Melinda
Enquanto muitas meninas sonhavam em ser princesas ou bailarinas, eu sempre fui diferente. Ainda que por um breve tempo tenha desejado vestir uma coroa ou rodopiar num palco, foi entre páginas e palavras que encontrei meu verdadeiro encanto. Desde cedo, os livros me chamaram mais alto do que qualquer castelo ou sapatilha de balé.
A leitura me apresentou mundos mágicos, personagens intensos e histórias que iam muito além do que eu poderia viver fora do papel. E assim, passei a sonhar com finais felizes, daqueles que surgem nos contos de fadas, onde o amor é celebrado com promessas eternas e olhares que se reconhecem no meio da multidão.
Com o tempo, meu coração passou a desejar algo mais real do que encantado: um amor verdadeiro, como aqueles dos romances que devorava em silêncio. Um amor que fosse fiel, profundo, e que me trouxesse paz.
Era só um sonho, como disse… Um que pensei ter finalmente realizado, mas, como sempre, a vida estava somente me pregando uma peça, e eu paguei caro… O preço foi o meu coração.
Olho para o homem que está à minha frente. O mesmo homem que jurei amar e ser fiel. Sinto as lágrimas descendo pelo meu rosto; porém, não faço questão de secá-las, seria inútil!
Encaro a mulher ao lado dele com nojo. O sorriso debochado que ela exibe me revira o estômago. Quero desesperadamente acreditar que tudo isso é uma mentira, mas sei que não é. E então, sinto meu mundo desabar, lenta e cruelmente, sem que eu possa fazer nada.
Como fui besta!
— Saia daqui, Scarlett. Agora!
A mulher treme com o seu grito e logo passa ao meu lado, praticamente correndo. Não sei qual traição dói mais: descobrir que o meu casamento é uma farsa ou que, além disso, o meu marido vinha tendo um caso com outra mulher.
Sei que nosso começo foi difícil, mas nunca imaginei que chegaríamos a esse ponto. Não queria acreditar que ele seria capaz de fazer isso comigo.
O rosto dele revela medo, desespero e angústia, mas eu não me importo. Não mais.
— C-como você pode fazer algo assim? — Pergunto num fiapo de voz. — Como conseguiu ser tão baixo a esse ponto?
— Mel… — Vejo ele tentando encontrar uma resposta enquanto tenta se aproximar de mim. Afasto-me do seu toque, como se o mesmo estivesse me queimando.
— Confiei em você! — grito, sentindo uma forte dor no meu peito. Lágrimas desciam na minha face como cascatas. — Você mentiu para mim, me usou, me fez acreditar em um amor, que nunca existiu. — Sinto o meu corpo chacoalhar pelo choro que não consigo controlar. — Para quê? Me diz! O que você ganhou com tudo isso?
Mesmo com a vista embaçada pelas lágrimas, consigo vê o desespero em seu rosto, a forma desesperada que tenta se aproximar de mim, sem sucesso. Ele chora, um choro contido, mas que para mim não faz diferença, nada mais faz, tudo que vivi com ele foi uma farsa, não acredito em nada mais que venha dele.
Nada foi real. Tudo em que acreditei até agora não passava de uma ilusão cuidadosamente criada por ele, cada toque, cada palavra, cada promessa. Ele mentiu para mim. Me usou de uma forma tão cruel que ainda me custa aceitar o que acabei de ouvir. Sinto-me suja por ter acreditado nele com tanta ingenuidade. Por ter me entregado achando que era amor.
Quantas vezes ele mentiu olhando nos meus olhos… e eu acreditei! Agora tudo faz sentido, o jeito como começou a me tratar depois do casamento, a forma como falava comigo. Era sempre o mesmo ciclo: me tratava mal e, logo depois, jurava que me amava.
— Mel, você precisa me ouvir… — ergo a minha mão, parando-o. — Eu não sei como explicar para você, tudo começou de uma forma tão errada, mas eu me apaixonei por você, eu te amo!
Um tremor percorre meu corpo, e preciso me escorar na parede mais próxima para não cair. Como ele ainda ousa dizer que me ama? Não consigo mais acreditar nisso. Se tivesse dito essas palavras algumas horas antes, tudo poderia ser tão diferente…
— Não quero saber de mais nada que vem de você. Não acha que já chega de mentiras? Como você consegue mentir dessa forma?
— Juro que não é mentira! Juro para você, só vamos conversar com calma, por favor, amor.
— Não temos mais nada para conversar, esse é o nosso fim, Will. E foi você o causador disso.
Em passos rápidos, peguei a caixa que havia levado para o escritório dele; era uma surpresa, porém quem teve a maior surpresa fui eu. Viro-me, não querendo olhar para o homem à minha frente, o mesmo que há meses atrás dizia me amar.
E, como num flashback, várias cenas vão passando pela minha mente: suas palavras cruéis, as inúmeras vezes em que me tratou mal sem motivos. Confrontei-o tantas vezes para entender o motivo da sua raiva, que para mim não fazia sentido.
Dizem que a sinceridade machuca, mas, para mim, a mentira faz um estrago bem maior…