“Nem todo cuidado é casa; às vezes é cerca.” — (Anotação de R.)

A voz da Dra. Iasmim recua pra longe, como quem se dissolve na borda de uma cena. Eu avanço em minhas memórias.

Por fora, sou Sofia. Por dentro, ainda sou Renata, um nome que guardo em silêncio, como quem esconde um segredo antigo.

Aurélia insiste em me enxergar como filha: sopa fumegante na mesa, cadernos com meu nome rabiscado, lições sobre como atravessar portas sem pedir permissão.

Não havia motivos para querer fugir dali. Ainda não. Quem queria escapar era Lívia. Foi ela quem me puxou para o corredor do serviço, numa noite impregnada pelo cheiro de pano úmido e cera fresca.

— Sofia, preciso de você.

— O que aconteceu? — A pergunta escapou antes que eu pudesse pensar, mas o peso no olhar dela já trazia a resposta, denso como uma tempestade prestes a desabar.

— Eu não quero estar em uma cama que não escolhi. E…

Sua mão deslizou até o ventre, um gesto quase imperceptível, como quem protege uma chama frágil de um vento t