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Capítulo 3: A marca da vergonha

AVISO DE GATILHO: ABUSO SEXUAL E VIOLENCIA (Se não se sente confortável com esse tipo de conteúdo, pule este capítulo)

Não havia mais esperança.

O som da festa já era só um eco distante, ficando cada vez mais baixo a medida que Lyra era arrastada para o calabouço. Nunca tinha ido ao local porque iria? Era destinado aos piores criminosos… Agora ela estava sendo tratada como um desses na verdade, pior que eles pois sua punição era desumana, cruel, asquerosa. Qualquer criatura que tivesse um coração pulsante em seu peito sabia que aquilo era além de errado, que era uma abominação, mas aqueles homens pareciam não ter coração, ou consciência. Eram vis, maus, não se podia nem dizer que eram selvagens, pois a selvageria é guiada por instinto, e nenhuma criatura tem um instinto tão tenebroso como a vontade que guiava aqueles lobos.

A luz das tochas projetava sombras monstruosas nas paredes do calabouço, e quando as portas de ferro se fecharam com um baque que reverberou em seus ossos, ela soube: ali não existia deusa, nem justiça, apenas maldade, apenas crueldade. Naquele momento, Lyra fechou os olhos e chorou silenciosamente, implorando a deusa da lua que a matasse de uma vez, não queria sofrer não daquele jeito…

A mão do líder calejada, cheirando a vinho rançoso, agarrou seu queixo com força suficiente para trincar os dentes, cravando os dedos no queixo da omega e obrigando-a a encará-lo.

— Das ômegas, você é a mais bonitinha. — O hálito dele a atingiu como um soco, quente e ácido. — Que sorte a nossa que o Alfa te jogou fora.

O ambiente cheirava a morte: ossos esmagados sob as botas, ferrugem nas grades, e algo pior, o odor adocicado de desespero, aquele que grudava na garganta. Os homens ao redor não eram mais humanos; eram sombras com dentes, olhos brilhando como facas no escuro. Aquilo era tudo o que ela enxergava o pior tipo de monstro, daqueles que deveriam estar trancafiados na parte mais sombria do inferno.

Mas estavam bem ali na sua frente.

Lyra foi jogada contra a parede, o impacto fazendo sua testa se abrir num corte profundo que fez o sangue escorrer por seu rosto, manchando a pele clara e delicada. Alguém gargalhou quando ela caiu de joelhos, um gemido escapando de seus lábios.

— Então essa é a rejeitada do Alfa?

As mãos deles eram aranhas, rastejando por suas pernas, cintura, cabelos, marcando território.

— Você devia agradecer — murmurou um, os dedos entrelaçando-se em seu pescoço. — O Alfa podia ter te matado, mas ele deixou você… brincar.

Ela tentou falar, mas a voz falhou.

— Vocês não podem fazer isso… Eu… eu sou…

— Nada. Você é nada… — o segundo soldado cuspiu as palavras, se abaixando na frente dela e acertando a bochecha com um tapa forte. — Só carne pra gente usar. Ninguém liga para o que a gente fizer com você, ninguém se importa.

Tudo virou um espetáculo distorcido de medo e dor, os soldados a assustavam de propósito, fazendo-a se encolher, batendo nela em algum momento rasgaram suas roupas, deixando-a nua, gargalhadas felizes com seu sofrimento, unhas cravando em sua coxa, o estalo de tecido rasgado. Alguém a chutou nas costelas, e o grito que saiu dela foi engolido por um pano sujo enfiado em sua boca.

E então…

O cheiro.

Ferro em brasa, carne prestes a queimar.

Lyra arregalou os olhos.

— Não… por favor… Já chega… Não aguento mais…

Mas a voz dela já nem era humana, era um chiado de animal encurralado e machucado.

Do fundo da cela, um soldado trouxe a marca: um ferro em forma de lua quebrada, vermelho como o inferno.

— Fica quietinha, flor — o sorriso dele tinha o mesmo brilho de um machado afiado. — Vai doer menos, ou não.

Quando o metal tocou sua pele, o grito de Lyra ecoou no ar.

Era como se o próprio sol tivesse caído sobre suas costelas, a carne chiou, o cheiro de queimado enchendo a cela, misturando-se ao sangue, ao vômito, ao medo. Ela não desmaiou de imediato, o corpo a traiu, mantendo-a consciente por segundos que viraram séculos, até seu cérebro finalmente apagar como uma vela na tempestade.

Mas foi um apagão que durou apenas até o proximo chute na boca do estômago, quando acordou, estava nua no chão de pedra, a marca latejando como um segundo coração, o ar lhe faltando nos pulmões.

A noite não acabava, parecia longe disso.

— Agora vamos brincar, omegazinha… — um deles disse, se aproximando enquanto mexia nas calças, abrindo-a.

Os soldados se revezavam como cães em um açougue, cada um deixando sua marca em Lyra, sangue sob as unhas, marcas de mordidas no ombro, vergões roxos pulsando em suas coxas. Ela já não gritava, seus lábios estavam rachados, sua voz agora já não existia a garganta doía, mas tudo doía, até suas lágrimas haviam secado.

Um deles a puxou pelos cabelos, cuspindo na sua nuca enquanto ria:

— Até pra isso você é ruim, nem geme direito.

Outro a virou de bruços com o pé, revirando-a como um animal abatido:

— Olha só, já tá mole que nem trapo. Achei que os ômegas aguentavam mais.

Lyra já não estava ali, seu espírito flutuava no teto imundo, observando seu próprio corpo ser despedaçado sem dó. Era só carne, só ossos, só um saco vazio onde antes habitava uma loba.

Até que a porta se abriu.

Um soldado mais jovem entrou, nariz torcido de nojo:

— Acabou a farra, o alfa mandou descartar.

O líder, ainda afivelando o cinto, deu um chute nas costelas de Lyra, a marca queimou de novo, mas ela nem sequer gemeu.

— Levanta, lixo, você vai dar um passeio.

Ela não reagiu, seus membros não respondiam, seu coração mal batia.

— Porra, tá fingindo de morta?

Então um soldado jogou um balde de água nela, a água gelada a atingiu como um chicote, ela tossiu, sangue e líquido escorrendo pelo queixo.

— Melhor assim — riu um deles, enrolando seus cabelos molhados no punho. — A floresta tá cheia de bicho com fome, vão adorar uma refeição quentinha.

Ela não era mais Lyra.

Era um fardo.

Era resto.

Dois guardas a arrastaram como um saco de estrume, seus pés arrastando linhas vermelhas na pedra. Saíram com ela do calabouço sem sequer cobrirem seu corpo, qualquer um que estivesse por perto podia ver a cena deplorável e cruel.

Ao longe Camilla assistia. Havia saído da festa depois de rejeitar seu companheiro e foi até lá para aproveitar a humilhação da omega que foi escolhida pela deusa no seu lugar, mas mesmo com toda raiva e toda a inveja que tinha de Lyra, vê-la naquele estado fez seu estômago se revirar e ela não conseguiu não vomitar, em pânico.

— Minha deusa… — sussurrou, a voz trêmula, chorosa e apavorada. — O que fizeram com ela?

Se um dia ela desagradasse Kael, seria mandada para aquele calabouço também? Apesar de tudo, Lyra merecia aquilo? Sabia que não, mas agora não podia fazer nada, não podia arriscar seu pescoço.

Quando a carroça apareceu, jogaram a omega dentro com menos cuidado que um pedaço de lenha.

O último soldado cuspiu nela antes de

— Se algum renegado te encontrar primeiro, reza pra que ele te coma rápido.

A carroça sacudiu, levando-a para a escuridão.

Não reagiu, o balanço da carroça fez seu corpo doer, mas já havia se acostumado com a dor, não havia mais nada que pudesse ser quebrado nela porque tudo já foi destroçado naquela noite. Na noite de seu aniversário.

O céu estava coberto por nuvens espessas, engolindo a lua como se até ela se envergonhasse do que acontecia naquela noite. A carroça rangia a cada solavanco, levando consigo o que restava de Lyra. Seu corpo nu, encolhido entre farrapos e palha suja, tremia com o frio da madrugada, mas mais ainda pela dor. Seus olhos estavam inchados, o rosto machucado, o sangue seco colado à pele como uma lembrança cruel do que havia vivido.

Seguiram até depois da fronteira, avançando no terreno dos rogues até estarem distantes da alcateia, distante o bastante para que Lyra nem sequer sonhasse em voltar.

— Vai logo, idiota, j**a essa coisa aí e vamos voltar. — grunhiu um dos soldados, puxando as rédeas com impaciência. — Esses renegados devem estar à espreita, não quero acabar dilacerado por causa dessa desgraçada.

O outro bufou, descendo da carroça.

— Nem sei por que não matamos ela de uma vez, a gente poupava trabalho.

— Ordem do Alfa. Disse que ela devia apodrecer aqui, do lado de fora, como lixo.

O segundo soldado gargalhou, agarrando o corpo inerte de Lyra pelo braço.

Ela gemeu fraco quando foi erguida à força.

— Acordada ainda? — ele murmurou, num tom cínico. — Tsc. Forte demais pra uma omega, fiquei até surpreso.

Sem qualquer cuidado, ele a arrastou pelo chão pedregoso e a jogou como um saco de batatas na terra fria, bem no meio da terra de ninguém, a zona dos renegados, lobos sem lei, expulsos ou fugidos, brutais e imprevisíveis.

— Aproveita sua nova casa, cadelinha — disse o soldado antes de cuspir próximo ao corpo dela. — Se tiver sorte, morre antes de virar brinquedo deles.

— Vamos logo — resmungou o outro, já com uma tocha na mão. — Esse lugar fede.

Os dois subiram na carroça e partiram em disparada, o som das rodas sumindo lentamente entre as árvores.

Lyra permaneceu ali, sozinha. O corpo rasgado, a pele marcada. A vergonha queimava mais que a marca em sua costela. Tinha sido rejeitada diante de todos, humilhada, castigada como se não fosse gente, como se seu único erro tivesse sido existir.

A grama úmida sob sua pele era o único consolo.

A dor latejava.

Cada osso.

Cada músculo.

Ela queria gritar, mas sua garganta estava seca, ferida demais, queria correr, mas não conseguia sequer se mexer. Queria viver, mas nem isso parecia justo, não depois daquilo tudo. Nunca mais seria a mesma haviam lhe tirado tudo, não restou nada estava quebrada demais para se reconstruir.

Olhou para o céu cinzento, onde a lua mal conseguia brilhar, seus lábios rachados se moveram numa prece.

— Deusa da Lua... — sussurrou, a voz embargada, os olhos marejados. — Se ainda está aí... se ainda ouve os que foram esquecidos... por favor... me leva.

Ela fechou os olhos com força, apertando os punhos contra o peito nu.

— Eu não aguento mais. Eu só... só quero que pare. Por favor, só quero descansar.

Silêncio.

Por um segundo, pensou que a morte tivesse atendido. O mundo pareceu quieto demais, imóvel.

Mas então, o farfalhar das folhas começou.

E veio o som.

Passos.

Pesados.

Rápidos.

E depois... rosnados.

O sangue de Lyra gelou.

Ela sentiu o cheiro de terra, de pelo molhado, de fúria.

Lobos.

Os renegados estavam perto.

Abriu os olhos e viu, entre os troncos das árvores, olhos dourados brilhando no escuro.

— Por favor... — murmurou, baixinho, a respiração entrecortada. — Que seja rápido...

Ela fechou os olhos mais uma vez, o corpo entregue, o coração pulsando em desespero. O som das patas se aproximava. Veloz. Preciso.

Ela não resistiu.

Apenas esperou.

Esperou que tudo acabasse.

Esperou, enfim, a paz da morte.

E ali, enrolada em seu próprio sangue, só pensou:

"Que a morte seja menos cruel que os vivos."

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