Narrado por Léa
Eu escutei antes de entender todas as palavras. O tom, aquilo me cortou em dois: a voz de Ares atravessando o corredor, pesada como chumbo, e a resposta seca do Zeus que eu já sabia que não cederia. Fechei a porta do meu quarto devagar, mas a casa é feita de esquinas e ouvidos. As frases se colaram na madeira: “vou tirar essa mulher daqui com as próprias mãos”… “eu te mato antes de você encostar nela”.
Meu estômago virou nó. Luc dormia no meu colo, a cabecinha quente encostada no meu peito. Ele era tão pequeno, tão desnudo ao que vinha lá fora, e eu senti uma raiva tão antiga quanto meus próprios medos: raiva de ser peça, raiva de vir parar no meio de homens que medem o mundo em territórios e alianças.
Sem pensar, passei a mão pelo rosto dele como se limpasse a sorte do futuro. A vontade foi de correr para a sala e gritar para os dois pararem, Ares com suas ameaças, Zeus com sua decisão inapelável, mas minha voz soou frágil para o espaço que eles ocupavam. Em vez disso