Quando a saudade bate antes do perigo
ANDRÉ MARTINS ALBUQUERQUE
O carro preto avança pela Anchieta cortando a noite paulista como uma navalha. São quase nove da noite. O painel ilumina meu rosto e as minhas mãos suadas agarradas no joelho. Olho pela centésima vez a mensagem no celular. Cíntia havia me enviado horas atrás:
> “Senhor André, a casa dos pais da Norman é no Jardim do Mar. Rua das Figueiras, nº 1289 – São Bernardo do Campo.”
Repito o endereço mentalmente como um mantra. Jardim do Mar. Rua das Figueiras. Nº 1289. Cada número pulsa na minha têmpora como batida de tambor. Sou eu. André. E isso já é um crime silencioso. Estou agindo fora de tudo. Fora dele. Fora do que deveria.
Ravi está sentado no banco do passageiro, o rosto meio virado para a janela, mas eu sinto o peso do olhar dele sobre mim. Ele não diz nada, mas a presença dele é um espelho. O cheiro de chuva na estrada mistura-se com gasolina e ansiedade. O Brasil tem esse gosto, meio lar, meio campo de batalha.
O motor