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Capítulo 6 – Um Presente Chamado Ruína

Tudo começa no silêncio. Não o silêncio comum das madrugadas, mas aquele que parece te observar. A ausência de som que pesa no ar, como se algo estivesse prestes a acontecer. Era assim que eu me sentia nas noites em que, do alto da minha cobertura, observava São Paulo se mover embaixo de mim. O mundo girava, as luzes dançavam, e eu planejava a ruína.

Eu comecei a me infiltrar devagar no universo de Isabella Ravena. Não a toquei, não me aproximei. Apenas observei. Cada rede social, cada entrevista, cada artigo jurídico que ela publicava. Comecei a frequentar os mesmos eventos, os mesmos ambientes. Mas sempre atrás de uma máscara, uma sombra entre os vultos da elite paulista. Eu estava presente e ausente ao mesmo tempo.

Ela era ainda mais bela ao vivo. Jovem, elegante, séria. Carregava o nome do pai como uma coroa e uma maldição. Seus olhos escuros pareciam sempre atentos, como se já soubessem que o mundo não era um lugar seguro. Mas ela não sabia. Não fazia ideia de que o predador já havia escolhido o momento de atacar.

Naqueles dias, entre um passo e outro do meu jogo, recebi um relatório completo sobre a empresa de Israel Ravena. As finanças estavam em frangalhos. Dívidas ocultas, contratos cancelados, processos judiciais pendentes. A fachada de poder desmoronava pouco a pouco — e ele fazia de tudo para manter as aparências.

Sorri com o gosto do passado queimando na garganta.

— É isso... — murmurei para mim mesmo. — O castelo dele vai ruir. Mas pela minha mão.

Chamei um dos meus laranjas mais experientes, Augusto Lessa. Era um advogado carismático, ambicioso, com um talento nato para mentir com os olhos.

— Você vai se apresentar como investidor estrangeiro. Diga que representa um grupo europeu interessado em reerguer a Ravena Engenharia. Mostre os números certos, fale em capital, crescimento. Dê esperança a ele. Mas cada passo que você der será para enterrá-lo mais fundo. — O encarei, sério. — Quero que ele se apaixone pela salvação antes de entender que está sendo envenenado.

Augusto acenou com um sorriso de quem já havia feito isso antes. — Você quer que ele assine o próprio atestado de morte, sem perceber.

— Não. Quero que ele ache que está assinando a redenção da alma dele. — Me aproximei, baixando a voz. — Mas quando ele descobrir a verdade, eu quero que ele implore. Não por dinheiro. Mas por misericórdia. E eu vou rir.

Augusto riu, um pouco desconfortável. Mas ele sabia: quando eu falava daquele jeito, não havia espaço para dúvidas. Eu não planejava. Eu sentenciava.

Enquanto o plano se desenhava, continuei mexendo nas peças. Em um evento jurídico, vi Isabella de longe, rindo com colegas, sem saber que cada passo dela já era vigiado. Ela passou a menos de dois metros de mim. Usava um vestido azul-escuro, os cabelos presos em um coque simples. Por um segundo, nossos olhares quase se cruzaram. Mas desviei antes. Ainda não era hora.

Naquela mesma noite, liguei para Clara. Não sei o que me moveu. Talvez a saudade. Ou talvez o vazio após ver Isabella tão de perto.

Ela atendeu com a voz rouca de quem chorava há dias: — Pedro?

Fiquei em silêncio por três segundos. O suficiente para ela prender a respiração.

— Você está vivo... — disse ela, quase num sussurro. — Onde você está?

— Longe. — Foi só o que eu disse.

— Por que você sumiu? Por que me deixou assim? — a voz dela falhava. — Eu te amei, Pedro. Eu ainda amo...

— Eu sei. — respondi, seco. — Mas o que eu sou agora não tem espaço para amor.

Ela chorou em silêncio. E eu desliguei.

Fiquei olhando para o celular por alguns minutos. Um pedaço de mim, muito pequeno, quase sentiu algo. Mas logo me lembrei de Israel. Me lembrei do sangue. Me lembrei da dor.

Na manhã seguinte, Lúcio chegou ao escritório. Trazia pastas, contratos, e uma cara de quem havia dormido mal.

— Você está ficando obcecado, Pedro. Tá deixando de ser estratégia e virando sede. Cuidado. Obsessão cega.

— Eu não estou cego. Eu estou iluminado. — Respondi, acendendo um cigarro. — Tudo está claro agora. Eu sei onde atacar, como atacar e quando matar.

Ele se sentou, exausto. — E depois? Quando tudo acabar? Vai sobrar o quê?

— Depois... — sorri com amargura. — Depois eu apago a luz e deixo o mundo em silêncio.

Naquela mesma tarde, recebi uma ligação criptografada de Marcello. Atendi no viva-voz. A voz dele veio grave, exigente:

— A operação já começou?

— Já. O laranja entrou em contato com Israel ontem. Marquei mais duas reuniões. Ele tá desesperado, vai aceitar qualquer proposta.

— Cuidado, Pedro. Ele ainda é protegido por nomes grandes. Não mova tudo de uma vez.

— Eu não quero só arruinar o nome dele, Marcello. Eu quero o ódio. Quero que cada migalha que restar da vida dele seja impregnada com meu nome. E tudo que eu fizer com a filha dele… vai ser cem vezes pior para ele. E quem riu da minha dor... vai chorar por cinco gerações.

Silêncio.

A voz de Marcello voltou, mais baixa, quase sussurrada:

— Você me dá calafrios, Ferraz.

— Ótimo. Sinal de que estou no caminho certo.

Giulia, a esposa dele, surgiu ao fundo da ligação:

— Pedro? Diga a ele que estou com saudade. E que se não vier jantar conosco em breve, vou até o Brasil buscá-lo pelos cabelos.

— Ela sente sua falta. — disse Marcello. — E eu também. Mas não enlouqueça de vez. Construa sua vingança como se estivesse esculpindo mármore. Devagar. Frio. Belo. E mortal.

Desliguei sem responder. Eu não precisava de conselhos. Eu era o conselho agora. O mundo deles ainda não sabia… mas a colheita havia começado.

A Ravena Engenharia estava prestes a renascer. Mas só para tombar com mais força. E Israel Ravena... Israel ia aprender o que era ter o inferno plantado dentro de casa.

Por mim.

***

Dias depois, o próprio Israel marcou um jantar para selar a parceria. Era o cenário perfeito para encenar o último ato do engano.

Augusto e eu chegamos ao restaurante sofisticado com vista para a cidade, cada detalhe previamente ensaiado. Israel nos recebeu com um sorriso orgulhoso e olhos marejados de esperança.

— Rafael Navarro — me apresentei, usando o nome falso, apertando sua mão com firmeza. — Uma honra finalmente conhecê-lo, senhor Ravena.

— A honra é minha, meu rapaz. O que vocês estão fazendo por mim e pela minha família… eu jamais poderei pagar.

— Nosso objetivo é o sucesso mútuo. — respondi, medindo cada sílaba. — E garantir que seu legado não só sobreviva, mas floresça. Estamos aqui para crescer juntos.

Trocamos brindes, planos, promessas. Israel falava como um homem renascido, sem notar que jantava com o carrasco.

— Quero expandir novamente. Talvez até abrir uma filial no Nordeste — disse ele, animado.

— Tudo será possível, com os recursos certos — respondi. — Vamos fazer dessa empresa um nome ainda mais forte que antes.

Ele sorriu, emocionado. Tocou meu ombro com gratidão sincera.

— Rafael… obrigado, de verdade. Você não sabe o que isso significa.

Mas eu sabia.

Enquanto brindava com ele, com aquele vinho caro e falso como nossa aliança, meus pensamentos eram uma tempestade sombria, fervendo sob a pele:

"Esse homem arrancou de mim tudo que eu era. Fez meu sangue escorrer em silêncio, apagou minha infância com medo, prendeu minha alma numa cela de dor. Enquanto ele brindava em jantares como esse, eu rastejava por dentro. Fui feito de cicatrizes, costurado por ódio. E agora ele sorri para mim — sem saber que está me servindo sua alma ao próprio santanas. Tudo o que ele ama será esmagado, tudo o que ergueu, queimado. A cada passo de sua salvação, cavará a própria cova. E eu estarei ali… olhando nos olhos dele, quando a luz se apagar. E direi: fui eu. Eu acendi o inferno."

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