Saulo Prado
Angelina estava diferente.
Não era só o horário da ligação, duas e quinze da madrugada. Era o modo como sua voz entrou no meu ouvido: cortante, baixa, quase sussurrada, como se implorasse socorro sem confessar fraqueza. Me acordou num susto. O peito apertou antes mesmo de eu ver seu nome na tela.
O mais estranho?
Ela não chorava.
Saiu de casa como quem abandonava a própria.
Usava uma camisa branca social, a mesma que usa no trabalho. Uma calça verde escura, um pouco larga, como se o corpo já tivesse desistido de seduzir. Cabelos soltos, levemente desalinhados. Sem bolsa. Sem maquiagem. Sem rastro.
Entrou no carro com pressa, como se o banco do passageiro fosse seu único porto seguro.
— Quer ir ao hospital? Quer que eu te leve pra algum lugar? — perguntei, aflito, o coração batendo mais alto que minha voz.
— Pra chácara, Saulo — respondeu sem sequer me olhar, encarando o vidro com olhos duros e vazios, como se olhar pra mim pudesse quebrá-la inteira.
Obedeci. Porque alguma