Início / Romance / O Juiz de Gelo / O Gelo e a Insegurança
O Gelo e a Insegurança

Enquanto ele desviava o olhar, Aurora sentiu um alarme soar na sua mente. Juiz novo? Droga. O pensamento a atingiu como um aviso urgente, afiando o seu foco.

Ela o observou com cuidado, o coração apertado, procurando por qualquer sinal de fraqueza. Não encontrou nada. O olhar dele era gélido, mas não como o de Sigrid, que exalava a falsidade de quem se vende por um favor.

O frio dele era de um jeito que dava medo: calmo, firme, impossível de entender. Quanto mais tentava decifrá-lo, mais percebia a própria insegurança.

Espero que ele seja honesto, pensou, com o estômago pesado. Que esse poder não vire mais uma arma contra o meu caso.

O julgamento começou, e a voz do advogado de Damien preencheu o tribunal. Era um homem rechonchudo num terno caro, cujos gestos dramáticos e exagerados tentavam dominar o ambiente e cativar a audiência.

— Senhor juiz, o meu cliente, um jovem de futuro promissor, foi brutalmente atropelado por um idoso que, de forma irresponsável e sem qualquer justificativa. As consequências foram devastadoras: lesões graves, um trauma psicológico profundo e uma longa recuperação que ainda o aflige.

O vídeo, Excelência, fala por si — não há margem para dúvidas quanto à violência do ato. Peço, portanto, autorização para exibir o registro original, sem cortes, que comprova integralmente a veracidade da minha alegação.

Lian fez um leve aceno de cabeça, concedendo a autorização. O oficial prontamente conectou o pen drive ao sistema, e, à medida que as luzes da sala se apagaram, o silêncio tomou conta do ambiente. O advogado posicionou-se ao lado do telão, o rosto iluminado pelo brilho frio da projeção.

— Aqui está, senhor juiz — anunciou, com voz segura, apontando para a tela.

O vídeo começou a rodar. Nas imagens manipuladas, o carro parecia avançar em direção ao jovem, como se ele tivesse sido atropelado de forma inesperada. Na realidade, porém, o rapaz se jogara de propósito diante do veículo, criando a ilusão de um acidente c.r.u.e.l e tentando culpar o motorista por um ato que ele mesmo provocara. A cena, cuidadosamente editada, distorcia os fatos para enganar quem assistisse.

Na sua mesa, Aurora respirou fundo e pousou de leve a mão no ombro do seu cliente. O idoso tremia de indignação, visivelmente abalado pelo espetáculo. É tudo uma farsa, a sua mente gritava, enquanto repetia para si mesma que a calúnia é a arma dos fracos.

Após o advogado de Damien encenar o seu espetáculo, o juiz concedeu a palavra a Aurora para que apresentasse a defesa de seu cliente.

— Bom dia a todos, bom dia, Excelência. — Sua voz era firme, clara, captando imediatamente a atenção da sala. — Senhor juiz, o jovem Damien, pagou uma quantia considerável ao dono do mercado para adulterar as gravações. No entanto, o próprio proprietário, tomado pelo remorso, decidiu me procurar e se propôs a depor. — explicou Aurora, com firmeza e calma.

Aurora respirou fundo e continuou:

— Se o senhor permite, Excelência, a testemunha já está presente e pode esclarecer a verdade.

Lian assentiu, com um gesto discreto:

— Está autorizada, senhorita Aurora.

Logo, o senhor Humberto, dono do mercado, entrou acompanhado de dois policiais, caminhando com expressão séria e apreensiva. Todos na sala acompanharam cada passo seu, atentos à sua postura. Assim que se posicionou, foi feito o seu compromisso solene perante a corte, garantindo a veracidade do seu depoimento.

Aurora se aproximou com calma e profissionalismo, fazendo algumas perguntas precisas:

— Senhor Humberto, poderia nos contar como recebeu o pedido do senhor Damien e o que foi feito em seguida? — perguntou Aurora, com a voz firme e olhar atento, buscando cada detalhe.

Humberto engoliu em seco, visivelmente desconfortável, e desviou o olhar por um instante. Foi então que Damien, tentando impor pressão, disse com um sorriso forçado e um tom intimidador:

— Vamos, Humberto… diga a eles a versão certa.

Lian bateu o martelo com firmeza, cortando o clima de intimidação imediatamente:

— Senhor advogado, controle o seu cliente! — ordenou, a voz calma, mas carregada de autoridade.

O advogado de Damien, desesperado, abriu a boca, mas não conseguiu falar nada. Damien, percebendo que estava sem apoio, finalmente se aquietou, murmurando entre dentes.

Humberto respirou fundo, seu rosto marcado pela tensão, e então começou a falar com sinceridade, sua voz tremendo levemente:

— Eu… eu só fiz aquilo porque o mercado está indo m.a.l. Estamos com dívidas enormes… não sabia mais o que fazer. Quando o senhor Damien me procurou e me ofereceu dinheiro, achei que seria uma solução rápida. — Ele baixou a cabeça, envergonhado. — Mas depois percebi que estava errado. Me arrependi profundamente e, assim que pude, devolvi o dinheiro para Damien e decidi procurar a senhorita Aurora.

O tribunal inteiro ficou em silêncio, absorvendo a confissão do mercadista. Damien, ainda tentando manter a postura, tremeu levemente, incapaz de disfarçar a frustração ao ver o seu plano desmoronar diante dos olhos de todos.

Aurora fez mais algumas perguntas breves, apenas para esclarecer os detalhes:

— Então, senhor Humberto, o senhor agiu por necessidade, mas depois tomou a decisão correta de reparar o erro?

— Sim, doutora. Foi a única forma de fazer justiça e colocar tudo em ordem. — Humberto respondeu, com um suspiro de alívio e um leve aceno de cabeça, finalmente parecendo em paz.

O silêncio da sala era cheio de tensão. Todos compreendiam a gravidade do que acabara de ser revelado: o vídeo manipulador não passava de uma fraude, cuidadosamente planejada por Damien, mas agora desmascarada pela coragem e inteligência de Aurora.

Lian, na sua posição de juiz, observava com admiração. Em Aurora, havia algo que ia além da competência — uma combinação rara de intuição e convicção.

Após a defesa impecável, Damien estava pálido; o advogado, mudo. Todos os olhares voltaram-se para Lian, que manteve a expressão impassível. A sua voz cortou o ar, fria e precisa:

— Em virtude dos crimes de calúnia, falso testemunho e fraude processual, esta corte determina que o Sr. Damien pague ao senhor Pierre uma indenização de cento e oitenta mil francos suíços, equivalentes a um milhão, cento e setenta mil reais.

Além disso, o réu cumprirá cinco anos de trabalho comunitário em hospitais e casas de repouso, a fim de compreender o valor da vida e do tempo alheio.

— Quanto ao senhor Humberto, considerando a sua colaboração com a justiça, não sofrerá punição. Contudo, deixo registrado que não haverá uma segunda oportunidade caso algo semelhante ocorra. Que isso sirva de lição a todos.

Com um golpe firme do martelo, Lian finalizou:

— Caso encerrado.

O impacto do veredito ecoou por toda a sala. Enquanto Humberto agradecia silenciosamente, aliviado e emocionado, Damien, consumido pelo ódio e pela frustração, explodiu:

— Isso é um absurdo! O senhor é um juiz corrupto, e essa p.u.t.a de advogada vai me pagar!

Aurora manteve-se serena. Um sorriso de escárnio curvou-lhe os lábios enquanto o olhava com desprezo calculado — o suficiente para inflamar ainda mais a fúria dele. Damien avançou sobre ela, mas Lian, com um gesto sutil, acionou os oficiais.

Dois homens o contiveram com firmeza, arrastando-o para fora. Os gritos de Damien ecoaram pelo corredor, misturados à vergonha do advogado que o seguia.

Antes que a sala se esvaziasse, Aurora e Lian se olharam por um instante. Naquele olhar cabiam apenas respeito e admiração.

Do lado de fora, o senhor Pierre esperava. Quando viu Aurora, um sorriso emocionado iluminou-lhe o rosto. Ele se aproximou com passos trêmulos, estendendo as mãos.

— Senhorita, muito obrigado! Eu… não sei como posso agradecer o que a senhorita fez por mim.

Aurora sorriu, gentil.

— Não há de quê, senhor Pierre. Fiz apenas o meu trabalho. Espero que o senhor e a sua esposa aproveitem bem o dinheiro.

— E vamos, sim! — respondeu ele, os olhos marejados. — Vou viajar pelo mundo com a minha esposa!

Do alto da escadaria, Lian observava a cena enquanto aguardava o motorista trazer a pasta esquecida no carro. De lá, podia ver os dois lados da mesma história: de um lado, a serenidade da vitória, com Aurora e Pierre sorrindo juntos; do outro, a fúria da derrota, Damien vermelho de raiva, berrando insultos.

Quando Aurora gargalhou, Damien, ao ouvir, rugiu de fúria. Cego de ódio, avançou na direção dela. A advogada, concentrada na conversa, parecia distraída, mas sentia cada passo ameaçador se aproximando.

Lian, observando a cena de longe, percebeu o perigo. Sem hesitar, desceu correndo a escadaria, pronto para intervir.

Mas antes que pudesse alcançá-la, Aurora moveu-se. Com um giro ágil e preciso, esquivou-se do ataque e, num gesto rápido, fez Damien tropeçar. Ele caiu com estrondo, o corpo atingindo o chão com brutalidade, incapaz de reagir imediatamente.

Por um instante, o juiz conteve a respiração. O susto logo deu lugar a um sorriso admirado. Aquela mulher o deixava sem palavras. Que mulher era essa? — pensou, a mente inquieta.

S. Santos

Oi, pessoal!Espero que estejam gostando da história!Quero agradecer de coração a cada um de vocês por estarem aqui. 💖 Beijos, e continuem acompanhando esse juiz irresistível e essa advogada maravilhosa. Ainda vem muita emoção por aí...

| 1
Continue lendo este livro gratuitamente
Digitalize o código para baixar o App
Explore e leia boas novelas gratuitamente
Acesso gratuito a um vasto número de boas novelas no aplicativo BueNovela. Baixe os livros que você gosta e leia em qualquer lugar e a qualquer hora.
Leia livros gratuitamente no aplicativo
Digitalize o código para ler no App