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Capítulo 2 - O Rei Chegou

— E esse ano, teremos mais um novo aluno para completar o nosso time de estrelas que é o Colégio Bernoulli. É com muito prazer que dou as boas-vindas a Benjamin William.

E lá estava ele. Jaqueta de couro, calça justa e um sorriso que faria até a Madre Teresa repensar seus votos. Uma onda percorreu meu corpo. O auditório virou uma arena, gritos por todos os lados. As meninas quase desmaiando. Era como assistir à eleição relâmpago do novo rei do baile. Minha tia, a broaca oficial, ainda falou mais umas bobagens antes de nos liberar. Saí em direção ao meu armário. Como num passe de mágica, os celulares apitaram em sincronia com o início das aulas. Nossa escola tem um aplicativo próprio — dá pra fazer de tudo por ali, de reclamações sobre professores a pedidos de transferência. Um clique e voilà. Carla e John se aproximaram.

— Garota, tu viu aquele espetáculo de homem? — John disse, se abanando com a própria mão.

— Para com isso, John, você sabe que ele não é do nosso nível — Carla abriu o armário e conferiu o horário no celular. — A gritaria no auditório deixou isso bem claro.

— Exatamente. Ele já foi coroado rei só por ter subido naquele palco — falei, pegando meus livros.

— Ai, meninas! Nada de ilusão — John tirou o iPhone do bolso. — Bora ver os horários.

Carla ficou comigo em Filosofia e Espanhol, John em Matemática e Física. Nada mal. Teria companhia na maioria dos dias. Pena que a primeira aula já nos separava. Pegamos as coisas e seguimos para nossas salas.

— Esse ano tem cara de bomba — resmunguei.

— Eu con... — alguém trombou em mim. Cadernos no chão.

— Me desculpa, eu...

— Ei, nem perde tempo pedindo desculpas. Ela não passa de uma escória, uma bisbórria qualquer — Veronica. A líder do clã das cobras e, infelizmente, minha prima. Ela lançou um olhar de nojo e puxou o garoto para longe.

Mas ele se livrou das mãos dela e se abaixou para me ajudar.

— Veronica, quem você pensa que é pra falar da Amber assim? — Carla se adiantou, e John a segurou.

— Ninguém menos que a prima linda e rica dessa bastarda — Veronica respondeu, enquanto risadas explodiam ao nosso redor. Um grupo já nos cercava, feito abutres.

— Veronica, eu sei que a gente acabou de se conhecer, mas não acho certo tratar alguém assim — Benjamin disse, me entregando os cadernos. Eu mal conseguia falar, só acenei com a cabeça.

— Benjamin, querido — droga, lá vem bomba — logo você se acostuma. Aqui é assim. Ela não passa de uma bisbórria.

— Não consigo entender como alguém trata a própria prima dessa forma. Isso é desumano — ele se aproximou. — Você tá bem?

Só consegui assentir. Carla e John olhavam tudo como se fosse um filme prestes a ganhar o Oscar.

— Benjamin, querido, se afasta dessas... dessas coisas — disse Veronica.

— Coisas? Eu vejo pessoas aqui — ele respondeu.

O queixo de Veronica caiu. Uma gargalhada irônica se espalhou, até entre suas próprias seguidoras. Eu tentei sair de fininho, mas a multidão me cercava.

— Você ainda é novo, vai entender... nossa escola é conhecida por colocar as pessoas nos seus devidos lugares — ela falou, dando a volta no Benjamin e colocando o braço sobre seu ombro. — Pessoas como nós nascem pra governar. Ela nasceu pra obedecer.

— Você tá maluca? E a igualdade? — ele tirou o braço dela de cima dele. — Isso não pode continuar. Somos a nova geração, decidimos como o futuro será.

— Mas que confusão é essa? — a voz da minha tia cortou o ar.

— Ah, mamãe, ainda bem que chegou — Veronica correu para ela como se tivesse cinco anos. — A Amber tá incomodando meus amigos, especialmente o Benjamin.

— Amber, venha comigo até a diretoria — disse minha tia. Suspirei. De novo, a mesma palhaçada. Alguém segurou meu braço com força.

— Não. Ela não fez nada pra merecer isso — Benjamin, outra vez. Esse garoto quer me matar.

— Claro que fez, querido. Você não ouviu minha filha?

— Ouvi, e não concordo. Quem começou tudo fui eu.

Todos olharam pra mim. Me escondi ainda mais atrás da Carla.

— Pois bem — disse minha tia, tentando encerrar o show — Veronica, Benjamin e você, Amber. Sala da diretoria. O resto, para suas salas.

A multidão se dispersou. Carla e John me mandaram olhares de apoio antes de seguirmos.

— Você está encrencada e sabe disso — minha tia disse quando passamos pela porta. — Agora sentem-se e me contem o que aconteceu.

Veronica se enfiou ao lado de Benjamin no sofá. Ele discretamente formou uma barreira entre nós.

— Mamãe, a Amber se jogou no Benjamin. Queria atenção — disse ela.

— Isso é verdade, Amber? — minha tia enfatizou meu nome como se fosse uma ofensa.

Fiquei em silêncio.

— Não, não é — respondeu Benjamin.

Todos nos viramos. Que tipo de cara era esse?

— Claro que é, querido. Isso é tudo um plano dessa aí. Ela quer um homem rico pra bancá-la — Veronica disse, alisando o braço dele.

— Veronica, tenha modos — minha tia finalmente interveio.

— Desculpa, mamãe, mas ela me tira do sério. Você sabe disso.

— Eu não entendo como alguém trata a própria família assim — Benjamin insistiu. Esse garoto tem a alma de um pastor.

— Reis e servos, lembra? — Veronica rebateu.

— Isso vai contra tudo que acredito.

— Benjamin queri...

— Parem de me chamar de “querido”. Só me deixam mais irritado.

Silêncio.

— Essa conversa não vai levar a nada. Eu e a Amber já vamos indo — ele disse, se levantando. Abriu a porta pra mim como se fosse um cavalheiro de novela. A turma das broacas ficou muda.

— O que foi aquilo? Por que você deixa acontecer? — ele perguntou no corredor.

Não respondi. Ele me encurralou contra a parede.

— Ei, me responde.

— Eu... eu não sei.

— Como assim, não sabe?

— Eu... eu... — minha garganta queimava. E então, lágrimas. Droga. Por que agora?

— Desculpa. Eu não queria te assustar — ele suavizou a voz. — Só queria ajudar.

Me desvencilhei e saí correndo. Ele não me conhece. Não sabe nada de mim.

Eu odeio essa escola. Odeio essa cidade. Odeio a mim mesma.

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