O cheiro de manjericão fresco e alho dourando na manteiga preenchia o ambiente da pequena escola de culinária em Seul. Era uma tarde nublada de primavera, e o clima úmido convidava a um prato quente e acolhedor. Esther segurava com firmeza sua bolsa contra o peito enquanto observava, tímida, os demais alunos se acomodando em suas estações de trabalho.
Aos vinte e seis anos, recém-formada em Letras, ela finalmente decidira se dar um presente: aprender a cozinhar de verdade. Durante a faculdade, sobreviveu com ramen instantâneo e café solúvel. Agora, queria mais do que pratos rápidos. Queria sabores que contassem histórias. “Boa tarde a todos”, disse uma voz firme, profunda e acolhedora. Todos se viraram. Esther também. Seus olhos encontraram os dele. Filipe. Alto, cabelos escuros e bagunçados de forma sutilmente elegante, olhos amendoados que pareciam enxergar além da aparência. Havia algo de misterioso, quase cinematográfico em sua presença. Ele vestia o uniforme preto da escola, com um avental de couro marrom que deixava claro: ele levava aquela arte a sério. “Meu nome é Filipe. Sou o responsável por este curso. Aqui, vocês vão aprender mais do que receitas. Vão aprender a sentir a comida, a ouvir o que ela quer dizer. Porque cozinhar é também escutar.” Alguns alunos riram, outros anotaram, Esther apenas engoliu em seco. Durante a primeira hora, Filipe demonstrou como preparar um risoto de cogumelos com toque coreano – usando gochujang no caldo. Seus movimentos eram precisos, quase hipnóticos. Ele explicava cada passo com paixão, seu olhar passeando pelas bancadas, atento a cada reação. Quando passou pela estação de Esther, parou por um breve segundo. “Você já tem alguma experiência?” Ela arregalou os olhos. “Eu… só com miojo.” Ele sorriu, genuíno. “Então começaremos do zero. E às vezes, começar do zero é a melhor receita.” Ela tentou sorrir de volta, mas sentiu o rosto queimar. Enquanto os demais conversavam animadamente entre si, Esther concentrava-se em não queimar a cebola. Filipe se aproximava de tempos em tempos, sempre discreto, dando dicas, elogiando sua coragem de tentar, mesmo errando. No fim da aula, todos se sentaram ao redor de uma mesa longa, partilhando o que haviam preparado. O prato de Esther estava um pouco salgado, mas ela ficou surpresa ao ver que Filipe se serviu duas vezes. “Você tem sensibilidade”, disse ele, limpando o canto da boca com um guardanapo. “É só questão de prática.” Ela agradeceu, tímida. Quando ele se afastou para recolher alguns utensílios, Esther ficou observando-o de longe. Havia nele algo diferente. Algo que não combinava com o estereótipo do chef exigente. Havia delicadeza. Do outro lado da sala, Filipe disfarçava ao olhar em sua direção. Aquela jovem de sorriso escondido e olhos curiosos havia despertado nele algo que não sentia há muito tempo. E ele sabia — precisava conhecê-la melhor. Na saída, a chuva fina começava a cair. Esther abriu sua sombrinha, mas ao ver que Filipe saía sem proteção, aproximou-se, hesitante. “Quer dividir?” Ele a encarou por um momento, surpreso. “Seria um prazer.” Caminharam juntos até a estação de metrô, falando sobre temperos, livros e a infância. Ele contou que viera do interior e que sua avó fora sua maior inspiração na cozinha. Ela contou sobre seu amor por poesia e como sempre sonhou em escrever um livro. “Cozinhar é como escrever poemas. Ambos precisam de ritmo, de alma”, ele disse, sorrindo. Quando se despediram, ela sentiu que havia algo especial ali. Talvez um novo começo. Talvez, apenas uma coincidência bonita. Mas no fundo, algo lhe dizia que aquele curso mudaria mais do que sua relação com a comida. E Filipe, parado sob a chuva, observando-a partir, teve a certeza: faria de tudo para conquistar aquela garota de olhos gentis e coração escondido.