Um encontro perigoso

Cap 2

Narrado por Zalea Baranov

Meu nome é Zalea Baranov. Tenho dezoito anos e sou a filha mais nova de Ivan Baranov, o homem que carrega o nome mais temido da máfia russa. Para o mundo lá fora, esse sobrenome é sinônimo de respeito e terror. Para mim, ele é uma prisão.

Cresci cercada por grades invisíveis, por olhos que vigiam cada movimento, por silêncios carregados de segredos. A morte da minha mãe, quando eu tinha apenas seis anos, foi o ponto final da minha infância. Ela se foi em silêncio, consumida por uma doença cruel, e com ela, levou tudo o que restava de ternura neste lar gelado.

Lembro-me vagamente de sua risada baixa, do som que fazia ao me ninar, das histórias que contava sobre uma vida além dos muros altos e cercas elétricas. Lembro do perfume de camomila que ficava em seus vestidos e do toque morno das suas mãos afastando meus pesadelos. Hoje, tudo isso parece parte de um sonho antigo, um delírio da infância que a realidade esmagou sem piedade.

Ivan, meu pai, não vestiu luto. Nem por um dia. No funeral, seus olhos estavam secos. Apenas semanas depois, trouxe uma nova mulher para a mansão: Dione. Jovem, elegante e tão fora de lugar quanto eu me sentia naquela casa. Ela não é má. Na verdade, é gentil demais para esse mundo. A paciência com que tenta conversar comigo é quase comovente. Mas não confio em paciência. Ninguém sobrevive sendo doce entre predadores.

Aproximei-me da mansão naquela noite como quem se aproxima de uma arena. A fachada imponente, com colunas de mármore e grades ornamentadas, parecia me observar, julgando minha presença ali. Quando cruzei as portas pesadas de madeira, o caos me engoliu.

— Eles acham que podem me desafiar? — a voz de Ivan explodiu do salão principal como um trovão em uma noite silenciosa. — Quero um relatório completo até amanhã! Nomes, locais, tudo!

A voz dele era um estilhaço no silêncio, reverberando nas paredes de pedra. Fiquei parada à beira da entrada, oculta nas sombras, observando.

Meus irmãos — Viktor, Andrei e Maksim — estavam dispostos ao redor da mesa como generais em uma reunião de guerra. Olhavam para Ivan com atenção calculada, como se cada movimento dele pudesse desencadear uma tragédia.

Dione, ao lado dele, permanecia em silêncio. Seus olhos baixos e mãos entrelaçadas no colo não diziam nada, mas seu corpo gritava desconforto. Uma presença apagada. Apagada por escolha ou por sobrevivência, eu não sabia.

Ninguém olhou para mim. Ninguém se importava.

Subi as escadas sem dizer uma palavra, como um fantasma que vagueia entre os vivos.

No quarto, deixei a bolsa cair sobre a cama. Olhei ao redor e encontrei o mesmo vazio de sempre: paredes brancas demais, cortinas pesadas demais, e uma vista para os jardins onde meu pai enterrava segredos. A mansão Baranov não era um lar — era um mausoléu luxuoso.

Abri o armário e puxei minha bolsa de patinação. Os patins estavam ali, velhos e riscados, mas fiéis. As lâminas ainda afiadas o suficiente para cortar o mundo.

Eles eram meu único refúgio.

Calcei as botas pretas de couro, peguei um casaco e, em silêncio, segui pelo corredor.

A casa tinha rotas secretas, passagens esquecidas, portas discretas que só quem cresceu aqui sabia usar. Passei pela ala dos empregados, desci por uma escada estreita e saí por uma porta lateral. O ar da noite me envolveu como um choque.

A neve caía devagar, em flocos grossos. A lua estava encoberta, mas os postes da rua criavam manchas douradas no chão branco. A cidade lá fora parecia distante, como se Moscou inteira estivesse presa em outra dimensão.

Coloquei os fones e deixei a música invadir meus sentidos. Algo com piano e violino. Triste, melancólico, exatamente como eu me sentia.

O clube de patinação ficava a cerca de cinco quadras dali. Um prédio antigo, discreto, abandonado à noite, mas ainda funcional. Eu tinha uma chave. Consegui através de favores e promessas que não me orgulho de ter feito.

A cada passo, sentia o frio morder minhas bochechas, mas também a liberdade crescendo dentro de mim.

Ao chegar, girei a chave devagar. A porta rangeu como sempre. Entrei e acendi as luzes em sequência, revelando a pista de gelo reluzente. Por um instante, deixei a beleza do lugar me alcançar.

Era aqui que eu respirava.

Aqui, o nome Baranov não tinha poder.

Troquei de roupa rapidamente, vestindo a malha de treino preta com detalhes prateados. Ajustei os patins com firmeza, apertando os cadarços como se eles segurassem minha sanidade.

Ao tocar o gelo, senti a transição. Não era mais prisioneira. Era dançarina, era vento, era fúria contida em elegância.

Comecei com movimentos leves, circulando as bordas, aquecendo o corpo. Depois, acelerei, girando com velocidade, deixando o som das lâminas ecoar pelo espaço vazio.

Fechei os olhos. A música guiava meus movimentos. Os giros, os saltos, os impulsos. Era como voar.

E então, de repente, um arrepio percorreu minha nuca.

Como se algo tivesse rompido o véu da tranquilidade.

Abri os olhos. Diminuí o ritmo. Olhei ao redor.

Nada.

Mas a sensação persistia. Densa. Incômoda.

Eu estava sendo observada.

O clube estava vazio. Eu havia trancado a porta. As janelas estavam fechadas. E, mesmo assim, a sensação de perigo era palpável.

Continuei patinando, fingindo não perceber.

Até que o vi.

No canto mais escuro do galpão, entre a sombra das arquibancadas, uma silhueta.

Alta. Imóvel.

Quase invisível.

Meu corpo congelou. O medo subiu pela minha garganta como veneno.

Mas mantive os movimentos. O que quer que fosse aquilo, não podia saber que eu sabia.

A figura não se moveu. Não falou. Apenas me observava.

Como um caçador paciente.

Meu coração martelava dentro do peito, mas minha mente gritava para manter o controle.

Se fosse um dos capangas do meu pai, já teria se revelado. Se fosse um inimigo… por que esperar?

A tensão entre nós era insuportável.

Deslizei até o centro da pista e parei. O gelo rangia sob meus pés.

A figura deu um passo.

Lento. Preciso. Quase silencioso.

Como se estivesse se aproximando de algo que sabia que já era seu.

Meu sangue gelou nas veias.

Quem era ele?

E, mais importante…

o que queria de mim?

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