Horas depois, o salão da mansão Bellucci estava vazio.
Os conselheiros haviam partido, carregando as próprias desconfianças e planos sussurrados. Amara permaneceu junto à varanda, observando a noite cair sobre Palermo, as luzes da cidade se espalhando como um mar de fantasmas distantes. O vento frio batia no rosto dela, mas nada acalmava o fogo que ardia por dentro. Atrás dela, passos firmes ecoaram. Ela nem precisou se virar para saber. — Veio me matar ou me vigiar? — disparou, sem olhar para ele. Dante se encostou na parede, o cigarro aceso entre os dedos, a fumaça subindo lenta. — Ainda não decidi — respondeu com ironia. — Mas não se preocupe, Bellucci. Quando eu fizer uma dessas coisas… você vai ser a primeira a saber. Ela se virou devagar, os olhos verdes encontrando o cinza tempestuoso dos dele. — Eu sei muito bem o que você quer, Moretti. Quer me ver fracassar. Assim, pode enfiar a faca nas minhas costas e dizer que estava cumprindo ordens. Dante deu um sorriso torto, tragou o cigarro, soltando a fumaça devagar. — Não precisa me dar tanto crédito. Se eu quisesse te ver sangrar, já teria feito isso naquela parede do corredor. Amara caminhou até ele, parando a poucos centímetros, o olhar desafiador. — Eu não vou sangrar fácil. E você sabe disso. Ele jogou o cigarro fora, o rosto sério agora, a voz baixa e carregada de ameaça contida. — Vai sangrar, Amara. Aqui dentro, todo mundo sangra mais cedo ou mais tarde. Inclusive você. A única diferença… — ele se aproximou, o corpo quase tocando o dela — é que o seu sangue carrega um nome que metade de Palermo quer ver enterrado. Ela manteve a postura erguida, os olhos firmes. — Então que tentem. Quem vier atrás de mim, vai cair primeiro. — Cuidado com a confiança, Bellucci. — Dante inclinou o rosto, os lábios quase roçando o ouvido dela. — Arrogância é o primeiro passo antes da queda. Ela sorriu, debochada. — A queda só vem para quem se desequilibra. Eu ainda estou de pé. Ele se afastou, a expressão carregada de um misto de desprezo e algo mais… algo que nem ele conseguia nomear. — Amanhã, atacamos os Ricci — disse com frieza. — Espero que esteja pronta, esposa. Porque guerra… não escolhe quem deixa de pé. Ela o seguiu com o olhar enquanto ele se afastava, o peito apertado de raiva, orgulho… e aquela maldita tensão que queimava sob a pele. A guerra estava apenas começando. E o casamento deles… era só o estopim. O quarto estava mergulhado em penumbra quando Amara entrou. A mansão inteira parecia respirar em silêncio, mas dentro dela, o caos não dava trégua. Vestia apenas uma camisola fina, o tecido leve escorrendo sobre o corpo, deixando as curvas expostas sob a luz suave dos abajures. Não tinha se vestido para ele, mas a coincidência maldita parecia persegui-la. Dante estava ali. Acabara de sair do banho, o cabelo ainda úmido, as gotas deslizando pelo peitoral definido. Usava apenas uma calça de moletom escura, o cós baixo revelando o traço perigoso da pele e o corpo forjado por guerras. Ele estava de costas, secando os cabelos com uma toalha, como se a presença dela não significasse nada. Como se o quarto não estivesse carregado de tensão prestes a explodir. Amara caminhou até a penteadeira, tentando ignorá-lo, mas cada passo ecoava no silêncio. Sabia que ele a observava pelo espelho, os olhos cinzentos analisando cada centímetro dela sob a seda da camisola. — Veio dormir? — ele perguntou, a voz rouca e arrastada, sem se virar. — O quarto também é meu — rebateu, sem encará-lo. Dante riu baixo, jogando a toalha de lado. Caminhou até a cama, parando ao lado dela, o corpo ainda quente do banho, o cheiro amadeirado invadindo o ar. — Esse quarto é só mais uma consequência do juramento — murmurou, os olhos caindo para a pele exposta dela — Assim como você. Amara se virou, o rosto próximo demais do dele, o cheiro dele entorpecendo os sentidos, mas o orgulho a mantendo firme. — Jura que acredita nessa merda, Moretti? — sussurrou, a voz afiada como lâmina — Acha mesmo que eu sou consequência? Dante inclinou a cabeça, o sorriso torto nos lábios, os olhos escurecendo. — Você é minha, Amara. Pelo nome, pelo sangue, pelo que a gente construiu ou destruiu aqui. — E se eu quiser sair? — ela rebateu, desafiando. Ele se aproximou mais, o peito nu a centímetros, os lábios quase roçando os dela. — Pode tentar — murmurou, a voz baixa, carregada de ameaça e desejo — Mas cada vez que você fugir… eu trago você de volta. Porque enquanto carregar esse sobrenome, enquanto carregar o peso do que somos… não tem fuga. O silêncio caiu entre eles, denso, pesado. Amara sentia o corpo em combustão, o coração acelerado, o ódio e a atração se misturando como um veneno viciante. Dante deslizou os olhos pelo corpo dela, devagar, sem pressa, como se cada centímetro fosse dele por direito. — Vai deitar? — perguntou, a voz rouca, o tom carregado de provocação. Ela sustentou o olhar, os lábios entreabertos, o orgulho ainda intacto, mas o corpo traidor denunciando a tensão. — Não encosta em mim — disse, a voz falhando levemente. Ele sorriu, perigoso. — Por enquanto. Dante caminhou até o outro lado da cama, deitando-se com o corpo ainda quente do banho, os olhos presos nela. Amara se deitou também, virada de costas para ele, os olhos abertos no escuro, sentindo cada fio de tensão pairando no quarto. Eles estavam presos naquele jogo. E, cedo ou tarde, alguém iria ceder.