Capítulo 7

Na manhã seguinte, o sol surgiu tímido, filtrado por nuvens pálidas que deixavam o céu em tons de cinza claro. O silêncio parecia mais profundo após o conserto da cerca. Como se a casa, por um breve instante, tivesse voltado a respirar com calma.

Eleanor acordou com um propósito. Passara a noite inquieta, revendo mentalmente cada palavra trocada com Theo. Havia algo nele que se prendia aos seus pensamentos — não apenas o mistério, mas o modo como ele parecia entender sem perguntar demais. A forma como suas palavras batiam com exatidão em pontos que ela tentava esconder de si mesma.

Ela decidiu organizar a antiga biblioteca da tia — uma sala estreita, com janelas pequenas e estantes abarrotadas do chão ao teto. Boa parte do conteúdo era antiquado: romances vitorianos, guias de botânica, volumes empoeirados de filosofia e psicologia. Mas entre dois livros encadernados em couro, ela encontrou algo diferente.

Um caderno.

Não um diário completo, mas uma espécie de compilação: anotações pessoais, recortes de jornal colados com fita adesiva amarelada, desenhos simples de flores silvestres e, em meio a tudo isso, fragmentos que pareciam confissões.

Folheou as primeiras páginas, que falavam sobre a solidão do inverno e o som das árvores ao vento. Mas foi mais adiante que o nome apareceu.

Ravenscroft.

Seu coração acelerou, como se ela tivesse descoberto algo proibido.

"Hoje vi o menino dos Ravenscroft novamente. Estava no lago, sozinho. Sempre sozinho. Há uma melancolia no modo como ele olha para a água… como se quisesse desaparecer nela."

"A mãe dele passou pela feira sem levantar os olhos. Ainda sussurram sobre o que aconteceu com o irmão mais velho. Mas ninguém sabe os detalhes — só especulações, meias verdades."

"Algo naquela família parece… partido."

Eleanor fechou o caderno por instinto, como se alguém a tivesse flagrado lendo. Sentou-se devagar, o peso das palavras reverberando em sua mente.

Então Theo era "o menino dos Ravenscroft". Aquilo confirmava que sua tia o conhecera. Talvez mais do que o vilarejo gostaria de admitir.

Levantou-se e caminhou até a janela. Lá fora, as árvores balançavam suavemente. O lago não era visível dali, mas sua presença era sentida — uma massa imóvel e misteriosa, sempre à espreita.

Havia uma dor em Theo que ela começava a reconhecer. Um tipo de silêncio que se aprende na infância e nunca mais abandona. Eleanor conhecia bem essa linguagem muda. Aprendera a falar com o silêncio desde cedo — primeiro na ausência do pai, depois na presença opressora de um homem que dizia amá-la enquanto a desfazia em pequenas partes.

Voltou ao caderno. Havia mais. Um recorte de jornal chamava atenção. A data era de oito anos antes.

“Família tradicional envolvida em tragédia às margens do lago.”

O texto era vago. Dizia que uma fatalidade havia atingido os Ravenscroft. Um jovem — o primogênito, aparentemente — teria sido encontrado morto no lago. A investigação fora arquivada como acidente. Mas o vilarejo não perdoava. A morte nunca é só uma tragédia em lugares pequenos. Sempre vira uma história contada em sussurros.

— É por isso que te olham daquele jeito… — sussurrou Eleanor, como se falasse com Theo à distância. — Não foi você, mas foi o seu nome.

Fechou o caderno com delicadeza e apoiou-o no colo. Sentia uma estranha ligação entre o passado dele e o dela, como se ambos carregassem a marca de algo que nunca lhes pertenceu por completo — um fardo herdado, como a casa, como a culpa.

O som de passos na varanda a fez sobressaltar. Mas quando correu até a janela, não havia ninguém. Apenas o ranger da madeira antiga sendo empurrada pelo vento.

Mesmo assim, trancou a porta.

E pela primeira vez desde que chegara, pensou que talvez a casa quisesse protegê-la.

Ou talvez apenas quisesse que ela descobrisse o que tanto tentou esquecer.

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