ajoelhou, instintivamente.

Ela estendeu a mão, hesitante, e tocou com suavidade a lateral do corpinho quente.

— Que nojo... — murmurou, franzindo o rosto.

Então retirou a sandália, em um gesto tão cruel quanto impulsivo, ela golpeou o animal com toda força possível. Uma, duas, três vezes. Até que o som das asas batendo cessasse. Até que a vida se esvaísse.

Ficou parada, ofegante, observando o que havia feito.

O as penas estavam espalhadas entre as ripas de madeira da varanda. A realidade daquilo que fizera demorou um instante para assentar. Mas em vez de desespero, o que sentiu foi controle. O mesmo controle de sempre, de quando moldava suas palavras para manipular situações. Agora nada era diferente, pois o domínio era o mesmo.

E então gritou.

— Umberto!

O grito soou carregado de dor. Um lamento agudo saiu das suas cordas vocais.

Umberto surgiu correndo pela trilha lateral, ainda com os cabelos molhados do mergulho no rio, preocupado.

— O que houve?! — perguntou, aproximando-se.

Ela estava ajoelhada ao lado do pequeno corpo, as mãos tremendo e os olhos marejados.

— Ele… caiu! Eu vi quando despencou do galho e então eu o encontrei assim! Estava se debatendo… eu tentei fazer alguma coisa, mas… já era tarde.

Umberto se agachou ao lado dela, observando a cena com expressão pesarosa.

— Puxa… — disse, tocando com cuidado as penas sujas de sangue. — Deve ter batido no vidro… é bem comum.

Ele respirou fundo.

— Você tentou, Emily. Não se culpe. Essas coisas acontecem. A natureza é assim... linda, mas também cruel.

Ela apenas balançou a cabeça, limpando as lágrimas que jorravam dos seus olhos azuis. Umberto não fazia ideia.

E naquele momento, enquanto ele se erguia para pegar uma pá de jardinagem para cavar uma cova sob a árvore próxima, Emilyke desceu as escadas em direção ao rio.

Após o rápido enterro do pássaro.

As lágrimas secaram, a expressão entristecida deu lugar à sua postura habitual de elegância.

— Acho que vou pegar um pouco de sol, — disse casualmente, ajeitando os óculos escuros no rosto como se nada tivesse acontecido minutos antes.

— Claro! — respondeu Umberto, sorrindo com empolgação. — A água está perfeita, você vai amar.

Ela apenas assentiu com um leve aceno de cabeça, pegou uma toalha e seguiu em direção ao deck de madeira à beira do rio. O local parecia ter sido feito sob medida: um espaço plano, envolto por árvores altas, o som leve da água corrente e o canto de alguns pássaros.

Estendeu a toalha com cuidado e se deitou, deixando que o calor suave do sol aquecesse sua pele. Havia algo terapêutico naquele silêncio quebrado apenas pelas risadas de Umberto ao longe.

Ele se jogava na água como uma criança. Nadava, mergulhava, ria alto e por vezes olhava na direção dela, tentando chamá-la com gestos exagerados e frases como:

— Vem! Tá uma delícia! Você vai se arrepender se não entrar!

Emilyke sorriu de leve, mas não se moveu. Estava aproveitando à sua maneira. O sol filtrava-se pelas copas das árvores e acariciava sua pele com delicadeza. Sentia-se confortável... e por ora, em paz.

Talvez fosse o calor sobre a pele. Ou o chá da manhã. Ou ainda a oportunidade de estar longe do barulho da cidade. Mas mesmo carregando o peso do que fizera, Emilyke relaxou, fechou os olhos e se entregou ao momento. Um momento delicioso. Quase perfeito.

Depois de alguns minutos ao sol, Emilyke se levantou com um suspiro resignado. Tirou os óculos escuros, ajeitou o biquíni e caminhou lentamente em direção ao rio. A água parecia agradável, e talvez, pensou ela, bastasse um mergulho para convencer Umberto a sair logo dali e voltar para o conforto do chalé.

Ao vê-la se aproximar, Umberto vibrou de alegria.

— Ahá! Eu sabia que você não resistiria! — exclamou, girando dentro do rio seguido por uma cambalhota jogando água para o alto.

Emilyke entrou com cautela, molhando-se aos poucos. Mal seus pés tocaram a parte mais funda, Umberto lançou um jato d’água direto em sua direção, rindo alto como um adolescente.

— Guerra de água! — gritou ele, lançando outra rajada com as mãos.

Ela levou um choque com o gesto, sentindo a água fria respingar em seu rosto e cabelo. Estacou. Seus olhos endureceram. A postura, antes relaxada, tornou-se tensa e defensiva.

— Para! — gritou, erguendo os braços como se tentasse bloquear um ataque.

Umberto parou, confuso, ainda sorrindo, sem perceber a gravidade da situação.

— Amor... é só uma brincadeira. Todo mundo faz guerra de água. Por que você tá assim?

— Todas as pessoas, quem?! — ela retrucou, a voz em tom alto, quase um grito. — Você me molhou inteira, Umberto! Está rindo de mim? Isso é grosseiro!

— Grosseiro? Mas, Emilyke, eu só... — tentou argumentar, mas ela já havia se virado.

Sem esperar resposta, ela saiu da água furiosa, caminhando a passos firmes de volta ao chalé. A cada passo, sua raiva aumentava, assim como sua sensação de inadequação naquele ambiente.

Umberto ficou parado no rio, boquiaberto, ainda com gotas escorrendo pelo rosto. A alegria da manhã evaporava como vapor sob o sol, deixando no ar uma dúvida amarga: como algo tão simples se transformou tão rápido em mais uma parede entre os dois?

Dentro do chalé, Emilyke jogou-se no sofá com força, bufando. A raiva ainda pulsava em suas têmporas, e um incômodo insistente começava a tomar conta do seu corpo. Coçava o braço. Depois o pescoço. As pernas. O peito.

— Ai, que droga!... — murmurou, se levantando e indo até o espelho.

Ao encarar o próprio reflexo, teve um susto: seu rosto estava salpicado de manchas vermelhas. As pintas se espalhavam pelo colo e braços, como uma colônia de minúsculas erupções. As costas estavam completamente marcadas.

— Mas o que é isso?! — gritou.

O motivo ficou claro em segundos: enquanto estava deitada ao sol, os mosquitos haviam feito um verdadeiro banquete. Devia ter esquecido de passar repelente — quem traz repelente para uma viagem surpresa, afinal?! — pensou com raiva.

Do lado de fora, Umberto caminhava de volta ao chalé, com a pele do rosto visivelmente queimada pelo sol. A alegria havia se transformado em ardência. Ele coçava o ombro, resmungando algo sobre protetor solar, quando escutou um barulho dentro da casa. Preocupado, apressou o passo.

— Emilyke? Tá tudo bem? — chamou, já abrindo a porta.

Só que ele não viu o degrau logo à frente.

Seu pé enroscou, o corpo tombou para frente e — PÁF! — o nariz foi direto contra a quina da porta. Um estalo seco ecoou pelo chalé.

— AAAARGH!

O grito foi tão alto que Emilyke pulou no sofá, os olhos arregalados.

— O que foi isso agora?!

Ela correu até a entrada e deu de cara com Umberto agachado, as mãos no rosto, o nariz sangrando, os olhos marejados de dor.

— Ai, meu Deus, você tá sangrando! — exclamou ela, esquecendo por um instante das manchas que coçavam.

— Eu... só queria ajudar... ouvi o barulho e corri para ver... eu tropecei... — gaguejou ele, tentando conter o sangramento.

Ela o olhou de cima a baixo. Ele, com o rosto vermelho de sol e o nariz ensanguentado. Ela, coberta de manchas e picadas, parecendo uma pintura expressionista descontrolada.

— Chega! Eu quero ir pra casa.

— Mas... o final de semana ainda não acabou...

— Eu estou coberta de picadas, você quebrou o nariz, eu não dormi nem duas noites direito, o passarinho morreu, você fez guerra de água comigo, e agora... agora isso aqui — disse, puxando a barra da própria blusa e apontando as manchas vermelhas parece sarampo, dengue e catapora ao mesmo tempo!

Umberto, ainda com gelo no nariz, abriu a boca para tentar responder, mas se calou. Era impossível argumentar com tanta coisa dando errado.

Com pesar, ele acenou com a cabeça.

— Tudo bem... Vamos embora amanhã cedo. Dois dias é o suficiente. — Suspirou.

No momento em que ele foi recolher suas roupas jogadas no canto da sala para arrumar as coisas, sentiu algo estranho dentro do bolso do short que havia deixado pendurado desde o dia anterior.

— Ué... o que é isso? — murmurou.

Colocou a mão no bolso e retirou um punhado de pequenos cogumelos, já meio murchos, mas ainda visivelmente frescos. Seus olhos brilharam.

— Ahhh! Eu sabia! Sabia que tinha colhido ontem! — exclamou, orgulhoso.

Ele se virou e foi em direção à cozinha, empolgado como quem exibe um troféu.

— Emilyke! Olha o que eu achei! Lembra que falei dos cogumelos? Achei! Estavam no meu short o tempo todo!

Ela, já preparando uma bolsa com os itens de higiene, virou-se para ele — e congelou.

— O que é isso?

— Os cogumelos que eu falei!

— Você... você colocou isso no bolso?! Você quer morrer?!

— Quê? Mas... são cogumelos do mato, pareciam inofensivos.

— Espera. A gente vai pesquisar agora.

Pegaram o celular. Umberto digitou com dificuldade — o gelo ainda sobre o nariz. Após alguns minutos, o veredito:

Cogumelos silvestres com pontos brancos, caule oco e superfície viscosa , altamente venenosos. Podem causar alucinações, vômitos e, em alguns casos, parada respiratória. NÃO INGERIR.

Emilyke jogou o telefone em cima da mesa.

— Eu sabia! A gente ia terminar esse fim de semana... mortos.

Umberto olhou para os cogumelos ainda na mão, depois para Emilyke. Em silêncio, caminhou até a lixeira e jogou todos de uma vez.

Ela cruzou os braços e o encarou.

— Sabe o que eu acho? Essa antecipação foi um sinal do universo. Pra gente sair daqui com vida.

— É... Talvez a floresta não seja o nosso habitat.

— Concordo plenamente.

O silêncio pairou por um instante, até que ambos se entreolharam, e riram, mesmo que de forma nervosa.

No fim, as malas foram fechadas, os mosquitos deixados para trás, e a floresta ficou para contar histórias de dois aventureiros urbanos que quase se destruíram em meio à natureza, se não fosse pela internet...

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