Helena Duarte
Nossa viagem durou mais do que o planejado, mas passou voando. Dois meses intensos entre reuniões, projetos e noites longas revisando apresentações ao lado de Davi. Agora, ao pisar novamente em solo brasileiro, sentia uma mistura estranha de alívio e saudade. Por mais que estivesse feliz por voltar para casa, uma parte de mim sentia falta da rotina ao lado dele.
Com os dois meses de salário que recebi, consegui pagar todas as dívidas que me sufocavam havia anos. Quitar cada uma foi como arrancar pedras dos meus ombros. E, além disso, comprei meu próprio apartamento — pequeno, mas só meu — no centro da cidade, bem perto da empresa de Davi. Era como um novo começo. Um recomeço. Pela primeira vez na vida, eu sentia que estava vivendo de verdade, por mim mesma.
Aos poucos, minha presença na empresa foi se tornando mais sólida. Davi confiava em mim para tudo. Comecei como assistente e hoje atuo como braço direito dele em vários projetos importantes. Ele me elogiava com frequência, destacava meu comprometimento e minha visão estratégica — algo que nunca haviam notado em mim antes.
E foi aí que tudo começou a mudar dentro de mim.
Eu me peguei olhando demais. O sorriso dele. A forma como ele passava a mão nos cabelos quando estava pensativo. Como sempre me tratava com respeito, atenção e até carinho, mesmo sendo meu chefe. Cada gesto que ele fazia, por mais simples que fosse, meu coração reagia como se fosse uma tempestade prestes a explodir.
Eu nunca tive um namorado. Nunca me permiti gostar de alguém. Talvez porque fui ensinada desde cedo que o amor era uma fraqueza, ou talvez porque ninguém nunca se interessou de verdade. Então, o que eu estava sentindo agora? Era amor? Era desejo? Ou era só carência e gratidão por ele me tratar como ninguém jamais tratou?
Me repreendo a cada pensamento mais íntimo. Afinal, ele é meu chefe. Um homem experiente, maduro, que já teve relacionamentos sérios. E eu... bem, eu sou só a menina que finalmente conseguiu sair de casa. Que está aprendendo a viver agora. Talvez esses sentimentos sejam só isso: empolgação de quem está descobrindo a vida.
Mas, ainda assim, quando ele me chama pelo nome, quando sorri para mim do outro lado da mesa, ou quando caminhamos lado a lado pelos corredores da empresa, meu coração insiste em acelerar. Como se soubesse algo que minha mente ainda tenta negar.
Talvez eu esteja vivendo meu primeiro amor. Talvez não.
Mas uma coisa é certa: Davi Montez mexe comigo de um jeito que ninguém jamais conseguiu.
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Davi Montez
Chegamos ao Brasil numa sexta-feira abafada, típica de fim de tarde paulistano. O voo foi tranquilo, mas cansativo, e por isso deixei Helena na porta do novo apartamento dela com uma recomendação simples: “Descanse no fim de semana. Você merece.” Ela sorriu, agradecida, já com as chaves na mão e aquele brilho nos olhos que me fazia esquecer do mundo lá fora.
Eu ia seguir direto para casa — precisava de um banho, um pouco de silêncio e minha cama. Mas quando a vi tentando equilibrar a bolsa, a mala e uma caixa com as duas mãos pequenas, meu instinto me venceu.
— Quer uma ajuda pra subir com isso tudo?
— Se não for incomodar...
— Nunca incomoda.
O apartamento era compacto, mas aconchegante. No centro, perto da empresa, com vista para os telhados antigos da cidade. Já estava mobiliado, com móveis de bom gosto e uma iluminação quente. Havia caixas abertas espalhadas pela sala, algumas etiquetadas com “cozinha” e outras com “eletrônicos” — presentes e compras feitas por sua amiga, que cuidou de tudo enquanto ela estava fora.
— Pelo visto você tem uma boa rede de apoio. — comentei, observando a organização das caixas.
— A Lívia é um anjo. Eu nem vi esse sofá pessoalmente e ela acertou tudo. — respondeu rindo, jogando o cabelo para trás.
Começamos a organizar as coisas. Eu cuidava dos eletrônicos — instalei a TV no painel, conectei os cabos, testei o som. Ela ia abrindo caixas, encaixando os utensílios na cozinha, colocando mantas sobre o sofá, dobrando roupas que iriam para os armários. Entre uma tarefa e outra, ríamos juntos, relembrando algumas situações inusitadas da viagem, como o dia em que ela perdeu o crachá e tentou entrar no prédio da conferência com um broche improvisado de papel e fita.
Foi então que ela disse:
— Vamos testar a Alexa?
— Vai lá. Só cuidado com as escolhas musicais — brinquei, sem tirar os olhos do painel da TV.
Ela deu um comando simples, e segundos depois a sala foi tomada por uma melodia envolvente. Uma daquelas músicas com batida leve e contagiante, que te obriga a bater o pé no chão no ritmo. Enquanto eu ajustava a TV, ouvi passos suaves ecoando da cozinha. Virei o rosto.
Helena estava dançando. Sozinha. Despreocupada.
Nada ensaiado, nada forçado. Ela girava lentamente com uma caneca na mão, mexendo o quadril no compasso da música. Os cabelos soltos balançavam conforme seus movimentos. Os pés descalços deslizavam pelo piso como se ela fosse dona daquele espaço — e, de certa forma, ela era.
Aquilo me pegou de jeito.
Fiquei imóvel por alguns segundos, com o controle da TV na mão, hipnotizado por aquela cena que parecia tirada de um filme. Não era só a dança. Era a leveza, o sorriso verdadeiro no rosto dela, a forma como seus olhos brilhavam ao cantarolar um trecho da música.
Pela primeira vez, vi Helena fora do ambiente corporativo. Sem o crachá, sem a pasta de anotações, sem a postura rígida de assistente. Ela estava em casa. Livre. E linda.
Tão linda que me peguei sorrindo, sem perceber.
Ela notou meu olhar.
— O quê? — disse, rindo e apoiando-se no balcão.
— Nada… só… acho que nunca te vi tão à vontade.
— Bom… esse é o meu lar agora. — respondeu com um sorriso tímido, abaixando o olhar.
Era. E de alguma forma, naquele momento, eu queria fazer parte dele.
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Helena Duarte
Havia se passado apenas só um mês, mas eu e Davi tínhamos criado um vínculo mais do que funcionaria e chefe, afinal ele estava no meu novo lar me ajudando a arrumar tudo.
Ele sentou no sofá e eu me joguei no chão, após finalizar tudo, mechendo no celular para pedir uma pizza, por que agora eu posso pagar bobagens para que eu possa comer.
— Acho que agora vou embora.
— Que nada, acabei de pedir pizza pra gente. — Digo me levantando e indo até o quarto. — Vou tomar um banho, você recebe se chegar?
— Sim. — Ele responde e eu vou para o banheiro.
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Davi Montez
Estava deitado no sofá da casa de Helena, pois fiquei com vergonha de deitar no sofá. Quando a companhia tocou, levantei e fui abrir.
— Helena, peguei sua pizza e me passei por entregadora. — Uma moça acompanha de um rapaz diz entrando do apê, e aí ela me vê. — Oi, quem é você?
— Davi. — Digo sem jeito.
— O patrão da Lena? Muito prazer, e muito obrigada por mudar a vida da minha melhor amiga. — Ela diz colocando a pizza em cima da mesa. — Eu sou a Lua e ele é o Nico, meu noivo.
— Muito prazer. — Digo.
— Oi gente. — Helena diz saindo com os cabelos molhados do corredor do apartamento.
— Viemos te ajudar, mas vejo que chegamos atrasados. — Nico diz.
— Davi me ajudou. — Ela diz pegando pratos, copos para comermos.
— Vocês se tornaram grandes amigos não é mesmo? — Lua diz.
— Sim. — Dizemos em uníssono.
— É bom trabalhar com pessoas honestas. — Digo.
— E é maravilhoso trabalhar com um chefe que reconhece seu esforço. — Helena diz me olhando.
— Digo o mesmo, na minha empresa gosto sempre dessa parceria com meus funcionários. — Nico diz.
E nisso entramos em um diálogo sobre as empresas e possíveis parcerias. Helena tem grandes amigos ao lado dela.
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Helena Duarte
Quando vi Lua e Nico entrando pela porta com a pizza nas mãos, meu coração se encheu. Eles eram minha família do coração e ver os dois ali, no meu novo apartamento, me trouxe um sentimento de pertencimento que há muito eu não experimentava.
Lua, como sempre, entrou tagarelando e cheia de energia. Soltou um “Oi, quem é você?” ao ver Davi, com o jeitinho protetor e curioso que ela sempre teve comigo. Ela logo ligou os pontos e, ao ouvir o nome dele, arregalou os olhos e sorriu como se estivesse diante de um artista famoso.
— O patrão da Lena? Muito prazer, e muito obrigada por mudar a vida da minha melhor amiga. — Ela disse, já colocando a pizza em cima da mesinha de centro e se ajeitando como se a casa já fosse dela.
— Muito prazer. — Davi respondeu, um pouco encabulado com toda a atenção.
— Eu sou a Lua, e esse aqui é o Nico, meu noivo. — Ela completou, apontando para o rapaz alto e sorridente ao lado dela.
— Oi, gente. — Falei, secando o cabelo com uma toalha, ainda sentindo o frescor do banho. Estava com uma camiseta larga e um short confortável — totalmente à vontade. Nico me lançou um sorriso caloroso.
— Viemos ajudar, mas vejo que chegamos atrasados. — Ele comentou, rindo.
— Davi me ajudou. — Respondi, lançando um olhar carinhoso para Davi, que se limitou a sorrir tímido enquanto se ajeitava no sofá.
Comecei a pegar pratos, copos e guardanapos para todos nós, e logo nos acomodamos ao redor da mesinha improvisada. Entre mordidas na pizza e goles de refrigerante, a conversa fluiu naturalmente.
— Vocês se tornaram grandes amigos, não é mesmo? — Lua observou, cruzando os braços com um sorriso malicioso no rosto.
— Sim. — Respondemos juntos, rindo da coincidência.
— É bom trabalhar com pessoas honestas. — Davi comentou, e seus olhos encontraram os meus com uma intensidade que me fez engolir em seco.
— E é maravilhoso trabalhar com um chefe que reconhece o esforço. — Respondi no mesmo tom, tentando não corar.
— Digo o mesmo. Na minha empresa, gosto sempre dessa parceria com meus funcionários. — Disse Nico, entrando na conversa.
E, como se o clima já não estivesse bom o suficiente, começamos a falar sobre negócios. Nico contou um pouco sobre a startup de tecnologia que ele e Lua estavam montando, e Davi se mostrou genuinamente interessado. Logo os dois estavam falando sobre estratégias de expansão, investimentos, marketing digital e possíveis integrações com a área de inovação da empresa do Davi.
— Acho que temos um futuro parceiro aqui, hein? — Nico comentou, erguendo o copo de refrigerante em direção a Davi, que brindou com ele.
— Helena, você só anda com gente boa mesmo. — Lua brincou, dando uma piscadinha para mim.
Eu apenas sorri, observando aquela cena e sentindo algo quente crescer dentro de mim. Estar ali, com pessoas que me respeitavam, que viam valor no meu trabalho, que riam comigo e me ajudavam sem esperar nada em troca... era tudo novo. E era tudo que eu sempre quis.
No meio daquela noite leve e recheada de conexões, percebi que aquele apartamento já estava ganhando alma. E que talvez, só talvez, o que eu sentia por Davi estava se tornando mais do que um simples “fogo de palha”.
Talvez fosse o início de algo verdadeiro.
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