A casa acordou como quem se lembra do próprio nome. O café voltou a ter cheiro de manhã, o corredor de eucaliptos sussurrou palavras que só os pássaros entendem, e o portão, quando rangeu, já não fez Vivian prender o ar. Ela cortou as bordas de um pão com calma exagerada, como se o gesto pudesse ensinar o coração a obedecer a um ritmo mais lento. Escreveu no caderno de capa azul: “Quando o perigo dorme, é porque está sonhando.” Olhou a frase por alguns segundos — não para se convencer, mas para lembrá-la de que a paz, às vezes, finge.
Eduardo saiu cedo, paletó sobre o braço, a gravata na mão. O beijo na testa foi uma promessa breve. “Volto antes do pôr do sol.” Na porta, Aline mediu a rua com olhos de régua e assentiu: perímetro limpo. Vivian ficou observando o ombro dele desaparecer na esquina, e a ausência — por um raro momento — não doeu.
Passou a manhã limpando pequenas desordens: uma pilha de livros fora de ordem, talheres trocados na gaveta, dois casacos ocupando o mesmo cabide.