Capítulo 6: Fogo em palha

Sandra saiu do escritório de Dante como uma tempestade prestes a destruir tudo no caminho. As pernas tremiam de raiva, o rosto queimava e o orgulho ferido parecia um animal rasgando seu peito por dentro. Ela jamais havia sido humilhada daquele jeito. Nunca, nem quando Celeste estava viva Dante havia falado daquela forma com ela.

Uma humana.

Uma humana tinha virado o mundo dela de cabeça para baixo.

Desceu as escadas com força, fazendo os passos ecoarem pela mansão como lâminas batendo no chão. Era proposital, queria que todos ouvissem como ela estava irritada, que todos soubessem o quanto Dante havia ultrapassado todos os limites.

Quando virou o corredor, encontrou Elena e Cassandra apoiadas na grande mesa de madeira da sala comum. As duas imediatamente ergueram os olhos.

— Então é verdade — Cassandra murmurou, cruzando os braços. — O alfa brigou com você por causa da humana!

Sandra apertou os dentes com tanta força que a mandíbula doeu.

— Ele a protegeu — disse, cuspindo as palavras como veneno. — Ela é só uma humana idiota, uma fugitiva sem dinheiro. Mas ele está… diferente. Ele está selvagem, agressivo… Tudo por causa daquela maldita!

Elena sorriu, aquele sorriso calculado que sempre antecedia problemas.

— Se você quer se livrar dela, podemos te ajudar. Não deve ser difícil, humano são frágeis.

Sandra se aproximou, olhos estreitos.

— Como?

— Humanos têm medo de tudo que não entendem — Elena respondeu, mexendo nos cabelos com descaso. — Se ela descobrir algo… perigoso sobre nós… vai correr tão rápido que vai deixar poeira no ar. Não vai nem se despedir do filhote do alfa. E no caminho podemos… Simular um “acidente”. Pobrezinha da humana, ficou tão assustada que morreu.

Cassandra completou:

— Se ela vir o que somos, vai fugir. Humanos não aguentam a verdade.

Sandra respirou fundo, sentindo a esperança surgir como uma chama.

— Então o que estamos esperando? Vamos acabar com essa desgraçada.

— Essa ideia é arriscada — Cassandra comentou. — Dante mataria qualquer um que a machucasse, pelo que você está falando.

— É só ele não saber que fomos nós. — Sandra disse, com um sorriso frio. — E, quando ela fugir, ele vai perceber que essa baboseira toda era apenas um capricho. Vai voltar para mim.

Elena e Cassandra trocaram olhares rápidos.

— Precisamos esperar o momento certo — Elena disse. — Essa noite, talvez.

Sandra assentiu.

Sim.

Essa noite.

***

Kian apagou assim que encostou a cabeça no travesseiro. O dia havia sido longo, cheio de brincadeiras no jardim e gargalhadas que tocavam o coração de qualquer um que estivesse por perto.

Liana ficou ali por alguns minutos, sentada ao lado da cama dele, observando o menino dormir com aquele rosto angelical e calmo. Ela o cobriu com cuidado, ajeitou o travesseiro e saiu devagar, sentindo uma onda estranha de paz, algo que não sentia há muito tempo. Pensou em sua irmã e em seu noivo em como estariam, mas lobo balançou a cabeça e se levantou, precisava deixar eles pra lá. A única parte boa de não ter um celular, era o fato de não conseguir mais falar com eles ou ver nada nas redes sociais.

No quarto de hóspedes, ela encontrou sobre a cama um conjunto de roupas femininas: uma calça de algodão macia, uma blusa confortável, e até uma lingerie nova dobrada cuidadosamente.

Ela tocou o tecido.

Quem tinha colocado aquilo lá?

O nome veio automaticamente à mente.

Dante.

O pensamento fez seu estômago se contrair. Ela não sabia por que aquilo a afetava tanto, ele era assustador, imprevisível, irritante, estava mantendo-a preso ali por um motivo que Liana não entendia… e ao mesmo tempo, havia algo nele que puxava sua atenção como um ímã.

Liana tomou um banho rápido e vestiu as roupas. A blusa servia perfeitamente, a calça a abraçava com conforto. Sentia-se estranhamente cuidada, o que só aumentava sua confusão.

Quando chegou à cozinha, encontrou Dante sozinho, encostado na bancada de mármore, comendo algo em silêncio. A luz quente da luminária realçava as sombras do rosto dele, a linha forte da mandíbula, os músculos tensos do pescoço.

Ele parecia irritado, irritado de um jeito que deixava a atmosfera pesada.

Liana hesitou.

— Desculpe, não queria atrapalhar… Está… tudo bem? — perguntou, dando um passo tímido.

Aldrich ergueu os olhos devagar, como se estivesse emergindo de pensamentos profundos demais.

— Está — respondeu, mas a palavra soou como se tivesse sido arrancada dele à força.

Ele a olhou de cima a baixo.

A blusa.

A calça.

O cheiro dela depois do banho.

Um brilho diferente passou pelos olhos dele, um brilho que fez a espinha de Liana arrepiar.

Por dentro, o lobo se agitou mais uma vez e Dante puxou o ar com força e até de forma ruidosa, bebendo d cheiro dela enquanto sentia o corpo reagir.

— Obrigada pelas roupas — ela disse, tentando aliviar a tensão. — Eu realmente… precisava.

Ele virou o rosto, como se precisasse se recuperar daquele simples agradecimento.

— Não fiz nada demais.

— Agradeço mesmo assim.

Silêncio.

Um silêncio carregado, espesso, cheio de algo que nenhum dos dois sabia exatamente como nomear. Liana respirava rápido demais, mas tentava disfarçar, Dante parecia calmo por fora, mas por dentro algo o despedaçava.

Ela devia ir embora. Dormir. Sair dali. Qualquer coisa que não fosse ficar perto dele enquanto ele a encarava daquele jeito.

Mas não conseguia.

E então Dante deu um passo na direção dela.

Liana não recuou.

Os olhos dele caíram nos lábios dela por um instante muito longo.

— Você… deveria descansar — ele disse, mas a voz falhou no final.

— Não estou com sono — respondeu.

Os corpos estavam perto demais.

O ar entre eles era quente, quase elétrico.

Dante levantou a mão devagar, como se lutasse consigo mesmo, e tocou o queixo dela com os dedos. 

“Beije-a”, Hades gritava em sua mente. “Toque-a! Marque nossa companheira! Possua aqui mesmo, nessa bancada! Eu a quero!”

Foi um toque curto, tímido, mas que fez todo o corpo de Liana estremecer. Ele a estudava, o rosto, os olhos, a boca, como se não suportasse olhar, mas também não conseguisse desviar.

E então, antes que ela se afastasse antes que Hades tomasse o controle e eles dois fodessem ali mesmo, o alfa se curvou, aproximando os lábios dela, sem conseguir resistir muito mais ao instinto. 

Um beijo que começou impulsivo, urgente, selvagem. Dante a puxou pela cintura, pressionando-a contra o balcão, a boca dele tomando a dela como se finalmente deixasse escapar algo que segurava por tempo demais. Liana correspondeu sem pensar; a intensidade dele incendiava, arranhava, consumia.

Ele era quente. Forte. Devastador.

O cheiro dele, madeira, noite fria, tempestade, a envolveu inteira enquanto sentia o corpo quente pressionado ao dela e o volume duro entre suas pernas. 

Dante esfregava levemente o corpo no dela, tentando, a todo custo, aplacar o fogo que consumia suas veias mas quanto mais sentia seu gosto, quanto mais a lingua macia tocava a sua as mãos delicadas apertavam seus ombros, mais ele sentia vontade de arrancar-lhe as roupas e fodê-la ali mesmo, para que todos a ouvissem gritar seu nome. 

Liana sentiu o corpo tremer, nunca sentiu nada parecido com Justin, nem de longe. 

Mas então… Dante ficou rígido e o beijo foi interrompido tão abruptamente quanto começou. Ele se afastou com violência, respirando como se tivesse sido golpeado. Levou a mão ao rosto, aos cabelos, caminhou para trás com passos grandes.

— Isso… não pode acontecer — murmurou, mais para si mesmo do que para ela, lembrando-se de Celeste dos beijos dela, de como não sentia tudo aquilo que sentiu com Liana em dois minutos mesmo em cinco anos com sua falecida Luna.

— O que…?

Ele levantou a cabeça.

Os olhos dele estavam diferentes, profundos, e Liana podia jurar que os viu brilhar em vermelho por um segundo.

— Vá para o seu quarto, Liana.

— O que eu fiz? — ela perguntou, a voz embargada.

— Vá. Agora!

Ele saiu pela porta lateral da cozinha, sem olhar para trás.

Liana ficou ali, sozinha, o coração batendo rápido demais, os lábios ainda queimando com o toque dele. Tentou entender o que tinha acontecido, por que ele a havia beijado; por que havia fugido; por que o olhar dele parecia conter um segredo muito maior do que qualquer coisa que ela poderia imaginar.

O barulho de algo se movendo no corredor fez Liana se virar, mas ja era tarde demais.

No canto escuro, escondida pela porta entreaberta, Sandra observava tudo. O rosto dela estava deformado pela raiva, seus olhos inflados pelo ódio.

Ela viu o beijo.

Viu Dante perder o controle.

Viu tudo.

— Chega — ela sussurrou para si mesma, saindo do esconderijo. — Ela não vai ficar aqui! Vou sumir com essa maldita por bem ou por mal!

***

Liana voltou para o quarto ainda confusa, tocando os lábios sem perceber. Cada pensamento era um redemoinho, cada batida do coração parecia empurrá-la em direções diferentes.

Precisava ir embora.

Aquilo não era para ela, não podia simplesmente ficar porque ele estava a ameaçando, não podia beijar e ficar completamente maluca pelo cara que estava praticamente a mantendo em cárcere privado. 

“Eu só posso estar completamente maluca, maluca!”

Mas como sair dali?

Sem dinheiro.

Sem celular.

Sem documentos.

Não tinha nada.

Horas se passaram e ela ainda estava acordada, encarando o teto, tentando decidir o que faria, tentando encontrar uma forma de fugir. 

Foi então que ouviu um leve som no chão, algo havia sido empurrado por baixo da porta.

Um papel.

Ela se aproximou e pegou o bilhete.

A letra era firme, masculina, forte.

                                                              Encontre-me no lago.

                                                            Além da linha da mata.

                                                                                                   D.

O coração dela parou por um segundo.

Por que Dante chamaria por ela no meio da madrugada? Depois do beijo? Depois de fugir dela como se ela fosse perigosa?

Liana apertou o papel entre os dedos.

Não deveria ir, talvez fosse uma ideia ridícula, talvez fosse só mais uma confusão esperando para acontecer.

Mas a curiosidade queimava, o beijo queimava. Ela respirou fundo, calçou os sapatos e saiu devagar, tomando cuidado para não fazer nenhum barulho enquanto atravessava a casa.

Liana  caminhou até a linha da mata, o bilhete ainda firme em sua mão.

Mas quando chegou à beira da clareira…

O sangue gelou em suas veias.

Dois olhos amarelos brilhavam entre as árvores.

Altos.  Predadores.

Um rosnado profundo cortou o silêncio.

— D-Dante? — tentou chamar, com a voz falhando.

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