— Sabe que empresas evitam contratar mulheres com filhos pequenos, não? — a voz dele soa crua e Olivia engole em seco.
Ela não respondeu de imediato. O rosto queimava, respirava com dificuldade, seus pés pesados como âncoras.
Ela travou. Sentiu o chão desaparecer. Estava de volta aquelas salas de entrevista. Aos olhares desconfiados. As negativas. Aos sorrisos condescendentes.
“Mães solteiras não são prioridade.”
“Seu filho vai comprometer sua produtividade.”
“Não temos estrutura para mães solo.”
— Eu sei. Mas... não quis mentir. Mesmo sabendo que talvez fosse recusada. — ela murmura, baixinho.
O escritório parecia estar se tornando cada vez mais claustrofóbico, as paredes fechando-se ao seu redor. Ela se esforçava para manter a compostura, mas o estômago estava um nó
Ian ficou em silêncio, impassível. A expressão dele era gelo absoluto, os olhos observando-a sem um pingo de emoção. Mas então, ele se inclinou, a voz agora baixa, afiada e cortante:
— Você faria qualquer coisa para manter esse emprego?
A pergunta atingiu seu peito como uma adega. A verdade é que ela queria gritar, queria dizer que não. Que não podia se submeter a qualquer coisa, que a dignidade valia mais. Mas a dor de ver Leo naquele hospital, a incerteza sobre sua saúde... Isso a sufocava.
Isso a fazia duvidar de tudo que ela acreditava. Ela se lembrava das entrevistas anteriores. Das promessas vazias e das portas fechadas. Ela não queria ser vista como uma mãe em potencial para o fracasso. Não podia perder o emprego. Não podia perder Leo.
E então, como se sua consciência estivesse tentando se proteger, a pergunta se repetia em sua mente. “Você faria qualquer coisa?”
Olivia sentia a garganta fechar, mas não respondeu. Ainda assim, Ian entendeu. Um brilho gélido surgiu em seus olhos.
— Ótimo — disse ele, voltando para sua cadeira.
Ela franziu o cenho.
— Ótimo...? O que exatamente é ótimo?
Ele tirou uma pasta preta da gaveta, e puxou folhas que pareciam já estar ali há tempos, esperando.
— Você disse que faria qualquer coisa. E eu preciso de alguém exatamente assim.
Ela recuou, devagar.
— O que quer dizer com isso?
Ele abriu uma pasta. Tirou papéis já prontos.
— Preciso de uma noiva. Contrato de três meses. Aparência, só isso.
Ela arregalou os olhos, e em seguida, soltou uma risada incrédula.
— Isso é uma piada? — Ela sussurrou as palavras com uma raiva controlada, mas a voz traiu o medo que ela estava tentando esconder.
Ian a encarou, e por um momento, ela pensou que ele fosse simplesmente deixar a conversa morrer ali, mas ele não parecia disposto a deixá-la escapar.
— Não. É um acordo. Você finge ser minha noiva em público. Em troca, emprego garantido, bônus, plano de saúde, estabilidade. Sem obrigações íntimas. Sem toque. Só sorriso.
Ela o encarou como se ele fosse um psicopata. Ficou em silêncio, o estômago embrulhado.
— Isso é doentio.
— É prático. — ele rebateu.
Ela balançou a cabeça com um sorriso amargo, ainda em choque.
— Eu não sou uma peça no seu jogo. E muito menos, um objeto.
— Todo mundo é, Belmonte. Só depende da posição no tabuleiro.
Ele deu um passo à frente. Ela recuou.
Como ele tinha coragem de propor isso? Ele estava querendo brincar com ela, com suas emoções, com sua vida!
— Além do mais — continuou — Todo mundo se vende por algo. Estou oferecendo bem mais do que a maioria.
Ela o encarou, completamente ofendida. E engolindo a raiva que borbulhava dentro dela, disse:
— Eu não. Eu tenho dignidade. Pode enfiar esse contrato ridículo onde quiser.
Ele ergueu uma sobrancelha. Mas não disse nada.
Ela então se virou e saiu, de cabeça erguida. Mas por dentro, tremia.
Saiu do prédio como um furacão contido, tentando manter a compostura enquanto o mundo girava. Caminhou apressada pela calçada, ignorando buzinas, vendedores, turistas.
Entrou em um café qualquer só para respirar. Sentou-se no fundo, de costas para a rua. Pediu um café que nem tomou. A cabeça fervia.
— Ele é louco... completamente louco. — murmurou para si mesma, encarando a xícara.
Olhou para os lados, observando as pessoas. Um casal trocava risadas perto da janela. Um homem reclamava do wi-fi no balcão. E ela ali, afundada em pensamentos. No fundo, sabia que não podia simplesmente descartar aquela proposta, por mais absurda que fosse.
“E se ele estiver certo? E se essa for minha única chance?”
Ela passou a mão no rosto. O café esfriava à sua frente.
No balcão, duas mulheres conversavam e ela não pôde deixar de ouvir.
— ...dizem que o Ian Moretti vai se casar. — disse uma, rindo. — Aposto que é só fachada. Aquele tipo nunca sossega.
— Ah, e ouvi que ele contratou uma assistente nova hoje. Dizem que ela saiu chorando.
Olivia mordeu o lábio, engolindo em seco. Já era o assunto do café.
Levantou-se apressada. No banheiro do lugar, lavou o rosto com água fria, tentando se recompor. No espelho, mal se reconhecia. Os olhos fundos, as olheiras marcadas, os cabelos desalinhados. Respirou fundo.
“Pelo Leo... eu aguento qualquer coisa.”
Ela puxou o celular e digitou uma mensagem para Carla, sua melhor amiga:
"Você já ouviu falar de Ian Moretti?"
A resposta veio rápida:
"O herdeiro frio da Moretti Global? Claro. Por quê? Você não fez entrevista com ele, fez?"
Olívia não respondeu. Apenas guardou o telefone de volta na bolsa. Seu coração ainda batia forte. Mas o pior ainda estava por vir.
Ela decidiu andar até o terminal. Precisava pensar.
No caminho, passou por uma vitrine cheia de roupinhas de bebê e parou. Lembrou-se de Leo, das noites sem dormir, dos primeiros passos. O medo apertou o peito de novo.
“Se algo acontecer com ele... eu não vou suportar.”
Só que o mundo lá fora, a vida real, não a oferecia alternativas. E isso só ficou ainda mais claro quando ela sentou no banco de uma praça, abraçando a própria bolsa como se fosse um escudo. A mente rodava.
“E se ele tem razão?” “E se eu estiver sendo orgulhosa demais?” “E se eu perder o Leo?”
Foi aí que o celular vibrou. Hospital Vitória.
Seu coração parou por um segundo.
Ela atendeu.
— Senhora Belmonte? Aqui é da UTI pediátrica. É sobre o Leo. Precisamos que a senhora venha até aqui imediatamente.
Ela não respondeu de imediato. O mundo pareceu se apagar ao redor.
— Senhora? Está me ouvindo?
Ela apertou o celular contra o ouvido, as mãos trêmulas.
— Estou indo.