Mundo ficciónIniciar sesiónParalisada.
A palavra era essa. Eu fiquei ali, no meio daquele mar de gente rica, sentindo o fantasma do toque dele no meu cabelo. A frase "Tudo está à venda, Alice" ecoava na minha cabeça como uma sentença. Aquele homem não flertava, ele declarava intenções. Ele não seduzia, ele caçava.
Tentei me recompor, alisar o vestido emprestado e fingir que meu coração não estava tentando fugir pela boca. Minha missão aqui era encontrar um curador, não um predador. Virei-me decidida a ir embora, a esquecer aqueles olhos de gelo e fogo.
Foi quando senti.
Um calor na base das minhas costas. Uma mão firme, mas gentil, pousou ali, guiando-me. Eu não precisei olhar. O cheiro dele, aquela mistura viciante de poder e perigo, chegou antes.
"O leilão principal está começando", a voz de Peter Blackwood soou como um trovão baixo perto do meu ouvido. "Você não vai querer perder o espetáculo."
Não era um convite. Era uma ordem disfarçada de sugestão. A mão dele me guiou pela multidão, e as pessoas abriam caminho como se ele fosse a porra de um rei. Ninguém ousava esbarrar nele. Ninguém ousava olhar pra mim por mais de um segundo. Eu era dele. A mensagem era clara, mesmo que não houvesse contrato, nem palavras.
Ele me levou até a primeira fileira, para duas cadeiras que, obviamente, estavam reservadas. Sentei porque minhas pernas ameaçavam ceder. Ele se sentou ao meu lado, tão perto que nossos joelhos quase se tocavam. O ar entre nós crepitava.
"Nervosa, Alice?", ele sussurrou, o rosto virado para o palco, mas eu sentia seu olhar queimando na minha pele.
"Por que eu estaria?", retruquei, meu sarcasmo soando mais como um miado de gato do que um rugido de leoa.
"Porque você está no covil do lobo", ele respondeu, sem um pingo de ironia.
Antes que eu pudesse responder, uma mulher estonteante, loira e vestida de vermelho-sangue, parou na nossa frente. Ela olhou para Peter com a fome de uma leoa e para mim com o desprezo que se reserva a um inseto.
"Peter, querido! Não sabia que você vinha", ela disse, a voz melosa. "E quem é sua... amiga?" A pausa foi calculada, cheia de veneno.
Peter nem se deu ao trabalho de olhar para ela. Seus olhos cinzentos estavam cravados nos meus. "Ela está comigo, Isabella."
A simplicidade da frase foi um soco no estômago da loira. E no meu. Ele não disse meu nome. Não disse quem eu era. Apenas "Ela está comigo". Uma declaração de posse. Isabella ficou roxa, soltou um sorrisinho falso e se afastou rebolando de raiva.
"Inimigos por toda parte?", provoquei, tentando quebrar a tensão que me sufocava.
Peter finalmente virou o rosto para mim. O sorriso dele era lento, cruel. "Inimigos, amantes, peões... todo mundo tem uma função no tabuleiro, Alice. A questão é descobrir qual é a sua."
Naquele momento, o leiloeiro anunciou a próxima peça: uma pintura a óleo chamada "Pássaro Indomável". A tela mostrava uma fênix com as asas em chamas, presa dentro de uma gaiola de ouro ornamentada. Os olhos da fênix eram de um verde vívido e desafiador.
Exatamente o tom dos meus.
Eu prendi a respiração. Era como se a minha alma estivesse naquela tela.
"Interessante", Peter murmurou, tão baixo que só eu pude ouvir. "A beleza da rebeldia... enjaulada. Quanto você acha que vale?"
A pergunta era sobre a pintura. Mas o olhar dele, que me devorava sem pudor, dizia que ele estava perguntando o meu preço.
"Coisas selvagens não deveriam ter um preço", respondi, a voz embargada.
"Tudo tem um preço", ele repetiu, o lema de sua vida. E então ele levantou a mão. "Um milhão."
A sala ficou em silêncio por um segundo. A oferta inicial era de duzentos mil. Peter não estava dando um lance. Ele estava terminando a conversa.
Outro homem, do outro lado do salão, tentou competir. Peter nem piscava. A cada lance do rival, ele simplesmente dobrava o valor, com uma calma entediada, sem nunca tirar os olhos de mim. A guerra de lances não era sobre a pintura. Era uma demonstração de poder. Para mim.
"Dois milhões e meio", disse o rival, suando.
Peter se inclinou para o meu ouvido. Seu hálito quente na minha pele me causou um arrepio que percorreu meu corpo inteiro. "Ele está tentando comprar um quadro. Eu estou comprando uma declaração." E então ele disse em voz alta, com o tédio de quem pede um café: "Cinco milhões."
Fim de jogo. O martelo bateu. A sala explodiu em murmúrios.
A pintura era dele.
Ele se virou para mim na cadeira, o corpo dele criando uma barreira entre mim e o resto do mundo. A intensidade em seu olhar era quase física, me empurrando contra o veludo da cadeira.
"Viu, Alice?", ele sussurrou, a voz um veludo áspero que prometia prazer e dor. "Eu sempre consigo o que eu quero. E a beleza indomável... é a minha favorita."
Meu corpo inteiro estava em chamas. O ódio e o medo lutavam uma batalha perdida contra um desejo escuro e pulsante que nascia no fundo do meu ser. Eu não era uma convidada naquele leilão.
Eu era a próxima peça do catálogo.







