O salão estava tomado por luzes elegantes, cristais reluzindo sob lustres caros, garçons passando com taças de espumante e sorrisos plastificados. Todos os olhares se voltaram quando as portas se abriram com leve atraso.
E então ela entrou.
Narelle.
Não a loba humilhada, não a ex-Luna silenciada pelo peso do passado. Aquela mulher que atravessava o salão agora era outro ser — refinado, impenetrável, perigoso.
O vestido azul petróleo, modelo envelope, abraçava seu corpo como se tivesse sido moldado sobre sua pele. A fenda lateral revelava pernas longas e firmes, e o cetim parecia dançar ao ritmo de sua passada firme. Os ombros estavam erguidos, o queixo levemente elevado. Um batom vermelho cetim marcava os lábios como um selo de poder.
Kael foi o primeiro a reagir — uma sobrancelha arqueada, o copo congelado a meio caminho da boca.
Rhaek, por sua vez, ficou imóvel. O tempo pareceu afundar ao redor dele. Os sons abafaram-se. A música, as risadas, os brindes, tudo virou um ruído distante diante da visão daquela loba. Seus olhos seguiram cada passo como se ela fosse o epicentro de um terremoto silencioso.
— Quem... — murmurou a esposa de Rhaek ao seu lado, aproximando-se. — Aquela mulher... ela me parece estranhamente familiar.
Ele nada respondeu.
Kael, sorrindo com habilidade, murmurou ao ouvido do irmão:
— Surpreso? Pois é. Parece que a ex-Luna virou a nova acionista. E não veio sozinha — disse ele, apontando discretamente para os dois investidores europeus que a acompanhavam. — Parece que alguém resolveu jogar pesado.
Rhaek cerrou os punhos.
Narelle cumprimentava outros membros do conselho como se já pertencesse àquele mundo há décadas. Seus olhos, no entanto, buscavam. Sabiam exatamente onde ele estava.
Quando seus olhares se cruzaram, foi como o estalar de um chicote entre paredes de vidro. Nenhum dos dois desviou. Não havia mais medo, nem submissão. Havia guerra. E ela havia acabado de declarar a primeira ofensiva.
[...]
Os brindes continuavam, mas Narelle já tinha feito o que precisava. Cada passo seu naquele salão fora calculado como um movimento em campo de batalha — e o estrago estava feito. Ela sentia os olhares queimando, os cochichos se espalhando como rastilho de pólvora. E, acima de tudo, sentia o cheiro dele. Rhaek.
Virou-se lentamente, como quem apenas deseja um ar mais fresco, e caminhou em direção à saída lateral do salão. Seus acompanhantes foram detidos por outros investidores, distraídos com promessas de futuros negócios. Ela estava sozinha agora. E queria estar.
Atrás dela, a alguns segundos de distância, Rhaek também se afastou. Não falou com ninguém. Apenas caminhou como uma força contida, algo primal sob a pele.
Os corredores da sede eram antigos, camuflados por uma reforma que não apagava as memórias impregnadas nas paredes. Narelle seguiu até uma sala que conhecia bem — o antigo escritório dos betas. Havia sido convertida em sala de espera executiva, mas ainda carregava o mesmo cheiro de madeira antiga e silêncio tenso.
Ela entrou.
A porta se fechou logo atrás.
O cheiro dele chegou antes da voz.
— Você teve coragem de aparecer — disse Rhaek, a voz grave, baixa, com algo que soava entre raiva e incredulidade.
Ela se virou devagar, como quem avalia uma peça fora de lugar.
— Eu não voltei, Rhaek. Eu me ergui. Há uma diferença.
O vestido azul petróleo se movia com ela como uma segunda pele, parte tempestade, parte desafio. Ele avançou um passo.
— Você não devia estar aqui.
— Mas estou. Com nome. Com poder. E com memórias, caso tenha esquecido.
Ele a encarou, os olhos faiscando.
— Você era minha. Narelle sorriu com desdém.
— Eu fui sua vítima. Sua posse. Sua presa. A voz dela era agora uma lâmina envolta em veludo.
— Você se aproveitou de uma loba solitária, isolada, indefesa. Me devorou em nome da tradição, do ritual. E depois me descartou como um fardo inconveniente.
Os olhos dele se estreitaram, a mandíbula contraída.
— Você não entende o que eu tive que fazer pra manter tudo intacto. A ordem. Os clãs. Os tratados...
— Não me fale de ordem, Rhaek. Você escolheu a conveniência. Eu escolhi sobreviver.
O silêncio que se seguiu caiu entre eles como pedra em um lago escuro.
Então ela deu um passo à frente, diminuindo a distância. O olhar faiscante.
— Agora sou ‘eu’ quem decide quem sangra primeiro.
Passou por ele, roçando levemente o ombro — como uma loba marcando território — e saiu da sala.
Rhaek ficou parado, sozinho, o coração batendo como um tambor de guerra.
[...]
Rhaek saiu da sala sem dizer palavra. O rosto estava tenso, os olhos fixos em nada. Cruzou o corredor em silêncio, atravessando o salão como se cada ruído fosse abafado pelo pulso em seus ouvidos. O mundo ao redor parecia irrelevante — investidores, brindes, sorrisos — tudo dissolvido no rastro de perfume e confronto que Narelle deixara para trás.
Encontrou a esposa rindo forçadamente com um grupo de conselheiros. Tocou-lhe o braço e murmurou:
— Agora.
Ela estranhou o tom. Ia protestar, mas os olhos dele não permitiram. Caminhou obediente, desconfortável com a firmeza da mão que a conduzia.
Entraram no escritório particular do Alpha. Ele trancou a porta com um estalo seco, não esperou palavras. Agarrou-a pela cintura e a empurrou com violência para o banheiro anexo. A madeira da porta tremulou quando foi fechada com um chute.
Ela arfava, meio assustada, meio excitada. Não era raro que ele a tomasse com brutalidade, mas havia algo diferente naquele instante.
Ele rasgou a blusa dela sem cerimônia. A boca não procurava prazer — era domínio. As mãos esmagavam sua pele como se buscassem apagar uma lembrança. Os movimentos foram secos, rápidos, impiedosos. Quando a penetrou, foi como se marcasse território, não como amante — como fera.
Ela gemeu alto, tentando acompanhar o ritmo, mas ele não a via.
Porque, em sua mente, quem estava ali não era ela.
Era Narelle.
O vestido azul petróleo dançando nas sombras. A voz afiada, a ameaça de vingança. O cheiro de liberdade e ferocidade.
Ele gozou com um grunhido animalesco, a cabeça jogada para trás, as garras cravadas na cerâmica da pia. A esposa escorregou até o chão, arfando, os cabelos desgrenhados, as pernas trêmulas.
Ele se afastou, sem olhá-la. Respirava fundo, tentando apagar o fogo do próprio desejo. Mas a imagem permanecia.
Aquela loba maldita. Aquela que ele nunca conseguiu domar.