Inicio / Romance / CONTRATO DO MEU DESTINO / Capitulo 6: Duas horas para acabar com tudo!
Capitulo 6: Duas horas para acabar com tudo!

Capítulo 6 — Vila das Palmeiras

Depois do pedido de casamento mais estranho que já vi na vida, despedi-me do meu pai mais uma vez, pela última vez.

A falta que ele me faz é como um buraco no peito, mas sei que ele queria que eu fosse forte. E eu vou ser. Vou ser forte por mim e, principalmente, pela minha irmã. Não vou deixar que nada nos separe.

Peguei o ônibus e segui para o meu bairro, a Vila das Palmeiras, na sua parte mais humilde. As ruas são estreitas, asfaltadas de forma irregular, com buracos e remendos. As calçadas, quebradas em vários pontos, e, em vez das palmeiras alinhadas que dão nome ao lugar, há árvores espalhadas ao acaso, algumas com folhas secas caindo sobre os fios elétricos expostos.

As casas são simples: muitas de tijolos à vista ou com reboco gasto, pintadas em cores já desbotadas pelo sol e pela chuva. Os telhados variam entre telhas de barro antigas e placas de amianto. Portões enferrujados e muros baixos revelam quintais pequenos, onde roupas balançam em varais improvisados.

No centro do bairro, há uma praça pequena com bancos de cimento, o mato crescendo nos cantos, e um coreto antigo com a pintura descascada. O comércio é formado por pequenos bares, mercadinhos e uma padaria modesta, onde o cheiro de pão se mistura ao de frituras das lanchonetes próximas.

As ruas estão sempre vivas: crianças jogando bola, música saindo de rádios antigos, vizinhos conversando nas calçadas. Apesar da simplicidade e das dificuldades, existe um forte senso de comunidade. Todos se conhecem, todos se ajudam.

Entre os estabelecimentos, há uma cafeteria que sempre foi o meu refúgio: a Doce Helena. O nome veio da dona, uma senhora de cinquenta anos, carinhosa e sempre bem arrumada, mesmo vivendo num bairro simples. Ela diz que os anos passam, mas que nós não precisamos passar com eles.

Assim que desci do ônibus, fui direto para lá. Ao abrir a porta, o pequeno sino — aquele som familiar — anunciou minha chegada. O cheiro doce de café invadiu meus sentidos. Nunca fui fã da bebida, mas admito que o aroma é fascinante. Prefiro chá, talvez por hábito, talvez porque, como estudante de medicina, conheço bem os benefícios e prejuízos da cafeína.

Olhei ao redor do pequeno e aconchegante espaço. Poucas pessoas ocupavam as mesas: algumas acompanhadas, outras lendo. Não me prendi aos detalhes, apenas caminhei até meu lugar habitual, no canto, perto da janela. Dali, eu podia ver a rua: carros passando, crianças brincando de bola e jogando cabra-cega.

— Minha menina linda… Eu sinto muito. — Era dona Helena. Ela me abraçou forte, e eu retribuí. Além de ser uma mulher incrível, ela é a mãe que nunca tive.

— Obrigada, tia Helena — murmurei. Ela se afastou só para me olhar melhor, como se pudesse enxergar as feridas que eu escondia.

— Ai, meu Deus… Vem se sentar, minha menina linda. — Ela me puxou para o canto da cafeteria e me fez sentar. — Quando eu soube, fiquei destruída. O seu pai era um grande homem, pode acreditar. Eu lamento muito.

— Eu sei, tia Helena… Eu acredito. — Eu sabia que ela e meu pai eram como irmãos. Ela estava no funeral, mas eu não consegui prestar atenção em ninguém.

— Eu não queria incomodar mais cedo — disse ela, com um pequeno sorriso.

— A senhora nunca incomoda, tia Helena. Pelo contrário… sempre me ajudou, e eu sou muito grata por isso. — Segurei as mãos dela.

— Eu também sou grata por você, minha linda menina. Já disse que, se Deus tivesse me abençoado com um filho, eu ia querer que ele se casasse com você.

Sorri de verdade. Dona Helena não podia ter filhos, tentou a vida toda, mas sem sucesso. Sempre que nos vemos, ela repete essa frase, e eu nunca discordo — sei que isso a conforta.

— Eu seria a mulher mais feliz do mundo, Helena. — Ela riu.

Passei algumas horas ali, sentindo um pouco de paz. Mas quando decidi voltar para casa...

---

Quando abri a porta, o som de vozes exaltadas quase me derrubou para trás. Gritos. Palavras cortantes.

Entrei correndo na sala e vi o senhor Victor no centro, com o rosto vermelho de raiva, cuspindo cada sílaba como se fossem pedras.

Do outro lado, Margo estava de pé, firme, mas com o olhar faiscando. Sofia, sentada, mantinha-se calada, mas seu rosto… eu nunca tinha visto aquele olhar na minha irmã. Era raiva pura, misturada com algo que parecia medo.

— Saiam daqui! — rugiu o senhor Victor, cuspindo a última palavra como se fosse veneno.

— Quero ver você tirar a gente daqui, seu idiota gorducho! — Margo retrucou, a voz tão afiada que cortaria vidro.

Eu congelei por um instante, sem entender nada. Aquilo parecia um pesadelo.

— O que está acontecendo aqui? — minha voz saiu mais alta do que eu esperava, quase um grito.

Os três pararam. O senhor Victor virou-se para mim, o sorriso torto surgindo no canto da boca. Sofia, porém, nem levantou a cabeça.

— Ah… que bom que você chegou — disse ele, com um tom debochado que me deu náuseas. — Quero meu dinheiro… ou vocês saem da minha casa agora.

Por um instante, achei que tinha ouvido errado.

— Sua casa? — perguntei, sentindo um frio subir pela espinha. — Do que o senhor está falando, senhor Victor? Desde quando esta casa é sua?

Ele riu, um riso baixo e sujo.

— Então ele não contou? — inclinou a cabeça como se estivesse saboreando o momento. — O seu querido pai me devia dinheiro. E, de garantia, colocou a casa no meu nome. Agora… esta casa é minha. Então, recolham suas tralhas e deem o fora.

O senhor Victor era conhecido no bairro: um homem gordo, dentes podres, com fama de usar coisas ilícitas. Também era agiota. Muitos diziam que já tinha abusado de mulheres, mas nunca houve provas — ele sempre escapava da polícia, ou talvez a polícia simplesmente não se importasse.

Balancei a cabeça, incapaz de aceitar aquilo.

— Não. O senhor só pode estar maluco. Meu pai não faria isso. É impossível.

— Maluco? — ele sorriu mais, exibindo dentes amarelados e tortos. — Eu tomo todos os remédios que minha psicóloga manda… mas quer saber? — Ele deu uma gargalhada alta. — Talvez eu esteja mesmo.

Eu tentei me firmar.

— Essa casa… nós compramos quando nos mudamos para cá. Não tem como ela ser sua.

A risada dele cresceu, ecoando pela sala, até lágrimas brotarem nos cantos dos olhos dele.

— Você é muito engraçada, menina. Pergunta para a sua irmã. Ela sabe.

Meu coração disparou. Virei-me para Sofia.

— Sofia… do que ele está falando?

Ela desviou o olhar.

— Sofia! — chamei de novo, a voz falhando.

— Aurora, não… — Margo tentou intervir, mas ergui a mão para que ela se calasse.

— Ela vai me responder — falei, sentindo a raiva crescer. — Vai me responder agora.

Sofia ergueu os olhos e gritou:

— Quer que eu diga o quê?! Que ele está falando a verdade?! Sim, ele está! O papai hipotecou a casa! Satisfeita? Ele fez isso… e eu sabia!

As lágrimas vieram imediatamente, e ela cobriu o rosto com as mãos. Margo se ajoelhou ao lado, abraçando-a e tentando acalmá-la.

— Aí está! — o senhor Victor gritou, com satisfação mal disfarçada. — Agora, façam as malas e saiam. Vocês entenderam?!

O grito dele ecoou tanto que Sofia se encolheu ainda mais nos braços de Margo.

Eu estava paralisada. O mundo parecia girar e eu não sabia para onde olhar, o que dizer ou o que fazer. Meu pai tinha morrido naquele mesmo dia… e agora, a casa dele… nossa casa… estava prestes a nos ser arrancada.

— Você ouviu o que eu disse?! — ele vociferou, dando um passo à frente.

Engoli o nó na garganta.

— Eu… eu não posso deixar a casa do meu pai assim. Por favor, me diga quanto ele devia. Eu pago. Só… me dê um tempo.

Ele riu de novo, dessa vez mais baixo.

— Tempo? Você sabe quanto o seu pai me devia? Quatrocentos mil reais.

Meu corpo inteiro gelou.

— Quatrocentos mil…? — murmurei, mas a voz mal saiu.

Ao lado, Sofia começou a chorar ainda mais alto.

— E vocês vão pagar — ele continuou, aproximando-se mais — com juros. Ou vão se arrepender.

Foi quando vi. Na cintura dele, meio à mostra sob a camisa, estava uma arma.

Meu coração deu um salto, e senti um medo frio escorrer pela espinha. Não por mim. Mas pelas duas únicas pessoas que me restavam.

— Senhor Victor… — falei, tentando manter a voz firme — o meu pai foi enterrado hoje. Pelo amor de Deus, só me dê mais um dia para arrumar as coisas e vamos embora.

Ele sorriu de um jeito que me fez desejar que nunca mais visse aquele rosto.

---

Ele balançou a cabeça lentamente, como se estivesse saboreando a minha súplica.

— Mais um dia? — repetiu, com um sorriso cínico. — Não. Vocês já estão aqui há mais do que deveriam. E, sinceramente, não quero nem mais um minuto com vocês debaixo do meu teto.

Meu estômago revirou.

— Senhor Victor, por favor… — minha voz tremeu, mas eu continuei. — A gente não tem para onde ir. A gente só precisa se organizar…

Ele ergueu a mão, mandando-me calar.

— Não me interessa. Eu não sou obra de caridade. Essa casa é minha agora, e não tenho obrigação nenhuma de ajudar filhas de caloteiro.

A palavra bateu em mim como um tapa.

— Não fale assim do meu pai! — rebati, a raiva tomando o lugar do medo por um instante.

Ele estreitou os olhos, o sorriso sumindo.

— Eu falo como quiser. — E, num gesto brusco, ajustou a camisa, deixando a arma mais visível. — Vou dar duas horas. É o tempo que têm para sumir daqui. Passou disso, e eu mesmo trato de tirar vocês.

Margo se levantou, colocando-se entre ele e nós.

— O senhor não tem direito de ameaçar a gente desse jeito. Isso é crime.

Ele gargalhou, sem humor.

— Crime é dever e não pagar, mocinha. E vocês sabem que não têm dinheiro para brigar comigo na Justiça. Então… economizem palavras e comecem a empacotar.

Olhei para Sofia. Ela estava encolhida, os olhos vermelhos, tremendo. Tudo em mim gritava para protegê-la, mas não havia para onde correr. O chão parecia ter desaparecido debaixo dos meus pés.

— Você ouviu, menina? — Victor voltou a me encarar. — Duas horas. E se eu voltar e vocês ainda estiverem aqui… — ele deixou a frase no ar, mas o peso do silêncio disse mais do que qualquer ameaça.

Ele virou as costas, atravessou a sala com passos pesados e saiu, batendo a porta com tanta força que o som ecoou pela casa inteira.

Por alguns segundos, ninguém se mexeu. Só o barulho abafado do choro da Sofia preenchia o ambiente. Margo respirou fundo e me olhou, como se esperasse que eu tomasse alguma decisão.

Mas eu estava vazia. Só consegui pensar que, em um único dia, eu tinha enterrado o meu pai… e agora, ia enterrar o último pedaço de vida que tínhamos juntos.

---

Sigue leyendo este libro gratis
Escanea el código para descargar la APP
capítulo anteriorcapítulo siguiente
Explora y lee buenas novelas sin costo
Miles de novelas gratis en BueNovela. ¡Descarga y lee en cualquier momento!
Lee libros gratis en la app
Escanea el código para leer en la APP