A água quente do banho lavara a sujeira e o sangue, mas não o peso do que acontecera lá fora. Agora, na cozinha iluminada por uma lâmpada fraca, o ar ainda cheirava a desinfetante e tensão. Eu aplicava um antisséptico num corte raso no braço de Leo – provavelmente de estilhaços de madeira ao arrombar a porta – com mãos que teimavam em tremer. Ele estava sentado numa cadeira, torso nu, apenas uma toalha amarrada na cintura, observando cada movimento meu com aqueles olhos vermelhos que pareciam ver demais.
O silêncio era espesso, cortado apenas pelo tilintar ocasional do frasco de remédio. Até que ele quebrou, a voz rouca, mas calma: — Nós namoramos há dois meses, né? A pergunta veio como um tiro no escuro. Errei o movimento, pressionando o algodão com mais força do que devia. Ele não reclamou. — Mais ou menos — respondi, evitando o olhar dele, focando no corte. Era uma mentira segura, vaga. Dois meses cobriam o período desde