Do corredor, Joaquim, ouviu cada palavra. O maxilar travou ao ouvir a amiga falar sobre onde elas iriam. A ideia de Alina saindo para um bar, rodeada de outros homens e rindo, dançando, mexeu com algo dentro dele que ele não queria reconhecer.
Mais tarde, quando Alina desceu as escadas pronta para sua noite de folga, usava um vestido simples, mas que delineava sua silhueta com naturalidade, os cabelos soltos caindo sobre os ombros. Joaquim es-tava no hall de entrada, apoiado casualmente no corrimão, um copo de uísque na mão. Ele a observou por um momento, os olhos percorrendo-a dos pés à cabeça com um misto de irritação e algo mais profundo. — Vai sair? — Perguntou, a voz baixa e grave. Alina parou, surpresa com a presença dele ali. — É… sim. Minha noite de folga. — Sei — respondeu ele, o olhar intenso e inexpressivo. — Não volte tarde. — Sim, senhor — murmurou, desconcertada, e apressou o passo, sentindo o coração acelerar sem con-trole. Enquanto a porta se fechava atrás dela, Joaquim permaneceu parado, o copo de uísque suspenso diante dos lábios. Uma pontada de irritação — ou seria ciúmes? — Atravessou seu peito. “É só a babá”, repetiu mentalmente. Mas, mesmo dizendo isso a si mesmo, não conseguiu afastar o incô-modo ao imaginar Alina se divertindo longe dali. Por volta das três e meia da manhã, Alina finalmente abriu a porta da mansão, tentando ser a mais silenci-osa possível. Tirou os sapatos e andou na ponta dos pés, segurando a respiração. Mas, antes que pu-desse chegar à escada, percebeu a luz da sala acesa. Ao virar a cabeça, encontrou Joaquim sentado no sofá, o copo de uísque praticamente vazio na mão. A gravata solta, a camisa aberta nos primeiros botões e os cabelos levemente bagunçados. Os olhos escu-ros estavam fixos nela, e o que deveria ser um sorriso era apenas uma linha tensa no rosto. — Resolveu voltar, hein? — A voz dele saiu baixa e rouca, carregada de ironia. Alina engoliu em seco, surpresa com o tom. — Eu... é, voltei agora. Ele bufou, balançando a cabeça. — Agora? São quase quatro da manhã. A babá resolveu virar a noite? Ela tentou manter a calma, mesmo sentindo o coração disparar. — Eu... tinha combinado com as minhas amigas. Não achei que… — Não achou que o quê? — Cortou ele, levantando-se do sofá. Cambaleou levemente antes de recuperar o equilíbrio e andar na direção dela. — Não achou que eu fosse perceber? Que eu ia me importar? — Desculpe, senhor Joaquim… — murmurou ela, abaixando a cabeça. Ele parou a poucos passos dela, a sombra alta e imponente, o cheiro do uísque se misturando com o per-fume caro que sempre usava. O olhar intenso percorrendo o rosto dela, demorando-se mais do que deve-ria. — Não precisa se desculpar. Você é livre para fazer o que quiser… fora daqui. — Ele soltou um riso curto e amargo. — Mas não me faça acreditar que essa... liberdade não afeta o trabalho. Alina sentiu o rosto corar, as palavras dele lhe atravessando como lâminas. — Eu sempre cumpro minhas funções. Isabela nunca ficou sem cuidado. — Veremos amanhã — murmurou ele, dando um passo para trás, ainda a observando com um olhar que misturava irritação, desejo e algo mais profundo. Ela tentou sair dali rapidamente, mas antes de subir a escada, ouviu a voz dele de novo, mais baixa e car-regada de algo que não conseguia decifrar: — Boa noite, Alina. — Boa noite, senhor — respondeu, a voz trêmula. Ela subiu as escadas com o coração acelerado, sentindo o olhar dele queimar suas costas. Quando che-gou ao quarto, encostou-se à porta e respirou fundo, tentando acalmar a confusão de sentimentos que tomava conta de si. Joaquim permaneceu na sala, encarando o copo vazio na mão antes de soltá-lo sobre a mesa. O som se-co ressoou na quietude da casa, e ele soltou um suspiro frustrado. “Ela é só a babá”, repetiu para si mesmo. Mas, por mais que tentasse se convencer disso, não conseguia apagar da mente a imagem dela naquela noite. Na manhã seguinte, o sol entrou preguiçoso pelas janelas da mansão. Alina acordou com a claridade ba-tendo no rosto e o coração ainda acelerado da noite anterior. Passou a mão pelos cabelos e respirou fun-do, tentando se convencer de que aquilo havia sido só um deslize, um momento desconfortável com o pa-trão que logo seria esquecido. Vestiu a roupa de trabalho – uma calça confortável e uma blusa discreta – e desceu para a cozinha, onde a governanta, dona Alice, já preparava o café da manhã.