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Capítulo III – O libertino reaparece

Em que um marquês decide que ser recusado pode ser a melhor coisa do mundo.

O Marquês de Hensley não tinha o costume de se interessar por senhoritas difíceis. Na verdade, evitava-as como se fossem sinônimos de trabalho — e trabalho, convenhamos, era uma palavra que lhe causava urticária.

Mas havia algo na senhorita Beatrice Fairweather que lhe tirara o sono. Não era sua beleza — embora fosse belíssima, com cabelos cor de castanha recém-descascada e olhos que pareciam estar sempre julgando o mundo. Nem sua fama, embora as histórias sobre ela já fossem lidas em voz alta nos clubes como se fossem crônicas cômicas.

Era o modo como ela o ignorara. O Marquês de Hensley não era ignorado. Nunca. Desde a infância, quando ganhava mais doces do que merecia, até a idade adulta, quando colecionava mais suspiros do que elogios. Ele era o tipo de homem que entrava em um salão e, sem dizer uma palavra, ganhava atenção.

Beatrice o desarmara com uma simples saída de cena.

E por isso, naquela mesma noite, ele mandou preparar sua carruagem, escolheu seu melhor colete (o azul-acinzentado com botões de prata, aquele que, segundo a condessa de Merivale, "desviava pensamentos virtuosos") e partiu rumo ao número 17 da Rua Willowbridge, onde sabia que a senhorita Fairweather estava hospedada.

Seu plano era simples: reaparecer.

— Sua excelência tem certeza? — perguntou o mordomo, enquanto ajudava o marquês com as luvas. — São quase nove da noite. Uma hora imprópria para visitas.

— Exatamente por isso, Harris. Visitas impróprias são as mais memoráveis.

Chegou à casa da tia-avó de Beatrice com o charme devidamente polido, um buquê de flores silvestres nas mãos e um sorrisinho torto que já causara quatro noivados cancelados.

A criada que atendeu a porta pareceu hesitar ao vê-lo, como se quisesse verificar se ele era de carne e osso ou apenas mais um delírio das damas da alta sociedade.

— Boa noite. Lorde Hensley deseja ver a senhorita Fairweather. — Ele sorriu e estendeu as flores. — Diga que é uma visita rápida. Prometo não usar o charme todo de uma vez.

A moça corou, como esperado, e desapareceu escada acima.

Beatrice, naquele momento, estava vestida com sua camisola preferida — de linho branco, com rendas discretas, o cabelo trançado de modo relaxado, e um livro de Mary Wollstonecraft sobre o colo.

Quando ouviu o nome Hensley, quase deixou o livro cair.

— Aqui? Agora?

— Sim, senhorita — confirmou a criada. — E ele trouxe flores. E... um sorriso muito atrevido.

Beatrice fechou o livro com um estalo. Ela não sabia o que era mais irritante: o fato de ele ter aparecido, ou o fato de uma parte muito pequena, e muito teimosa, de seu coração ter se agitado com a notícia.

Cinco minutos depois, desceu as escadas com um robe elegante por cima da camisola, como quem ia duelar e não receber visitas.

O encontrou na sala de estar, de pé, analisando uma escultura de gosto duvidoso — uma gárgula com cara de pombo. Ele se virou quando ela entrou, e sorriu.

— Senhorita Fairweather — disse ele, com uma reverência exageradamente teatral. — Fico feliz que não tenha me mandado embora.

— Ainda há tempo — retrucou ela, cruzando os braços. — O que deseja, milorde?

— Ah, direto ao ponto. Maravilhoso. Gosto disso. — Ele estendeu as flores. — São para a senhorita. Um gesto de boa vontade... ou provocação, dependendo da interpretação.

Beatrice pegou as flores sem muita cerimônia, examinou-as como se fossem um experimento botânico e as colocou, calmamente, dentro de uma jarra vazia na lareira.

— E agora que já me presenteou...?

— Agora, conversamos. Eu digo absurdos, a senhorita retruca com sarcasmo, trocamos olhares intensos e, eventualmente, algum escândalo acontece. Não é assim que funcionam as grandes histórias?

Ela arqueou uma sobrancelha.

— Isso soa como uma tática de sedução muito mal ensaiada.

— Ah, minha querida Beatrice, se eu quisesse seduzi-la, já teria aparecido com versos ridículos, um colete rubro e um cão de estimação de olhar trágico. Não, não vim seduzi-la.

— Então veio me aborrecer?

— Vim me apresentar formalmente.

Ela suspirou, mas se sentou no sofá, cruzando as pernas com naturalidade.

— Pois bem. Apresente-se, milorde. Diga-me algo que não seja sobre seu título ou sua fama de libertino.

O marquês se sentou diante dela, sem pressa. Por um momento, o tom brincalhão deu lugar a algo mais calmo.

— Nasci Oliver Roderic Llewellyn Lancaster, um nome grande demais para um bebê magricela. Detesto cordeiro assado, prefiro café a chá, falo francês mal e odeio acordar cedo. Tenho um cachorro chamado Bartholomew, que me ignora solenemente. Já fui apaixonado uma vez, mas ela preferiu se casar com um duque... o que, confesso, foi compreensível. E ultimamente, senhorita Fairweather, estou entediado com a vida. Até que ouvi falar da senhorita.

Beatrice piscou.

Aquilo... não era o que ela esperava.

— Sinto muito pelo cachorro — respondeu, por fim. — Quanto ao resto, é uma lista razoável de defeitos.

Ele riu. Riu de verdade. Um som caloroso e sincero, que preencheu a sala como se não houvesse mais ninguém acordado em toda Londres.

— A senhorita é mesmo fascinante.

— E o senhor é mesmo persistente. Não vai desistir, vai?

— Beatrice — disse ele, e foi a primeira vez que usou seu nome sem o "senhorita" —, todos os homens que a pediram em casamento estavam certos de que mereciam um "sim". Eu sou o primeiro que vai lutar pelo seu "não".

Ela franziu o cenho, confusa.

— Como assim?

— Quero que me recuse. Mas não com desdém. Não por hábito. Quero que me recuse sabendo que poderia dizer "sim". E isso... será minha maior conquista.

Beatrice, por um instante, esqueceu de respirar.

Ele se levantou, inclinou-se numa reverência e disse com um sorriso enviesado:

— Boa noite, senhorita Fairweather. Durma com o pensamento de que amanhã... talvez me odeie um pouco menos.

E saiu, deixando atrás de si o aroma das flores silvestres, o eco da risada, e uma mulher completamente desconcertada — e perigosamente curiosa.

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