Mundo ficciónIniciar sesiónKaelen Aurelius
A sala de projeções era fria e silenciosa, iluminada apenas pelo brilho azulado de cinco hologramas que flutuavam diante de mim. Cinco membros do Conselho Aureliano. Cinco vozes que, juntas, poderiam ditar o futuro — ou o fim — da nossa espécie.
Cada rosto projetado representava uma das Grandes Casas de Aurelis, nosso planeta de origem, agora apenas uma memória distante envenenada. Cada um governava uma das cidades centrais da Terra: Tóquio, Londres, Paris, Sydney e, é claro, Nova Iorque — minha responsabilidade. Eram seres ancestrais, imersos em um tradicionalismo que, suspeitava eu, nos levaria à extinção mais rápido que qualquer praga cósmica.
— Kaelen,— a voz de Lorde Valerius, de Londres, ecoou na sala, cortante como uma lâmina. — O relatório trimestral é claro. Nossa taxa de natalidade continua em declínio irreversível. O Conselho espera uma solução. Algo mais… definitivo. Os melhores cientistas do nosso povo estão a seu serviço sem contar com os recursos tecnologicos.
Respirei fundo, sentindo o peso de uma década de pesquisas, de noites em claro, de esperanças silenciosas sendo reso midas a nada.
— A solução definitiva,— comecei, escolhendo cada palavra com cuidado, — está diante de nós há anos. A fisiologia humana é notavelmente adaptável. Com modificações genéticas específicas, poderíamos fortalecer os úteros das fêmeas humanas para que suportem nossa gestação. Criaríamos, essencialmente, incubadoras viáveis.
O silêncio que se seguiu foi mais pesado que qualquer objeção.
Foi Lady Lyra, de Paris, quem quebrou o gelo, seu tom carregado de desdém. — Modificar humanos? Para que sirvam de vasos para a semente aureliana? Isto é uma abominação, Kaelen. Você sugere que rebaixemos nossa linhagem mais pura ao nível da biologia primitiva deles?
— Não se trata de rebaixamento, — contra-argumentei, uma centelha de frustração aquecendo meu sangue. — Trata-se de pragmatismo. Nossos corpos não se reproduzem sozinhos neste planeta. A ciência nos mostra o caminho. A teimosia é um luxo que não podemos mais ter.
— A teimosia?— Lorde Cassius, de Tóquio, inclinou-se para frente, seus olhos amarelos estreitados no holograma.— Chamamos de pureza. O sangue aureliano não será misturado com a ignorância e a fragilidade humanas. É inaceitável.
— Então preferem desaparecer?— A pergunta saiu com mais intensidade do que eu pretendia. — Prefiram que a última geração de Aurelianos morra com vocês, orgulhosa e pura, em vez de abraçar uma solução que garanta nossa sobrevivência? A nossa população com menos de dezoito anos não chega nem a quenhetos.
— Haverá outra solução,— rosnou Lorde Vorian, de Sydney. — Uma que não envolva sujar nossa linhagem. Encontre-a, Kaelen. Essa é sua função. O Conselho não autorizará nenhum investimento ou pesquisa no ‘aperfeiçoamento’ de humanos. Eles são ferramentas, não parceiros. Nunca serão.
A reunião terminou com esse ultimato. As projeções se desvaneceram, uma a uma, deixando-me sozinho na escuridão, com o eco do seu preconceito ancestral reverberando em meus ouvidos.
Quando a porta do meu escritório se fechou atrás de mim, soltei um som baixo, um misto de raiva e desespero. Amaldiçoei todos eles. Amaldiçoei sua arrogância, sua cegueira, seu apego doentio a um passado que já estava morto e enterrado.
Caminhei até a janela panorâmica. Lá embaixo, a cidade humana pulsava, cheia de vida — uma vida frágil, caótica, mas prolífica. Eles se multiplicavam sem esforço, enquanto nós, os superiores, os avançados, definhávamos.
Pela primeira vez, uma verdade dolorosa cristalizou-se em minha mente, nua e crua: eu havia perdido a esperança.
Por dez anos, conduzi as pesquisas, analisei os dados, busquei uma alternativa que agradasse ao Conselho. Mas não havia outra. A solução mais elegante, a mais eficiente, a única verdadeiramente viável, era justamente a que eles se recusavam a considerar.
E agora? Agora, o jovem membro do Conselho, o prodígio que deveria salvar sua raça, estava de mãos atadas por anciãos que preferiam morrer certos do que viver com uma verdade que desafiava seus dogmas.
O que resta quando a única esperança é considerada uma heresia?







