Capítulo 5 A entrevista.

(Eduardo Duarte Galvão)

Eu não gostava de entrevistas. Nunca gostei. Achava uma perda de tempo, na verdade. A maioria das pessoas vinha preparada com frases ensaiadas, mentiras bem embaladas e sorrisos falsos. Mas Laura, minha antiga secretária, havia insistido que eu recebesse a neta dela.

E eu devia esse favor à mulher que me aturou por tantos anos.

Ainda assim, eu estava decidido: não seria fácil. Se essa tal de Luana quisesse o cargo, teria de provar que não era mais uma incompetente.

A campainha tocou. João, meu cuidador, foi até a porta e trouxe a jovem até a sala do meu escritório. Eu a observei com atenção. Cabelos presos de qualquer jeito, roupa simples, olhar tenso. Carregava no rosto uma mistura de medo e determinação.

“Frágil demais para o meu mundo”, pensei. porém ela é uma mulher linda, loira, com um corpo cheio de curvas.

— Sente-se. — apontei para a cadeira em frente à minha mesa.

Ela obedeceu em silêncio, ajeitando-se de forma desconfortável. Eu notei suas mãos tremendo levemente.

Cruzei os braços e comecei.

— Seu nome é Luana Carvalho, mas prefere ser chamada de Lua, certo?

— Sim, senhor. — respondeu com a voz firme, embora seus olhos denunciassem nervosismo.

— Muito bem, Lua. — disse, gelidamente. — Vou ser direto. Não tenho tempo a perder. Vou lhe fazer dez perguntas. Se suas respostas não me convencerem, esta entrevista acaba aqui.

Ela respirou fundo.

— Entendido.

— Primeira pergunta: o que você sabe sobre a Duarte Galvão, nossa empresa?

Ela piscou algumas vezes, surpresa.

— Sei que é um conglomerado que atua em diferentes áreas, desde imóveis até investimentos no setor de tecnologia. E sei que o senhor é o CEO.

— Apenas isso? — ergui a sobrancelha. — Informações que qualquer idiota encontraria no G****e.

Ela mordeu o lábio, respirou fundo e completou:

— Sei também que o senhor tem fama de ser um dos empresários mais exigentes do Rio. E que não tolera erros.

Um canto do meu lábio se ergueu num quase sorriso. Atrevimento. Gostei.

— Segunda pergunta: por que eu deveria contratar alguém sem nenhuma experiência como secretária?

— Porque ninguém aprende nada sem ter uma primeira oportunidade. — respondeu, firme. — Se o senhor me der uma chance, eu vou aprender.

Cruzei os dedos sobre a mesa.

— Terceira pergunta: o que faria se um cliente importante ligasse irritado, exigindo falar comigo, mas eu não estivesse disponível?

— Tentaria acalmá-lo, anotaria todos os detalhes da reclamação e garantiria que o senhor retornaria o contato o mais rápido possível.

— Errado. — cortei, seco. — O que faria seria descobrir imediatamente se o cliente está prestes a fechar ou romper um contrato. Isso é o que importa. O resto é detalhe.

Ela ficou em silêncio por um segundo, mas não baixou os olhos.

— Vou aprender a fazer isso também.

Resolvi apertar mais.

— Quarta pergunta: você fala inglês?

— Não.

— Francês?

— Também não.

— Alemão? Mandarim? — insisti, com sarcasmo.

— Eu mal falo português direito, às vezes. — retrucou, com um meio sorriso nervoso. — Mas posso aprender qualquer idioma, se for necessário.

Eu a encarei, tentando decifrar se aquilo era insolência ou coragem.

— Quinta pergunta: qual é a sua maior fraqueza?

Ela hesitou, depois disse com sinceridade:

— Minha maior fraqueza é ter medo de não ser suficiente para a minha filha. Mas, ao mesmo tempo, esse medo me faz querer dar sempre o meu melhor.

Silêncio. Gostei menos dessa resposta. Era humana demais.

— Sexta pergunta: você é pontual?

— Sempre. — respondeu sem titubear.

— Veremos.

Olhei para ela com frieza.

— Sétima pergunta: já teve algum problema com chefes anteriores?

— Nunca tive chefes anteriores. — respondeu. — Mas imagino que terei problemas com o senhor.

Arregalei ligeiramente os olhos, surpreso com a audácia.

— Por que diz isso?

— Porque o senhor parece ser... insuportável.

O ar ficou pesado. Por um momento, pensei em encerrar a entrevista ali mesmo. Mas havia algo naquela ousadia que me instigava.

— Oitava pergunta. — continuei, ignorando a provocação. — O que você faria se recebesse uma ordem minha com a qual não concordasse?

— Eu obedeceria, mas antes tentaria mostrar outro ponto de vista.

— Errado de novo. — disse, impiedoso. — Você obedeceria sem questionar.

— Não sou um robô, senhor Duarte Galvão. — respondeu, olhando-me nos olhos. — Se o senhor quer alguém que só diga “sim”, talvez devesse contratar uma máquina.

Um silêncio carregado pairou entre nós. Pela primeira vez em anos, alguém ousava me desafiar.

— Nona pergunta: por que você precisa deste emprego?

Seus olhos brilharam de emoção.

— Porque eu tenho uma filha de cinco anos. — começou, a voz embargando. — O nome dela é Sol. Ela é autista e precisa de tratamentos caros, terapias contínuas. Eu não posso falhar com ela.

Minha postura rígida vacilou por dentro, mas mantive o olhar frio.

— Muitas pessoas precisam de dinheiro, Lua. Isso não é motivo suficiente.

Ela respirou fundo, tentando segurar as lágrimas.

— Eu não estou aqui pedindo esmola, senhor Duarte Galvão. Eu estou pedindo uma chance. Porque eu vou me dedicar, aprender, errar e levantar quantas vezes for preciso. Se o senhor me contratar, vai ter em mim alguém que não desiste. Eu não tenho luxo de desistir.

As palavras me atingiram mais do que eu gostaria de admitir.

— Décima e última pergunta. — disse, com a voz mais baixa. — Por que eu deveria acreditar em você?

Ela me encarou, firme, com lágrimas nos olhos.

— Porque, ao contrário de muita gente que já trabalhou para o senhor, eu não quero seu dinheiro, nem seu poder. Eu só quero dar uma vida digna para a minha filha!

A verdade nua e crua daquela mulher atravessara todas as minhas defesas.

Finalmente, apoiei as mãos na mesa e disse:

— Está contratada.

Ela piscou, surpresa.

— O quê?

— Você ouviu. — retruquei. — Não me faça me arrepender.

— O senhor não vai se arrepender!

Continue lendo este livro gratuitamente
Digitalize o código para baixar o App
Explore e leia boas novelas gratuitamente
Acesso gratuito a um vasto número de boas novelas no aplicativo BueNovela. Baixe os livros que você gosta e leia em qualquer lugar e a qualquer hora.
Leia livros gratuitamente no aplicativo
Digitalize o código para ler no App