O Café Acácia era um dos lugares preferidos de Mel e Luna desde os tempos da universidade. A decoração rústica, com plantas penduradas no teto e arte moçambicana nas paredes, criava um ambiente acolhedor, quase íntimo. Era o local perfeito para conversas sérias — e Mel sabia que hoje não podia esconder nada da sua melhor amiga.
Luna já estava lá quando Mel chegou, sentada à janela com o habitual cappuccino e os óculos de sol equilibrados no topo da cabeça.
— Olha só quem chegou! — exclamou, levantando-se para dar um abraço apertado. — Estás com uma cara...
— Não digas "horrível" — respondeu Mel com um sorriso cansado.
— Ia dizer "preocupada", mas se quiseres adicionar “horrível” à lista, também serve.
Ambas riram, mas o riso de Mel foi breve. Sentaram-se, e Luna chamou o garçom com a confiança de quem conhecia bem o lugar.
— Um sumo natural de manga para ela — disse. — E uma torrada, porque aposto que não comeste nada desde manhã.
Mel suspirou e recostou-se na cadeira. O café estava tranquilo naquela tarde de terça-feira. Algumas mesas estavam ocupadas por casais, outras por trabalhadores de laptop aberto, mas nada que interrompesse a bolha de sinceridade que sempre surgia entre elas.
— Então... queres contar-me o que se passa? — perguntou Luna, de forma direta. — Eu sei quando alguma coisa está errada. E, desta vez, parece sério.
Mel passou os dedos pelos cabelos, como se tentasse desfazer o nó que sentia na garganta.
— É o casamento. Está tudo a andar. Dário está focado, os nossos pais animados... mas eu...
— Tu?
— Eu não tenho certeza de nada, Luna. E o pior é que... acho que nunca tive.
Luna franziu o sobrolho. — Não estás a dizer isso só por nervos, pois não?
— Não é isso. É... é mais fundo. Nos últimos dias, parece que toda a minha vida está em modo automático. E depois...
— Depois?
Mel hesitou. O nome, o rosto, os olhos intensos... tudo voltou como uma onda.
— Conheci alguém.
Luna ficou em silêncio por dois segundos. Depois encostou-se mais na mesa, interessada.
— Como assim "alguém"?
— Foi tão rápido. No Parque dos Continuadores. Ele estava a desenhar no chão. Um artista de rua. Chamou-me a atenção. Falámos por minutos. Mas... foi intenso. Não consigo explicar. Nunca me senti assim. O modo como ele me olhou... parecia que me via por dentro, sabes?
— Como se te conhecesse desde sempre?
Mel assentiu com os olhos brilhantes.
— E como se me aceitasse, sem esperar nada.
Luna respirou fundo, depois disse, com delicadeza:
— Mel, se três minutos com um estranho conseguem abalar tudo o que construíste com Dário, então talvez o que construíste com ele... nunca foi tão sólido como pensavas.
— Mas Luna, o casamento está marcado. Os meus pais estão tão investidos... e eu também. Já organizei tudo. O vestido está pronto. As flores, os convites...
— O vestido não vai dormir contigo todas as noites. Nem as flores vão abraçar-te quando estiveres triste. Vais partilhar a tua vida com o Dário. E se ele não te faz sentir viva, isso importa mais que qualquer cerimónia.
Mel ficou em silêncio, a digerir cada palavra. Luna não era de falar à toa — e isso tornava tudo ainda mais difícil.
— E se isto for só uma fase? E se estiver só assustada?
— Pode ser. Mas também pode ser a tua alma a gritar por liberdade. Talvez seja hora de ouvi-la.
Mel baixou os olhos, tocando no copo gelado de sumo.
— Ele chama-se Alessandro.
Luna sorriu, pousando a mão sobre a dela.
— Alessandro... soa perigoso.
— Talvez seja. Mas pela primeira vez, sinto vontade de correr o risco.