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Capítulo 3 — Ecos da Noite

(POV Selene)

O silêncio aqui dentro é quase pior que o lá fora.

O ar é pesado, como se estivesse esperando alguma coisa. Ou alguém.

Dorian não fala. Só caminha até a mesa, pega uma garrafa de vidro escuro e um copo que parece não ver água há meses. Ele se move como se cada passo tivesse um propósito — firme, calculado, perigoso.

Eu fico ali, em pé no meio do depósito, abraçando o próprio corpo como se fosse uma barreira. E, por um segundo, penso em correr. Mas para onde? Eu nem sei onde estou.

— Senta, Selene. — Ele não olha para mim quando fala, mas o tom não é um pedido.

— Eu não... — Minha voz sai baixa demais, quase um sussurro. — Eu não sei se devo.

Ele levanta os olhos, e é como se a sala inteira prendesse a respiração.

Então, devagar, arrasto a cadeira mais próxima e sento.

— Boa garota. — Ele se encosta na mesa, cruzando os braços. — Agora, vamos começar do início.

Minha pele arrepia com o jeito que ele fala. Não é bem um elogio, mas também não é desprezo. É... algo no meio.

— Eu não sei de nada — murmuro, apertando as mãos no colo. — Eu só trabalho, estudo e... tento não enlouquecer.

Dorian solta um riso curto, seco.

— Tentar não enlouquecer não é o mesmo que não estar quebrada, Selene.

Eu engulo em seco. Ele tem razão, e isso me assusta mais do que tudo que aconteceu hoje.

Antes que eu consiga dizer qualquer coisa, um barulho forte preenche o espaço. Portas se abrindo com força, passos apressados, vozes graves.

— Dorian! — Um homem surge no corredor. Alto, ombros largos, expressão fechada. — Trouxe ela?

Ele para na porta quando me vê. Os olhos dele percorrem meu rosto como se estivessem medindo cada detalhe. É um olhar frio, calculista, como quem avalia se eu valho o risco que eles estão correndo.

— É ela. — Dorian não desvia o olhar de mim. — Selene.

— Ela parece... frágil. — O homem franze o cenho, quase em desaprovação. — Tem certeza?

— Tenho. — Dorian responde com um tom que não aceita discussão. — E não repita isso na frente dela.

O outro ergue as mãos em rendição, mas um sorriso irônico dança nos lábios dele antes de sair da sala.

Meu coração está disparado. Eu não conheço esses homens, mas sinto que eles me conhecem de alguma forma.

— Quem... quem era ele? — pergunto, tentando controlar o tremor da voz.

— Ronan. — Dorian responde, como se isso explicasse alguma coisa. — Ele não confia fácil.

— E você? — pergunto antes de conseguir pensar. — Você confia?

Ele me encara por um segundo longo demais.

— Eu confio no que vejo. — A resposta é vaga, mas carrega um peso que não sei decifrar.

Antes que eu possa pressionar mais, outro som ecoa pela sala: passos leves, quase silenciosos. Quando olho para a porta, vejo um homem mais jovem, de olhos claros demais para serem reais, observando cada movimento meu.

— Então é verdade — ele diz, a voz suave, quase curiosa. — Ela finalmente despertou.

Dorian lança um olhar que é mais um aviso do que uma ameaça.

— Caelan, não começa.

— Estou só constatando — ele ergue os ombros com um sorriso pequeno, mas os olhos continuam grudados em mim. — Ela é... diferente.

Me sinto como um animal preso em uma jaula, sendo analisado por predadores que ainda não decidiram se vão me devorar ou não.

— O que vocês querem comigo? — minha voz sai trêmula, mas alta o suficiente para quebrar o silêncio.

Dorian se afasta da mesa, caminhando devagar até parar bem à minha frente. Ele não encosta em mim, mas é como se o espaço entre nós desaparecesse.

— Não é sobre o que queremos com você, Selene. — Ele fala baixo, firme. — É sobre o que você é.

As palavras dele me atravessam como uma lâmina.

— Eu não sou nada. — Tento me levantar, mas minhas pernas mal respondem. — Eu não pedi nada disso.

— Mas foi escolhida — Caelan diz, encostando no batente da porta, os olhos claros como gelo. — E escolhas têm preço.

— Chega. — Dorian corta, a voz baixa, mas carregada de autoridade.

Caelan ergue as mãos, um sorriso quase divertido no rosto, e se afasta.

Fico ali, parada, tentando entender o que está acontecendo, quando outro som preenche o ar: um uivo distante, profundo, que faz meu coração disparar. Não é o mesmo de antes. Esse é mais próximo. Mais... possessivo.

Dorian fecha os olhos por um instante, como se estivesse ouvindo algo que eu não posso ouvir. Quando abre de novo, os olhos estão mais escuros.

— Eles sabem que você está aqui. — Ele respira fundo, mas a calma não engana. — Precisamos nos preparar.

— Preparar para quê? — minha voz mal passa de um sussurro.

Ele não responde. Só me encara, e nesse olhar eu vejo algo que não entendo, mas reconheço: como se eu fosse dele.

E, naquele momento, uma parte de mim — a parte que eu passei a vida inteira tentando sufocar — desperta, faminta.

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