Capítulo 4 – O Encontro Nada Amigável - Demian.
Claramente aquele jantar era perda de tempo. Liam insistiu naquele jantar, dizendo que Sophie queria muito que eu conhecesse a melhor amiga dela. Amiga essa que, segundo ele, era “brilhante, dedicada, completamente fora do meu tipo”. Não sei se ele achou que isso me faria desistir ou me instigar.
Quando entrei no restaurante e vi Sophie acenar, pensei que seria apenas mais uma noite entediante. Então, ela chegou.
Tessa Grant. A cientista.
O jeito como caminhava, a postura ereta, os olhos afiados, como se calculasse cada detalhe do ambiente, tudo nela gritava autoconfiança. Mas não era do tipo fútil, como eu costumava ver nos círculos sociais. Era diferente. Irritante e fascinante ao mesmo tempo.
— Tessa, esse é o Demian — Sophie apresentou, sorridente.
Ela estendeu a mão para me cumprimentar.
— A cientista — comentei, sem disfarçar o sorriso de canto. — Já ouvi falar.
Sua mão era pequena e macia, uma corrente elétrica passou pelo meu corpo assim que senti seus pequenos dedos, isso era novidade, ela se afastou logo em seguida, para o meu pesar.
Ela ergueu o queixo, os olhos brilhando em desafio. — Espero que não tenha lido somente jornais de negócios. Imagino que sua leitura se limite a cifras e índices.
A olhei divertido segurando um sorriso. Mantive meus olhos nos seus.
Liam pigarreou, chamando nossa atenção.
— Oi, Tess! Que bom que veio. Estava falando de você agora mesmo para o Dem.
Ele a abraçou e pude ver que o clima ficou mais tranquilo. Liam era meu melhor amigo a muitos anos, ele era a parte boa que faltava em mim e sempre me ajudava a ser uma pessoa menos fria, mas naquele momento, com ela, eu não queria ser alguém diferente, eu iria lhe mostrar que se ela buscava um oponente, bem, ele acabava de encontrar um, e muito determinado a conseguir o que queria.
— Espero que so coisas boas. — sorriu indiferente.
— Só tenho coisas boas para falar de você, Tess.
O veneno na voz dela me arrancou uma faísca de diversão. Eu poderia ter ignorado. Poderia ter sido polido. Mas não. A verdade é que gostei da forma como ela me olhou, como se não se importasse com quem eu era. Como se não tivesse medo de me provocar.
Durante o jantar, cada palavra dela parecia um convite para o embate. Eu testava os limites dela, ela testava os meus. Todos ao redor provavelmente achavam que éramos apenas dois teimosos discutindo por nada. Mas eu sabia. O que existia ali não era simples antipatia. Era tensão. Era química disfarçada de ódio. Era carnal.
E eu gostei. Mais do que deveria.
Levantei e fui até o banheiro, quando estava voltando a vi se despedir de Sophie e Liam e caminhar até a saída. Mas antes que ela pudesse atravessar a porta, segurei firme o seu braço.
O choque nos olhos dela foi tudo o que eu precisava. Eu sabia que a estava irritando, sabia que ela me odiava naquele instante. Mas também sabia que, por um segundo, ela sentiu o mesmo que eu: aquela centelha impossível de ignorar.
Ela puxou o braço com firmeza e saiu apressada, deixando-me sozinho à porta do restaurante.
E eu fiquei ali, observando-a desaparecer, com um sorriso discreto. Porque estava claro para mim: Tessa Grant podia me odiar o quanto quisesse. Ainda assim, era a mulher mais interessante que eu tinha conhecido em anos.
Enquanto observava a porta se fechar atrás dela, um silêncio incômodo tomou conta do ambiente. Eu não era de me deixar afetar por ninguém, muito menos por mulheres que se achavam acima da média. Já tinha visto isso antes, centenas de vezes: charme travestido de arrogância, inteligência usada como escudo. Mas com ela não era só isso. Tessa Grant não era apenas uma cientista cheia de convicções. Ela era uma mulher que não se curvava diante do meu nome, do meu dinheiro, da minha reputação. E isso mexeu comigo mais do que eu gostaria de admitir.
Voltei à mesa, Liam me olhou de soslaio, como se pudesse ler a minha mente. Sophie, sempre atenta, parecia medir minhas reações com um sorriso de canto.
— Então? — Liam provocou, ergueu a sobrancelha. — O que achou dela?
Bebi o restante do meu vinho antes de responder. Não daria a eles o gosto de me ver vulnerável.
— Exatamente como você disse. Brilhante, dedicada… fora do meu tipo. — Soltei a frase com desdém, mas a verdade queimava na minha garganta.
Sophie soltou um riso curto.
— Fora do seu tipo? — ela enfatizou, como se saboreasse cada sílaba. — Não sei se concordo.
Ignorei o comentário, mas não consegui evitar a imagem dela cravada na minha mente. O jeito que arqueou o queixo, os olhos que não piscavam diante dos meus, como se me desafiasse a todo instante. Era quase irritante. Quase.
No carro, a caminho de casa, me peguei tamborilando os dedos no volante. Eu deveria estar pensando nos contratos da manhã seguinte, nas reuniões, nos números que sempre preenchiam minha cabeça. Mas tudo o que vinha era a sensação da pele dela roçando na minha quando segurei seu braço. Foi rápido, quase insignificante, mas suficiente para deixar a lembrança impregnada nos meus sentidos.
Quando parei diante da fachada imponente do meu prédio, percebi o quanto estava distraído. Isso não acontecia. Eu nunca me distraía. Sempre no controle, sempre no comando. E agora? Agora eu estava lembrando do cheiro sutil de flores misturado ao perfume doce dela, lembrando da forma como seus lábios se apertaram em uma linha de raiva, e do calor que percorreu minhas veias quando nossos olhares se cruzaram.
Subi para a cobertura, mas o apartamento parecia mais vazio que nunca. Joguei a gravata em cima do sofá, servi uma dose generosa de uísque e encarei a própria sombra refletida no vidro da janela. Eu podia negar, claro. Fingir que nada tinha acontecido. Mas não seria verdade.
Porque, no fundo, eu sabia: aquela noite não terminava ali. Ela podia fugir, podia me evitar, podia até me odiar. Mas cedo ou tarde, Tessa Grant iria perceber o mesmo que eu já tinha aceitado. Entre nós não havia apenas provocações e choques de ego. Havia algo muito mais perigoso.
E eu estava disposto a apostar tudo para descobrir até onde isso poderia nos levar.