A sala de reuniões estava impecavelmente organizada, mas o ar quente e carregado de expectativa fazia o ambiente parecer menor. Alice distribuía os papéis da campanha, sentindo a pressão pairar sobre a equipe. A nova fragrância de outono não poderia ter falhas, e ela sabia que tudo dependeria do impacto daquela reunião.
O som suave da porta se abrindo chamou a atenção. Algumas cabeças se viraram.
Valentina entrou.
Seu andar era impecável, e por um instante, parecia que tudo ao redor perdia importância. O vestido formal branco lhe caía como uma segunda pele, delineando sua postura elegante e confiante. Ao se aproximar da mesa, com um leve sorriso, destacando seus lábios vermelhos aveludados, sentou-se com graciosidade na cadeira mais próxima, cruzando as pernas com naturalidade. Pousou a bolsa tiracolo ao lado e retirou os óculos escuros com um gesto fluido, deixando-os sobre os papéis.
Seus olhos se dirigiram primeiro a Victor, depois aos demais presentes, como se absorvesse todos os olhares e os catalogasse mentalmente.
— Perdão... faltava só eu? — Perguntou, com serenidade, olhando outra vez ao redor.
Alice se encolheu um pouco por dentro, apesar de ser uma das anfitriãs da reunião. A presença daquela mulher dominava o espaço com uma facilidade desconcertante. Até as luzes pareciam se ajustar à sua presença.
— Então, podem começar. — Disse, com um tom firme que fez todos se endireitarem.
Carlito, acostumado com a aura magnética de Valentina, não se intimidou. Acenou com a cabeça para Alice, fez uma pausa estratégica e sorriu, antes de iniciar a apresentação do lançamento da nova fragrância. Seu entusiasmo era evidente enquanto deslizava os dedos sobre os gráficos e explicava a proposta.
Valentina, chamou a atenção ao retirar da bolsa um par de óculos de grau. Depois, de colocá-lo com precisão, seus olhos dançavam sobre os papéis, analisando os dados e estratégias com calma felina. O olhar era de águia. Os ombros se mantinham retos, com a postura inclinada e tranquila. Cada anotação seguida com precisão. Alice a observava discretamente, fascinada.
Até então, via aquela mulher como a esposa glamourosa do CEO, alguém superficial, envolvida com eventos, aparições sociais e moda. Mas agora, diante dela, via algo completamente diferente: foco, domínio, presença. Valentina era o tipo de mulher que sabia o que queria e como conseguir isso. Seu olhar parecia dizer: “ninguém me supera. Estou pronta para qualquer desafio.” E naquele instante, ela entendeu porque Victor era tão deslumbrado pela mulher.
— Hmm... — murmurou Valentina, os olhos fixos nas propostas. — O conceito da campanha parece bom, Carlito. Mas precisamos ir além da ideia da renovação. O outono não é só uma mudança de estação. É uma transição. É o desapego do que já não nos serve. E é isso que a fragrância precisa capturar. Uma sensação exclusiva de transformação. Não queremos que o cliente compre um perfume qualquer, mas que se destaque. Que seja fiel à sensação que ele remete. Quero que sintam essa conexão.
Carlito assentiu com os lábios comprimidos, respeitoso. Aquilo era típico dela. E ele, embora às vezes achasse suas intervenções provocativas, reconhecia sua visão.
— Claro, Valentina. A nova fragrância, como você mesma analisou, busca exatamente isso: exclusividade. Mas tem que ter leveza também, para transmitir essa sensação mais... familiar e aconchegante.
— Sei, mas ainda considero que falta alguma coisa... — ela inclinou levemente a cabeça, tentando atiçar. — A essência precisa se conectar ao emocional. Perfumes não são somente aromas. Devem gerar memórias. Guardar momentos. Falta um detalhe que torne essa fragrância... inesquecível.
Alice observou como a outra era estratégica. Inteligente. E um tanto direta. Não estava ali para ser um enfeite ao lado do marido. Sua análise era precisa, e os novatos percebiam isso com rapidez. Ela influenciava decisões, comandava a atenção, fazia as pessoas duvidarem do que viam e do que sentiam.
Antes de encerrar, Valentina lançou um olhar sutil para Alice. Um sorriso quase imperceptível curvou seus lábios, e logo voltou a se concentrar em Carlito. Foi um gesto breve, mas o suficiente para que sentisse a pele formigar.
Quando a reunião terminou, todos começaram a se dispersar, voltando aos seus postos. Valentina, como sempre, manteve-se no centro das atenções. Num gesto delicado, puxou Victor pelo braço, olhou-o nos olhos com um sorriso cativante e entrelaçou suas mãos no braço dele. Saíram juntos, como um casal perfeito sob holofotes invisíveis.
Alice permaneceu na sala. Sua função agora era recolher os documentos, organizá-los e levá-los para a assinatura do CEO. Cumpriu a tarefa com eficiência, mas sentia o coração inquieto, desde cruzar o olhar com o da outra. Desligou as luzes da sala de reuniões e seguiu pelos corredores até o escritório da presidência.
Ao entrar, estacou por um instante.
Victor e Valentina estavam no meio de uma discussão cheia de provocações. Não era uma briga, mas havia tensão no ar. As palavras eram curtas e rápidas. A entonação de Valentina era cautelosa, controlada. Victor, por sua vez, gesticulava com contenção. Os olhos intensos, diziam mais do que sua voz. Alice pensou várias vezes antes de entrar, como surgiria num momento íntimo e, ao mesmo tempo, perigoso.
Hesitou na porta. Mas Victor a viu e rapidamente e disfarçou:
— Alice, os papéis, por favor. — Pediu, com um tom polido, como se quisesse apagar o que ela acabara de presenciar.
Ela se aproximou devagar, deixou os documentos sobre a mesa, e recuou um passo.
— Desculpe, eu... já estou indo.
Em um gesto rápido, Valentina inclinou a cabeça.
— Alice, por favor, espere um momento.
Sua voz era serena, mas havia um certo tom que fazia tudo silenciar. Ela a fitou com precisão, os olhos afiados analisando cada gesto da assistente. Alice sentiu como se estivesse sendo provocada novamente. Não pela competência. Mas por algo que desconhecia... que era pessoal.
— Eu quero te fazer uma proposta irrecusável. — Disse Valentina, enigmática.
A atmosfera parecia carregada, Alice ficou confusa. Aquilo a pegou desprevenida.
— Uma proposta? — Repetiu, com a voz mais fina do que o normal. Ela odiava quando sua curiosidade a traía.
Valentina sorriu levemente, mas não disse nada. Apenas se recostou na cadeira, ajeitou os cabelos com um gesto suave, e voltou sua atenção a Victor. Como se estivesse esperando o momento certo para revelar o que tinha em mente.
Alice recuou mais um passo em direção à porta, indecisa. Devia continuar ali? Ou deveria fugir em silêncio, antes que a situação piorasse? Para ela, a esposa do chefe era tanto sedutora quanto perigosa. Isso ascendia um alerta. Valentina gerava um tipo de atenção que silenciava até as palavras.
A situação a mergulhava num turbilhão de dúvidas. E embora o instinto gritasse que deveria manter distância, Alice sabia que o que quer que fosse... não dava para ignorar. Naquele momento só queria descobrir o que a deixava intrigada. Fascinada, talvez.
“Mas afinal... o que Valentina queria propor?”
Essa pergunta martelava em sua mente.