📓 Narrado por Clara — Sexta-feira, 20h31 da noite
O carro avançava pela estrada estreita, as luzes da marina ficando pra trás.
Lá fora, o mar batia nas pedras. Lá dentro, o silêncio batia mais forte.
Miguel estava sentado ao meu lado, no banco de trás.
Postura impecável, terno alinhado, o rosto voltado pra frente mas a raiva era quase palpável.
O motorista dirigia quieto, discreto, como quem sabia que estava presenciando algo que não devia ouvir.
Ninguém disse nada nos primeiros minutos.
O único som era o motor e o estalo baixo do ar-condicionado.
Até que ele quebrou o silêncio.
— Tinha mesmo que deixar ele te tocar daquele jeito?
A pergunta veio como um soco.
Baixa, seca, afiada.
Olhei pra ele, sem entender se era ciúme, provocação ou simples crueldade.
— O senhor tá falando de quê? — perguntei, tentando manter a calma.
Miguel virou o rosto devagar.
O olhar dele pousou em mim como lâmina.
— Do beijo na sua mão, Clara. — disse, frio. — Do tempo que você levou pra tira