02h19 – MANSÃO SEO – TERRAÇO PRIVADO
O vento soprava frio no alto da mansão, e ainda assim Aurora estava ali, descalça, o vestido preto ondulando ao redor de seus pés. Ela encarava a cidade como quem buscava sentido no caos. Jae-Min se aproximou sem pressa. — Pensei que estivesse dormindo. — Estou acordada por dentro demais pra isso. Ele parou ao lado dela, mãos nos bolsos. — Você me expôs ao mundo... e me protegeu no mesmo gesto. — Eu te expus à verdade. Proteger você foi consequência. — E ainda assim... eu esperava que me deixasse cair. Ela o olhou, séria. — Eu não sou Skylar. Silêncio. — Você me ama, Aurora? — ele perguntou, enfim. Ela demorou para responder. — Eu amo o que você é quando deixa de lado todas as máscaras. Mas também odeio o que fez pra sobreviver até aqui. Odeio que tenha sido necessário. Odeio que tenha funcionado. E odeio mais ainda... que você seja exatamente o homem que eu preciso. Jae-Min se aproximou mais, até que seus rostos estivessem próximos. — Então... me ame com ódio. E me odeie com paixão. Mas fique. Ela não recuou. — Ficar é fácil. Difícil é aguentar o que virá. — E o que virá? — Uma guerra maior. Uma verdade ainda mais suja. Ela tirou do bolso interno do vestido uma foto. Na imagem: Skylar em Dubai. Ao lado de um homem grisalho, de olhos intensos, pele marcada por cicatrizes. Nome: Zakarov Yeltsin. — Ele é o financiador por trás da guerra. O mentor de Skylar. E... antigo aliado do pai de Jae-Min. — Isso não é possível — Jae-Min sussurrou. — É. Ele está vivo. E quer o que você tem. E agora... sabe quem está ao seu lado. Jae-Min segurou a foto com força. Os olhos se estreitaram. Naquele momento, algo em seu interior mudou. — Aurora... o jogo mudou. — Não é mais um jogo. — É uma caçada. E ali, entre o passado e o presente, entre o amor e a ruína, eles selaram um pacto sem palavras. --- TRÊS DIAS DEPOIS – PAÍS SEM NOME – QUARTEL SUBTERRÂNEO Skylar caminhava pelo corredor do abrigo como uma sombra faminta. Zakarov a esperava de pé, ao lado de uma parede de mapas digitais e armas ilegais. — Você falhou — ele disse. — Ainda não. — A mulher é mais forte do que pensamos. — Então vamos quebrá-la por dentro. Zakarov ergueu o olhar. — E como? Skylar sorriu. — Tirando dela... o único laço que a mantém de pé. — No monitor, a imagem de Aurora ao lado de Jae-Min, sorrindo. Skylar sussurrou: — Vamos ver quanto tempo o amor sobrevive... quando você obriga alguém a escolher entre salvar quem ama ou salvar a si mesmo. --- CENA FINAL DO CAPÍTULO – SUÍTE DE GUERRA – MANSÃO SEO – 03h00 Aurora vestia um robe de cetim, sentada em frente ao espelho. Jae-Min estava atrás dela, massageando seus ombros em silêncio. — Estamos sendo vigiados — ela disse, sem medo. — Por quem? — Por todos. Pela história. Pela verdade. Por fantasmas que se recusam a morrer. Jae-Min se abaixou ao lado dela. — Você tem medo? — Sim. — E ainda assim, fica? — Porque às vezes... a maior prova de amor não é fugir. É permanecer... quando tudo grita pra correr. Ele a beijou na nuca. — Então vamos queimar juntos. Ela sorriu. — Não. Vamos queimar todos eles primeiro. 05h08 – MANSÃO SEO – CORREDOR CENTRAL O som veio primeiro como um zumbido distante. Depois, como um estrondo ensurdecedor. BOOM. A explosão sacudiu o térreo da mansão, estilhaçando janelas, derrubando quadros e ativando todos os sistemas de emergência. Alarmes soaram em tons vermelhos enquanto as luzes de emergência tomavam o lugar da iluminação principal. Aurora acordou no susto, jogada ao chão com o impacto. Vestida apenas com uma camisola de seda, tentou se levantar, mas o zumbido no ouvido distorcia tudo. A fumaça tomava conta da ala leste. — JAE-MIN! — gritou. Nada. Correu, descalça, com o coração batendo no pescoço. Viu pedaços de madeira, cortinas em chamas, móveis em ruínas. O cheiro era de pólvora e morte. E então, ele apareceu. Jae-Min, com sangue escorrendo na testa, mas de pé. Desarmado. Furioso. — Você está bem? — ele a puxou para si. — Estou. O que aconteceu? — Ataque coordenado. Explosivos. Disfarçados em caixas do sistema de segurança. Alguém se infiltrou com códigos antigos. Aurora gelou. — Zakarov. — Sim. E então, uma nova explosão — dessa vez nos fundos da mansão. Os guardas correram, Taewon acionou o sistema de defesa interno. — Temos que sair daqui — Jae-Min disse, apertando a mão dela. — Agora. Mas antes que pudessem se mover, o monitor da parede acendeu, mesmo sem energia externa. Era uma transmissão direta. Zakarov, ao vivo. Em um lugar desconhecido. — Bom dia, Seo. Que bela madrugada para lembrar os fantasmas, não? Jae-Min se aproximou da tela, os olhos estreitados. — Você está cavando sua própria cova, Zakarov. — Já morri uma vez. E agora... vim buscar os herdeiros do inferno. E então ele olhou para Aurora. — Ah, a Callahan. A chama vermelha. Sabe o que é curioso? Você e eu temos mais em comum do que imagina. Aurora o encarou com nojo. — Você matou inocentes. — E você... abandonou os seus. A imagem sumiu. Aurora ficou paralisada. — O que ele quis dizer com isso? — Jae-Min perguntou. Silêncio. — Aurora? — Há algo que você não sabe. Algo que... eu escondi por anos. — Me diz agora. — Não aqui. Não com fogo ao nosso redor. Eles fugiram pela ala subterrânea, com Taewon guiando os passos entre as rotas de evacuação. Mas a tensão... já queimava por dentro. --- 06h22 – REFÚGIO NAS MONTANHAS – CABANA DOS FUNDADORES Era uma propriedade isolada, de madeira nobre, criada como ponto de recuo nos tempos da fundação do império Seo. Lá, Aurora finalmente falou. — Aos 15 anos, eu estava em um internato no sul da França. Minha família me mandou pra lá pra me afastar de um... incidente. — Que tipo de incidente? — Eu me envolvi com o filho de um aliado russo. Jovem. Impulsivo. Doente mentalmente. Ele era obcecado por mim. Jae-Min franziu o cenho. — Você foi abusada? — Não. Mas quase. E quando tentei me afastar, ele surtou. Criou um cativeiro improvisado no porão da escola. Me manteve presa por 48 horas. — Como você escapou? — Eu o envenenei. Misturei ácido no chá. Ele morreu sufocando... com os olhos em mim. Jae-Min não respondeu. Apenas se aproximou. Tocou o rosto dela. — Por que nunca me contou? — Porque aquela garota de 15 anos... ainda existe aqui dentro. E porque ele... era filho de Zakarov. Silêncio. — Ele está aqui por vingança — Aurora continuou. — E ele quer me fazer pagar. — Ele vai morrer antes de te tocar. Aurora o olhou nos olhos. — E se ele conseguir me quebrar primeiro? — Então eu te reconstruo. Com as próprias mãos. --- 08h14 – MANSÃO SEO – RUÍNAS Enquanto o casal se refugiava, agentes especializados reviravam os escombros da mansão. E encontraram algo. Um fragmento de papel. Meticulosamente escondido entre os painéis eletrônicos. Nele, uma frase: > “ELA O MATOU. E AGORA VAI MATAR VOCÊ.” Era a letra de Skylar. O fantasma da traidora não havia desaparecido. Estava apenas... preparando o próximo corte.