"Mesmo sem enxergar, vi no beijo de Fernando um abismo ardente — e escolhi cair, ainda que minhas asas jamais me salvem da queda."
🖤
Desde que o beijo aconteceu, as coisas nesta casa mudaram. Não sei explicar como, mas mudaram. Fernando não é um homem que se deixa ler com facilidade. Ele fala pouco, controla a voz e mede os gestos. E, mesmo assim, há algo diferente nele desde aquela noite. Algo que não consigo nomear, mas sinto — e, para mim, sentir é tudo.
Quando ouvi os passos no corredor naquela manhã, soube que era ele antes mesmo de abrir à porta. Dificilmente ele pede permissão para alguma coisa, contudo, apesar de entrar sem aviso, naquele momento eu sentia o peso e a angústia em cada um dos seus gestos. Com toda certeza havia se arrependido de seu ato intempestivo. Afinal, era óbvio, que beijar uma cega não estava em seus planos. Há uma firmeza no caminhar de Fernando, sempre houve uma cadência que aprendi de cor. Mas, dessa vez, havia um peso ali. Não era pressa, nem ameaça…