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CONTRATO DO MEU DESTINO
CONTRATO DO MEU DESTINO
Por: Scarlett Midori
Capítulo 1 : Minha história

> Nota da Autora:

Esta história se passa no Brasil, porém a cidade, instituições e empresas retratadas são criações fictícias. Qualquer semelhança com nomes reais é mera coincidência.

POV de Aurora

A chuva caía fina sobre a cidade, lavando os telhados como lágrimas silenciosas do céu. Apertei o meu sobretudo velho em volta do corpo magro e corri pelas calçadas molhadas, os sons dos meus tênis ecoando como batidas de um coração apressado. A entrevista de emprego tinha sido um desastre—uma porta fechada na minha cara "de novo".

Eu parei em frente a um prédio luxuoso no centro financeiro e fiquei olhando o reflexo de uma mulher cansada e ensopada. “Se ao menos eu pudesse recomeçar…”

Eu vou contar a vocês a minha história. Não foi nada fácil, mas, graças a Deus, ainda estou aqui, e vou lutar até o fim pelas pessoas que eu amo.

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Eu sou Aurora Lemos, tenho 23 anos. Sou filha de um mecânico que fez de tudo para garantir o pão na nossa mesa. Infelizmente, meu pai tem um problema cardíaco, algo que descobriu após casar-se com minha mãe, aos 28 anos. Desde então, ele teve várias recaídas, mas continua firme, e eu amo muito ele.

Eu também tenho uma irmã, Sofia, de 17 anos. Ela tem o mesmo problema que meu pai, mas foi diagnosticada mais cedo. A doença se manifestou quando ela tinha apenas três anos, e desde então ela vive com aparelhos. A vida dela era basicamente de casa para o hospital, do hospital para casa. Mesmo assim, Sofia é linda e cheia de sonhos, e sua saúde frágil nunca impediu ela de ser otimista. Ela nunca deixa que a condição dela defina quem ela é.

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Eu cuido de Sofia com muito carinho. Nós duas temos uma ligação forte e muito afetiva. Sofia é a razão pela qual eu faço tudo o que posso. É por ela que trabalho duro, é por ela que busco sucesso. Eu quero ter dinheiro suficiente para cuidar dela, para garantir que ela tenha uma chance de cura.

E minha mãe? Ah, a minha santa mãe… Ela sempre sonhou em ter uma boa vida. Casou-se com meu pai pensando que teria luxo e riqueza. Mas, após uns cinco anos de casamento, o tiro saiu pela culatra. Meu pai perdeu o emprego numa das melhores empresas de carros do país. Ela viu sua vida de luxos se esvair. Não éramos ricos, mas tínhamos o suficiente para viver bem. E foi depois que meu pai perdeu o emprego, quando a Sofia nasceu e sua saúde começou a piorar, que começamos a enfrentar problemas financeiros. Minha mãe, que já tinha sido usuária de drogas, voltou aos velhos hábitos. Mas, depois de me ter, ela parou de usar. Foi assim por um tempo, até as coisas piorarem. Quando a situação apertou, ela começou a dar o corpo dela para conseguir dinheiro. Como eu sei disso? Porque eu ouvi ela confessar isso na cara do meu pai, e até dizia, sem nenhum pudor, que os homens com quem ela se relacionava eram melhores que meu pai. Ela falava isso na minha frente e na frente de Sofia.

Meu pai se esforçou para nos proteger disso. Ele nos afastava dela, nos levava para o quarto para não ouvirmos as palavras cruéis dela. Eu sei que ele sofreu, mas ele nunca desistiu de cuidar de nós. Mesmo com as recaídas, mesmo com o coração enfraquecido, ele sempre esteve lá, cuidando de mim e de Sofia. E minha mãe... bem, ela dizia que éramos um bando de doentes, que ela tinha nojo de nós. Eu não tenho problemas cardíacos, e talvez isso seja a única coisa boa que herdei dela.

Quando Sofia fez seis anos, minha mãe fugiu, nos abandonou. A situação da saúde da minha irmã tinha piorado muito, e a necessidade de um transplante de coração era urgente. Não tínhamos dinheiro suficiente para arcar com isso, e o pouco que tínhamos foi roubado pela minha mãe, que fugiu sem olhar para trás. Meu pai ficou desolado, e Sofia, com medo. Eu não me importei com a ausência da minha mãe. Nunca tivemos uma relação de mãe e filha, e eu nunca esperei nada dela. O que me importava era que minha irmã ficasse bem, e meu pai também. Mas a vida não é justa, e meu pai se importou. Ele se importou tanto que, depois de um tempo, ele também acabou na cama de hospital, e aí eu chorei... chorei porque as pessoas que mais amava estavam ali, com grandes chances de morrer.

Naquele momento, eu deixei de ser criança. Com apenas 13 anos, precisei crescer, me tornar adulta e deixar minha infância para trás. Comecei a vender tudo o que podia nas ruas. Nunca reclamei. Nunca pedi por ajuda. Só queria cuidar de quem eu amava. Depois de uma semana, meu pai saiu do hospital, mas com um alerta: Sofia precisava de tratamento urgente, e mesmo assim o dinheiro que tínhamos não era suficiente. Mas eu e meu pai fizemos tudo o que podíamos para garantir que ela ficasse conosco.

A casa em que fomos viver não tinha comparação com a anterior. Era bem pequena, com apenas dois quartos, uma sala que também servia de cozinha e um banheiro. Pelo menos, tínhamos um teto, e isso era o suficiente para nós. Eu e Sofia ficamos no quarto pequeno, enquanto meu pai ficou no outro.

Infelizmente, alguns dias depois, a polícia bateu à nossa porta. Encontraram o corpo da minha mãe em um beco, provavelmente vítima de um crime relacionado aos seus vícios. Meu pai chorou. Apesar de tudo, ele ainda a amava. Sofia não soube da morte da nossa mãe no primeiro dia; foi só no dia do funeral. Ela não entendia bem o conceito de morte, mas sentiu que algo estava errado. E eu? Eu não consegui derramar uma lágrima. Não conseguia. Já tinha chorado demais por ela, por tudo o que ela fez. Não sentia mais nada por aquela mulher.

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Quando nos mudamos para o novo bairro, conheci os vizinhos e fiz um grande amigo, que se foi após alguns anos. Até hoje, sinto falta dele. Quem sabe, algum dia, a vida nos dê uma nova chance de nos encontrarmos.

Mas, mesmo com a saudade desse amigo, fiz outra amiga: Margô. Ela é uma mulher linda, com uma pele morena profunda e cabelos crespos longos. Tem tatuagens discretas nos braços e, apesar de ter crescido em um orfanato, ela não se encaixa no estereótipo de “boa menina”. Margô tem um estilo mais alternativo, com roupas pretas e acessórios góticos.

Margo é mais nova do que eu — tem 22 anos — mas a vida a fez crescer cedo. Ela nunca conheceu os pais. Cresceu em um orfanato e, aos dezoito, foi obrigada a sair de lá e enfrentar o mundo sozinha. Apesar disso, Margo tem uma personalidade forte. É resiliente, decidida, engraçada... E extremamente protetora. Comigo. Com a Sofia. Ela guarda suas próprias dores como se fossem segredos preciosos, mas mesmo sem dizer, eu sei que ela sofre. Mesmo assim, nós nos completamos. Somos mais do que amigas. Somos irmãs de alma. Somos família. E nos amamos profundamente.

Eu só não tive coragem de contar a ela o que aconteceu ontem.

Enzo… o meu ex-namorado. Ex, oficialmente, há algumas horas. Descobri que ele estava me traindo com uma colega de trabalho. E como eu soube disso? Recebi uma mensagem anônima. Um print de uma conversa nojenta, suja, deles dois, falando sobre como o sexo tinha sido bom e sobre os próximos encontros que planejavam para satisfazer as “vontades” um do outro. Eles estavam juntos há meses. Meses. E nos momentos em que eu mais precisava dele — como quando Sofia estava mal — ele dizia que estava ocupado… Mas eu agora sei com o que ele estava ocupado.

Vi os dois juntos ontem. Não consegui evitar. Fui até eles, os confrontei. E o que ele me disse... foi como levar uma facada no peito. Me chamou de analfabeta. Disse que só ficou comigo para tirar minha virgindade. Que não suportava minha família. Que éramos todos doentes. E que não estava nem aí para a Sofia.

Na hora, meu corpo tremeu. A garganta fechou. Só consegui dizer:

— Desaparece da minha vida.

Ele entendeu o recado. Sabia que aquilo era o fim.

Voltei para casa e chorei sozinha. Felizmente, papai estava fora, trabalhando como mecânico. E Sofia tinha ido para a escola. Graças a Deus, nesses últimos dias, ela tem se mantido estável. O tratamento dela é urgente, mas mesmo assim ela insiste em não parar os estudos. Quer continuar. Quer se superar. Tal como eu.

Quando temos tempo, Sofia e eu nos refugiamos nos livros. Ela lê de tudo. Quer aprender, crescer, não depender só de uma saída. É brilhante com cálculos — como eu. Acho que isso vem de família. Raciocínio rápido. E, por mais incrível que pareça, nós duas falamos outras línguas. Autodidatas, determinadas, sonhadoras.

Eu sonho com o dia em que vou terminar meus estudos e dar uma vida melhor para quem eu amo. Para Sofia. Para Margo. Para papai. Para todos. Ai, meu Deus, como eu queria que tudo fosse diferente… Mas, ainda assim, eu agradeço. Por cada minuto que o Senhor me dá com a Sofia. Por me permitir tentar. Por ainda ter tempo de encontrar uma saída.

E então percebi: eu estava parada, encarando aquele enorme prédio da empresa de finanças. Tinha esquecido completamente onde estava e não percebi quando...

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