Eu havia dito que começaria na segunda-feira. Disse que precisava de tempo. Mas a verdade é que, desde a proposta, Victor já estava sob minha pele.
Cheguei ao colégio com a pulseira fina que minha mãe me emprestou, cabelos presos num coque despretensioso e a sensação de que todo mundo olhava mais do que devia. Aparentemente, o boato já tinha começado antes de mim.
Victor estava encostado no carro importado dele, como se fosse o astro de um filme adolescente. Camisa escura, mangas dobradas, o tipo de coisa que faz o uniforme parecer menos uniforme. Quando me viu, abriu um meio sorriso — daqueles que não se ensaia, mas que se sabe exatamente o efeito que tem.
— Bom dia, namorada — ele disse, baixo, só pra mim ouvir.
— Você está se divertindo com isso, né?
— Muito menos do que deveria — respondeu, me oferecendo o braço.
Hesitei por meio segundo. Depois cedi. A química não estava no toque, mas no gesto antes dele: o convite, o espaço, a forma como ele esperava que fosse minha escolha. Isso me desarmou mais do que o contato real.
Entramos juntos no prédio principal, e o mundo pareceu virar para nos observar. Era como se o colégio inteiro decidisse que Isabela Martins havia subido um degrau — mesmo sem saber por quê.
— Então você existe — comentou Laura, uma das meninas populares, ao passar por mim com um olhar carregado de veneno disfarçado.
Victor nem piscou.
— Isabela não só existe como é a melhor parte do meu dia — falou alto, para quem quisesse ouvir.
A sala inteira engoliu em seco. Eu também.
Mais tarde, sentamos lado a lado na aula de química — ironicamente. Victor se inclinava levemente, como se cada movimento tivesse sido pensado para reduzir a distância. A professora falava sobre ligações covalentes, mas tudo que eu sentia era o calor próximo do corpo dele.
— Está nervosa? — perguntou, sussurrando.
— Não. Só concentrada.
— Tem certeza? — Ele encostou o dedo na minha mão, que descansava sobre a mesa. Foi rápido. Sutil. Mas o bastante para que eu sentisse como se meu pulso tivesse sido ativado.
O toque não significava nada. Era parte do plano. Mas minha pele parecia não ter sido informada disso.
Saí da aula com a cabeça girando. Não era amor. Não era paixão. Era alguma coisa entre curiosidade e atração. E, acima de tudo, uma sensação de que eu não deveria sentir nada — mas sentia.
No intervalo, Victor me chamou para almoçar no restaurante externo do campus. Nunca havia ido ali — minha rotina sempre foi o lanche do pacote e um lugar onde ninguém me incomodasse.
— Isso aqui faz parte do acordo? — perguntei.
— Isso aqui faz parte de mim tentando conhecer quem vai fingir ser minha namorada.
— Conhecer para manipular melhor?
— Conhecer para parar de fingir que não quero saber mais.
Fiquei em silêncio. O garçom chegou. Pedi algo simples. Victor escolheu sem sequer abrir o cardápio. Estava acostumado a controlar, a decidir. Mas, estranhamente, respeitava meus limites com precisão cirúrgica.
— Você sempre foi assim... intenso? — perguntei, encarando os olhos dele.
Ele sorriu, devagar.
— Não. Eu sou intenso só com quem me desequilibra.
Talvez tenha sido a frase. Ou o jeito como ele me olhou depois dela. Mas senti algo acender entre nós — algo leve, mas inegável.
Na volta à escola, caminhamos juntos. E antes de nos despedirmos, ele encostou a mão na minha cintura. Nada demais. Só o suficiente para me lembrar que o acordo tinha começado. E que talvez — só talvez — fosse impossível fingir para sempre.