Capítulo 6 - Naira

Eu tento me afastar, mas Brandon por alguma razão se aproxima mais de mim. Segura a mesma moldura na minha mão e olha com carinho. Meu corpo aquece com essa aproximação, com seu perfume que grita por mim desde que despertei dias atrás. Estou nervosa e não consigo esconder, eu me afasto e vou para o quarto.

A madrugada no apartamento era um silêncio morno. O tipo de silêncio que não assusta, mas acolhe. Eu estava deitada na cama, enrolada na colcha que Brandon havia deixado sobre mim mais cedo, tentando dormir, e, como sempre, lutando com meus próprios pensamentos.

As imagens das fotos ainda dançavam na minha mente. Eu e ele numa praia. Eu e ele sob a chuva. Eu e ele... dizendo "sim".

Era estranho pensar que aqueles momentos pertenciam a mim, mas estivessem tão distantes quanto a vida de outra pessoa. E, no entanto, o olhar apaixonado de Brandon em cada uma daquelas imagens era o mesmo que ele me dava agora, dia após dia. Fechei os olhos. Respirei fundo. E deixei que o sono me levasse.

O som do mar foi a primeira coisa que ouvi. Depois, o riso dele, aquele riso rouco e espontâneo que parecia aquecer o ar ao meu redor. Estávamos na mesma praia da foto. O céu era um tom dourado-rosado, como se o sol tivesse se apaixonado pelo horizonte. Eu corria pela areia, de vestido leve, e ele me seguia com um sorriso aberto e os pés descalços. Senti a brisa bater em meu rosto, o cheiro de sal, a sensação de liberdade.

Quando ele me alcançou, me girou no ar, e eu ri com força, jogando a cabeça para trás.

— Você prometeu que não ia correr! — Disse ele, ainda me segurando.

— Eu nunca prometo nada que envolva não correr! — Brinquei, com um olhar cheio de provocação.

Ele me colocou no chão devagar, como se eu fosse feita de vidro. Quase consigo sentir meu corpo desejar o dele com fúria e excitação.

— Você é a bagunça mais linda que já entrou na minha vida, Naira.

Eu sorri. E naquele instante, foi como se tudo fizesse sentido. Meu corpo, minha alma... tudo em mim reconhecia aquele homem. O toque dele. O cheiro da pele. O modo como ele dizia meu nome como se fosse música.

O sonho parecia tão real. Tão inteiro. E, quando ele encostou a testa na minha, sussurrando “eu te amo”, a maré invadiu minha mente. Acordei com os olhos úmidos.

A primeira luz da manhã atravessava a cortina branca do quarto, desenhando padrões suaves na parede. O quarto ainda estava silencioso, mas agora tinha um cheiro leve de café recém-passado vindo da cozinha.

Fiquei deitada por um tempo, tentando prender as imagens do sonho. Cada detalhe. A textura da areia, o som da risada. O olhar dele. Aquela era uma lembrança? Ou apenas um desejo profundo de me lembrar?

Levantei devagar, calcei as pantufas e fui em direção à sala. Brandon estava lá, de costas, mexendo no fogão com a camiseta amarrotada e os cabelos um pouco bagunçados. O sofá, no quarto, ainda estava desarrumado do lado em que ele dormira. Aqui na sala tem uma xícara vazia repousada na mesinha de centro.

Ele virou ao me ouvir se aproximar.

— Bom dia. — sorriu, meio surpreso — Conseguiu dormir?

Assenti, passando os dedos pelos cabelos.

— Tive um sonho.

Ele deixou a espátula de lado, atento.

— Um sonho... bom?

— Sim. — sentei-me no banco da cozinha americana, abraçando meus joelhos — Estávamos numa praia. Eu corria, e você me alcançava. Me girava no ar. Foi tão real.

Brandon pareceu prender a respiração por um instante.

— Foi em uma praia há uma hora daqui. Fomos lá no nosso segundo ano juntos. — sua voz saiu baixa, como se ele tivesse medo de me sobrecarregar — Foi uma das viagens mais felizes que fizemos.

Eu olhei para ele por longos segundos.

— Achei que fosse só imaginação. Mas talvez... talvez tenha sido uma lembrança.

— Pode ser. A memória é assim. Às vezes ela não volta com força, mas com delicadeza. Como se testasse as águas antes de mergulhar.

Ele me entregou uma caneca com chá. Não café, chá. Ele lembrava que eu preferia chá pela manhã. Mesmo sem eu ter dito.

— Eu ainda me sinto uma estranha dentro da minha própria história. — confessei — Mas essa noite... não sei. Foi diferente.

Brandon se sentou à minha frente. Os olhos estavam levemente vermelhos, como se também não tivesse dormido direito.

— Você não precisa lembrar de tudo agora. Só precisa saber que estou aqui. Mesmo que você não lembre de quem eu sou pra você... eu lembro de quem você é pra mim.

As palavras dele me tocaram como um cobertor num dia frio. Eu queria tocá-lo. Queria dizer que talvez meu coração estivesse começando a se lembrar antes da mente. Mas ainda havia hesitação. Medo. Uma parede invisível entre o querer e o agir. Então apenas sorri, devagar.

— Obrigada por dormir no sofá.

— Sempre. Pelo tempo que precisar.

E havia tanta verdade no jeito como ele disse aquilo, que por um momento, pensei em dizer: “Talvez hoje à noite você possa sentar na cama, só me contando sobre a gente”. Mas engoli. Ainda não era hora.

Mais tarde, sozinha de novo, caminhei até a estante. Virei mais uma foto. Era nosso primeiro beijo, aparentemente. Estávamos encostados num carro antigo, o sol se pondo atrás. O beijo não era forçado. Não era uma pose. Era real. Como se o mundo tivesse parado para aquela troca de almas. Toquei meu reflexo no vidro da moldura.

— Eu vou lembrar, Brandon — sussurrei — Não só de você. Mas de mim também.

É a minha vida, quero lembrar, quero vivê-la.

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