Layla
Eu poderia fingir que foi só mais uma noite difícil. Poderia vestir a velha armadura, costurar respostas prontas, dizer que sigo sozinha. Mas eu estaria mentindo, e, com ele, a mentira pesa duas vezes.
Depois do que aconteceu com Bart na ONG, a cidade pareceu se calar por dentro. Eu voltei para casa na dificuldade dos passos de quem sobreviveu ao incêndio e ainda cheira a fumaça.
Fechei a porta, encostei a testa na madeira, respirei como quem aprende de novo. O apartamento tinha o silêncio de um templo pequeno. E, no meio desse silêncio, veio a batida. Dele, tudo em mim gritava: ele.
Abri.
Kaleo estava ali, sombrio e impossível, o terno ainda marcando o corpo, o olhar cor do céu feito algo mergulhado em água morna. Não disse nada. Eu também não. Por um instante, só houve o peso do que nunca coube nas palavras.
— Você não devia estar aqui. — falei, num sussurro que não convencia nem a mim.
— Eu sempre estive. — respondeu, encostando o ombro na porta, como se fosse parte da casa