Capítulo 2 – O jogo muda
O som dos passos se aproximou, lento, calculado. Valentina segurou a faca com mais força, o coração acelerando. Quem diabos estava vindo? Dominic manteve os olhos fixos nela, como se estivesse assistindo a um espetáculo preparado só para seu entretenimento. — Vai abrir a porta? — perguntou ele, com uma calma irritante. — Ou prefere que eu avise quem está lá fora que você está aqui? Ela ignorou, avançando até a porta e espiando pela fresta. Um homem de terno escuro estava no beco, mãos nos bolsos, olhando em volta como quem sabia exatamente onde ir. Seus passos não hesitavam, e isso fez a pele de Valentina arrepiar. Quando a porta se abriu, o homem sorriu. — Senhor Ferraz… o senhor sumiu. Valentina se colocou entre ele e Dominic, apontando a faca. — Mais um passo e você sangra. O recém-chegado ergueu as mãos, como se não quisesse problemas, mas o olhar dele dizia outra coisa. Dominic se recostou na cadeira, como se estivesse em casa. — Calma, Victor — disse Dominic, e a forma como pronunciou o nome soou como uma ordem. — A moça está… confusa. Victor lançou a Valentina um olhar frio, calculador. — Quer que eu cuide dela? — Não. — Dominic inclinou o corpo para frente, os olhos presos nos dela. — Quero que ela me diga… quem você achou que estava sequestrando. Valentina manteve o silêncio, mas Dominic sorriu como se já tivesse a resposta. — Achei que fosse só uma noite divertida. Mas você… você é um presente inesperado. O ar no galpão parecia mais pesado. E, pela primeira vez, Valentina se deu conta de que talvez não fosse apenas Dominic quem corria perigo ali. Valentina respirou fundo, tentando manter a expressão firme. O homem diante dela ainda estava preso, mas não parecia um prisioneiro. Era como se a cadeira fosse apenas um trono improvisado. — Não tenho nada para te dizer — respondeu, mantendo a lâmina firme. Dominic riu baixo, um som grave que arrepiou a nuca dela. — Engano número dois da noite, princesa. O silêncio, às vezes, diz mais do que as palavras. Victor ainda aguardava, imóvel, como um cão treinado que só atacaria quando seu dono mandasse. O olhar dele se movia entre Valentina e Dominic, avaliando distâncias, medindo riscos. — Ela é boa — comentou Dominic, como se estivesse analisando uma obra de arte. — Mas ainda está bruta… amadora. Aposto que seu verdadeiro alvo não teria percebido até ser tarde demais. O comentário foi um golpe certeiro no ego de Valentina, mas ela não piscou. — E você acha que sabe de tudo, não é? — Não acho. Eu sei. — Dominic inclinou o corpo, e por um instante, a luz fraca destacou a cicatriz discreta no maxilar dele. — E sei também que, agora que me pegou, não vai se livrar de mim tão fácil. Ela arqueou a sobrancelha. — Isso é uma ameaça? — É uma promessa. O som de um carro parando do lado de fora fez Victor olhar para a porta. Dominic manteve-se impassível, como se já estivesse esperando. — Convidados chegando — disse ele, com um meio sorriso. — Adivinha para quem eles vieram? Valentina apertou a faca com mais força. Ela não sabia quem estava do lado de fora… mas sentia que, a cada segundo, estava perdendo o controle que acreditava ter. E Dominic… parecia estar exatamente onde queria. O som de portas batendo ecoou pelo beco, abafado, mas suficiente para acelerar o coração de Valentina. Ela deu um passo para trás, os olhos indo da porta para Dominic, tentando calcular a distância até a saída. Ele, por outro lado, parecia relaxar ainda mais na cadeira, como se estivesse no camarote de um espetáculo que só ele conhecia o final. — Você ouve isso? — perguntou, quase em tom de confidência. — É o som de que as coisas estão prestes a ficar… interessantes. Victor se moveu pela primeira vez, um passo à frente, o suficiente para obrigá-la a ajustar a posição da faca. — Quem está lá fora? — ela perguntou, tentando manter a voz firme. Dominic não respondeu. Apenas manteve o olhar preso ao dela, intenso, estudando cada microexpressão como se pudesse arrancar respostas sem uma única pergunta. — Curioso como o medo muda o brilho nos olhos de alguém… — murmurou. — Em você, ele parece… fascinante. Valentina sentiu o sangue ferver. — Não estou com medo. — Então está mentindo. — Ele sorriu, lento. — Para mim ou para você mesma? O som de passos ecoou mais perto, e uma sombra cruzou o vidro quebrado de uma das janelas. Valentina girou na direção, músculos tensos. Dominic aproveitou para falar com voz baixa, quase um sussurro que roçou no ar entre eles: — Última chance para me dizer o que realmente quer… antes que tudo mude. A porta rangeu levemente, como se alguém tivesse tocado a maçaneta, e o coração de Valentina pareceu parar por um segundo. E Dominic, com aquele maldito meio sorriso, sussurrou: — O jogo começou, princesa. E você já está perdendo.