Capítulo 05 - Arianna

Arianna entrou em seu apartamento como um furacão: jogou a bolsa no sofá, abriu o armário com tanta força que a porta bateu na parede, enfiou na mala duas calças jeans, cinco blusas, calcinhas e sutiãs que ainda prestavam, o mínimo, o carregador do celular, e o ursinho de pelúcia que ela dormia abraçada desde criança. Nem pensou em maquiagem ou sapato bonito. Tempo era artigo de luxo.

Apressada desceu as escadas correndo, morava no primeiro andar e agradecia a isso, pois sempre o elevador daquele prédio estava em manutenção. Difícil era o dia que não estava.

O porteiro Seu Geraldo ergueu a sobrancelha quando ela passou correndo:

— Vai viajar, menina?

— Vou trabalhar, Seu Geraldo! Consegui um emprego dos bons! Se a Zoe aparecer, fala que eu passo lá, tá? — disse parando com tudo na porta, antes de sair.

Ele sorriu com os dentes tortos:

— Pode deixar. Boa sorte, hein.

Com o pouco dinheiro que tinha, ela chamou um Uber, dentro dele, ela tentou ligar para Zoe três vezes. Mas os créditos tinha acabado na outra ligação. “Droga.” Ela prometeu a si mesma que a primeira coisa que faria com o salário era recarregar o celular e aparecer na padaria para comprar um bolo inteiro para comemorar com sua amiga.

Quando chegou na Angel Hands estava suada, com o cabelo grudado na testa. A van preta já estava ligada, motor ronronando. A Doutora Renata no banco de trás, com as pernas cruzadas, e um pasta preta no colo.

— Entra logo — disse, sem cerimônia, e já empurrou a pasta para o colo de Arianna assim que fechou a porta. — Trinta minutos. Lê tudo. Depois assina onde tem a caneta marca-texto.

A van saiu cantando pneu, tinha horário não podia atrasar.

Arianna abriu a pasta com as mãos trêmulas. A primeira página já dava o tom:

REGRA Nº 1 – O CLIENTE SEMPRE TEM RAZÃO.

Ela revirou os olhos tão forte que quase viu o próprio cérebro.

Uma regra básica que na realidade era muito chata, pois ela sabia que nem todo cliente tinha razão.

Ela seguiu lendo atentamente uma lista interminável. Até a número 35, que estava em negrito, e fez seu estômago dar um nó:

NUNCA, SOB NENHUMA HIPÓTESE, ENVOLVER-SE ROMANTICAMENTE COM CLIENTE OU FAMILIAR. Infração grave → demissão por justa causa + multa de 100 mil reais.

Doutora Renata nem olhou pra ela, só confirmou com a voz fria:

— Já tivemos casos. Não repita a dose.

Arianna engoliu seco. Romance era a última coisa na cabeça dela. Ela queria era pagar a luz atrasada e mandar dinheiro para mãe comprar o remédio do mês.

Meia hora depois a van entrou num condomínio que parecia cena de filme americano. Portões automáticos, segurança armada, jardins que pareciam campo de golfe. Assim que a van parou, a porta foi aberta e um senhor de cara fechada (provavelmente o motorista) tirou a mala do porta-malas. Ao lado dele, uma senhora baixinha, cabelo branco preso, óculos de armação dourada, vestido azul-marinho impecável.

— Senhorita Lima? — perguntou com voz doce, mas firme.

— Sou eu — Arianna respondeu, tentando não parecer uma completa caipira de boca aberta.

— Eu sou a dona Lúcia, governanta. O senhor Martel pediu que a recebêssemos. Ele está chegando do hospital com a bebê.

Arianna sentiu um frio na espinha. Bebê. Hospital. Já estava entendendo o drama. Será que a criança era doente?

— Vamos.

Arianna olhou novamente para Doutora Renata que confirmou, fechou a porta da van e assim o carro saiu.

Respirando fundo ela seguiu a governanta. Um passo na frente do outro, mesmo tremendo.

O prédio era tão alto que, quando o elevador de vidro começou a subir, Arianna teve que fechar os olhos para não passar mal. O estômago vazio reclamava; só tinha tomado aquele café queimado de manhã.

No último andar as portas abriram direto numa sala que parecia capa de revista de arquitetura. Piso de mármore preto, paredes de vidro do chão ao teto, São Paulo inteira acendendo as luzes lá embaixo.

Subiram mais um lance interno de escada. Dona Lúcia ia falando sem parar:

— Eu e os demais empregados saímos às 21h em ponto. Depois disso é só você, o patrão e a criança. Tudo que precisar à noite tem no armário da copa: leite em pó, fraldas, remédios, lenços. Já deixei tudo preparado. Vou te mostrar.

— E… a senhora Martel? — Arianna arriscou.

Dona Lúcia hesitou meio segundo, apertou os lábios.

— Não existe senhora Martel. Ele é solteiro. Descobriu a paternidade tem poucos dias. A mãe biológica… está muito mal. Por isso a pressa.

Arianna só conseguiu balançar a cabeça. Coitada da criança. Coitado dele.

Estava confuso demais aquelas informações, mas ela não ia perguntar mais.

Quando chegaram a um corredor claro. Dona Lúcia abriu a última porta.

O quarto era maior que o apartamento inteiro onde Arianna morava. Cama king, roupa de cama branca cheirosa, abajur dourado, tapete fofo, um closet de portas de correr e banheiro com box de vidro até mesmo uma poltrona no canto.

— Pode desfazer a mala. Quando o senhor Martel chegar eu venho te chamar.

A porta se fechou com um clique suave.

Arianna largou a mala no chão, sentou na beirada da cama e afundou o rosto nas mãos. O colchão era tão macio que parecia abraçar. Por um segundo ela só respirou aquele cheiro de rico, de lençol passado a ferro, de vida que nunca foi dela.

Depois riu sozinha, nervosa, os olhos marejados.

— Meu Deus do céu… onde eu fui me meter?

Levantou, abriu a janela. A cidade inteira brilhava lá embaixo, fria e distante.

Em algum lugar daquele apartamento, um homem que ela nunca viu ia chegar com uma bebê chorando nos braços.

E ela, Arianna Lima, 26 anos, desempregada até ontem, era agora a babá que aquele homem e aquela criança tinham.

Ela respirou fundo, enxugou o rosto molhado pelas lágrimas de felicidade com a manga da blusa e começou a guardar as roupas na gaveta.

Que viesse o que viesse. Ela já tinha sobrevivido a coisa pior. Sabia cuidar de criança e não ia desapontar sua mãe. Ela teria condição de a ajudar.

Agora era só não se apaixonar pelo chefe.

Fácil.

Né?

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