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O sabor amargo do inesperado

A semana seguinte parecia arrastar-se para Esther. Depois do sábado na feira gastronômica, algo havia mudado em seu coração. Não era só encantamento — era a sensação de estar sendo lentamente escolhida, olhada, desejada de forma verdadeira.

Ela revivia cada detalhe daquele dia: o olhar dele ao elogiá-la, a maneira como ouviu sua história como se fosse preciosa. E, acima de tudo, as palavras que ecoavam como um segredo partilhado: “Eu vejo você.”

Na quarta-feira, a escola de culinária estava mais movimentada que o normal. A nova aula seria sobre pratos tradicionais com fusões modernas — uma das especialidades de Filipe. Esther chegou empolgada, com um brilho nos olhos. Esperava reencontrá-lo, mesmo que sob o ambiente formal da aula.

Mas ao entrar na sala, congelou por um segundo.

Havia uma mulher nova sentada perto da bancada de instrução. Alta, elegante, de cabelos escuros e um sorriso confiante. Estava conversando com Filipe com intimidade visível, como se partilhassem um mundo ao qual Esther não pertencia.

— Esther! — chamou uma colega. — Vem sentar com a gente!

Ela assentiu e se sentou, tentando disfarçar a inquietação. Mas seus olhos continuavam voltando para a mulher ao lado de Filipe. Ele ria. Um riso leve, raro, diferente do que compartilhava com os alunos. Esther nunca o tinha visto rir assim.

Quando a aula começou, Filipe apresentou a mulher.

— Essa é Mariana, minha amiga e ex-colega de trabalho. Ela é chef de cozinha em um restaurante premiado e veio nos visitar hoje. Talvez ela até nos dê uma aula especial em breve.

O coração de Esther afundou. Ex-colega. Amiga. Palavras neutras que soavam íntimas demais naquele tom.

Mariana sorriu para todos, mas seus olhos recaíram mais de uma vez sobre Filipe, com um brilho que não era apenas profissional. Esther tentou concentrar-se na aula, mas sua mente divagava.

Durante a preparação dos pratos, Filipe passava pelas bancadas com seu habitual cuidado. Quando chegou à de Esther, ela tentou manter o sorriso.

— Está tudo certo aqui?

— Sim. Estou testando uma variação do molho. Achei que poderia equilibrar com um toque de vinagre de maçã.

Ele experimentou, assentiu, e sorriu.

— Interessante. Você tem instinto, Esther. Isso é raro.

Ela sorriu de volta, mas algo dentro dela se contorcia. Ao fundo, Mariana tirava fotos da aula com o celular de Filipe, rindo de algo que ele dissera. Era como se o ar da sala tivesse mudado de temperatura.

— Ela é sua… namorada? — perguntou uma das colegas em voz baixa, inclinando-se para Esther.

— Não sei — respondeu, tentando manter a voz neutra.

— Eles parecem tão próximos. E ela é linda, né?

— É.

Esther não queria admitir, mas sentia algo que nunca gostara de reconhecer em si mesma: ciúme. Um gosto amargo, estranho, que não combinava com a doçura que sentia ao lado de Filipe. Mas ali estava ele, estampado em cada movimento, em cada olhar furtivo para Mariana.

Quando a aula terminou, os alunos começaram a guardar seus materiais. Filipe despediu-se com um sorriso, e Mariana foi até ele com naturalidade, apoiando a mão em seu ombro ao dizer algo em voz baixa. Esther viu. E seu coração respondeu com um silêncio incômodo.

Ao sair da escola, o céu estava nublado. Como se refletisse seu humor. Caminhou devagar, tentando processar. Será que estava se iludindo? Será que aquele convite à feira fora apenas um gesto de simpatia? Talvez ela tivesse imaginado tudo…

Seu celular vibrou. Uma mensagem de Filipe.

> “Oi. Queria dizer que foi muito bom ver você hoje. Desculpe se estive meio disperso, Mariana apareceu de surpresa. Ela é uma amiga antiga. Nada além disso. Espero que tenha curtido a aula. Estava linda, como sempre.”

Esther parou no meio da calçada. Leu e releu as palavras. A última frase fez seu coração bater mais rápido. Era real, então. Ele tinha notado. E, mais do que isso, ele quis que ela soubesse.

Respondeu com dedos trêmulos.

> “Gostei da aula, sim. Obrigada. Foi estranho ver você tão à vontade com ela… mas acho que foi só uma pontada de… insegurança. Desculpa.”

A resposta veio em poucos segundos.

> “Não se desculpe por sentir. Gosto da sua sinceridade. E, se quer saber, só fiquei à vontade porque você estava lá. Você muda o jeito como eu ocupo um lugar.”

Ela sorriu. No meio da rua, com o céu cinzento, sentiu que o mundo clareava por dentro. Ainda havia incertezas, sim. Ainda haveria Mariana, outras visitas inesperadas, outros momentos de dúvida. Mas havia também palavras doces, trocas sinceras, e o início de algo que podia florescer com o tempo.

E o ciúme, que antes era amargo, agora ganhava um novo sabor: o da importância. Porque quando se teme perder, é sinal de que algo precioso está se formando.

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