Um mês.
Um mês desde o curativo, desde que eu encostei no rosto dele e vi algo rachar nos olhos do homem que me prendeu, desde que acordei nessa casa e ainda não parece real.
Talvez eu também tenha rachado, aos poucos. Devagar e silenciosamente.
Os dias se misturam. A rotina virou uma dança macabra: acordar, comer, encarar as mesmas paredes, escutar passos do outro lado da porta e esperar. Esperar o quê?
Não sei.
Dona Helena é a única alma viva com quem ainda troco palavras. Todos os dias ela almoça comigo, mas nenhum dos seus filhos se junta à mesa. Eles se escondem em outros cômodos ou fingem que eu não existo. Talvez seja mais fácil assim.
Hoje, o sol cai preguiçoso sobre o quintal. O calor deixa o ar mais denso, como se até o tempo tivesse cansado. Resolvo sair do quarto — não para fugir, mas porque o silêncio hoje está mais barulhento que o normal.
Sigo pela casa quase sem fazer barulho. A porta de vidro está entreaberta. Lá fora, Dona Helena está sentada à beira da piscina. As p