O caminho de volta foi tranquilo, embalado pelo som dos pneus do jipe sobre a terra e o farfalhar das folhas ao redor. O céu já começava a escurecer, tingido de laranja e azul profundo, enquanto o sol desaparecia por completo atrás das montanhas.
Ela dirigia em silêncio, ainda absorvendo a calma da vista que tinham deixado para trás. Ele estava ao lado, encostado no banco, os braços cruzados sobre o peito e um sorriso discreto no rosto, como se ainda estivesse preso àquele momento no lago.
Quando se aproximaram do prédio principal do refúgio, luzes surgiram entre as árvores, e algumas vozes podiam ser ouvidas à distância.
Ela freou suavemente diante da entrada, onde dois funcionários uniformizados estavam parados, visivelmente nervosos. Um deles segurava discretamente um celular, tentando parecer casual. O outro sussurrava algo, olhando na direção do jipe.
Ele percebeu a movimentação, sorriu e, antes de descer, lançou um olhar divertido para ela.
Ela riu, balançando a cabeça.
Ele desceu do carro com um sorriso despreocupado, erguendo as mãos como quem se rendia.
Os dois funcionários riram, visivelmente aliviados, e um deles respondeu:
Enquanto eles tiravam uma rápida selfie com ele, ela desligava o motor e descia do jipe, os braços cruzados, um leve sorriso nos lábios. Observava a cena como quem testemunha dois mundos distintos se cruzando — o dela, feito de rotina simples e pés na terra, e o dele, cercado por flashes e olhares curiosos.
Quando ele terminou de posar, caminhou até ela, o sorriso ainda mais escancarado.
Ela inclinou levemente a cabeça, indicando a entrada do prédio.
— Só se a babá não me deixar sozinho — respondeu ele, com um tom leve e brincalhão.
Ela deu um leve empurrão no ombro dele com a ponta dos dedos, rindo.
Entraram juntos no prédio principal. A luz artificial tomava o lugar da claridade suave do fim de tarde, e o som abafado de vozes e passos ecoava pelos corredores. O cotidiano os envolvia novamente — mas havia algo diferente ali. Uma leveza, como se o silêncio entre eles ainda carregasse o reflexo do lago.
Assim que passaram pela porta, foram recebidos por ruídos vindos do corredor principal. Ela seguia à frente, o semblante mais sério, o boné ligeiramente torto sobre o cabelo preso, o rádio chiando de tempos em tempos no cinto.
Mais à frente, um homem surgiu em meio ao movimento. Vestia a camiseta do refúgio, manchada de terra, os cabelos escuros presos num coque baixo e o rosto marcado por olheiras, cansaço — e algo mais difícil de decifrar. Parou ao vê-los.
— Aí está você — disse ele, o olhar direto nela. — O Felipe tá te procurando. Parece que o filhote de anta deu uma escapada de novo.
Ela soltou um suspiro resignado, como quem já conhecia aquele roteiro.
Léo lançou um olhar lento e avaliador para o ator, cruzando os braços sem dizer uma palavra.
— Sei. — O tom era direto, mas não hostil. — O refúgio tá virando ponto turístico de celebridade agora?
Ela tentou disfarçar o sorriso.
Léo arqueou uma sobrancelha e voltou o olhar para o ator.
— Tô tentando — respondeu ele, sorrindo tranquilo, com as mãos nos bolsos. — Ela não facilita muito.
— Ainda bem — murmurou Léo, lançando mais um olhar protetor antes de se afastar pelo corredor.
Ela observou a troca por um momento, sem dizer nada. Depois se voltou para ele, com um meio sorriso:
— Achei ele divertido — respondeu ele, sorrindo também. — Meio cão de guarda, mas com personalidade.
— Ele só cuida do que importa — disse ela, e seguiram lado a lado pelo corredor.
O céu começava a escurecer quando chegaram de volta ao prédio principal. Os portões estavam fechados, os turistas já tinham ido embora, e o silêncio natural dominava os arredores, quebrado só pelo canto distante das aves e o vaivém dos últimos funcionários.
Na entrada, Léo já os esperava, com a expressão mais séria que o habitual, os braços cruzados e o rádio apertado na mão.
Ela franziu o cenho, mudando o passo, mais alerta.
— Sim. Os batimentos do filhote tão fracos. A Luciana tá preparando a sala, mas talvez a gente precise intervir.
— Certo. Me dá dois minutos.
Virou-se para ele, que a observava com atenção, e falou com um brilho diferente no olhar:
Ele hesitou, surpreso.
Antes que ela respondesse, Léo cortou:
Ela deu de ombros, sorrindo sem tirar os olhos do caminho:
Saiu andando determinada, o boné afundado na cabeça, passos firmes sobre o chão de terra batida.
Ele olhou para Léo, um sorriso de canto nos lábios, e com tom desafiador disse:
Sem esperar, seguiu-a.
Léo ficou parado por um instante, olhando o ator com um leve sorriso desconfiado. Balbuciou para si mesmo:
O tempo parecia se arrastar enquanto ela se concentrava no cuidado com a leoa. Cada movimento seu era preciso, sem pressa, e o silêncio entre os três só era interrompido pelo som do batimento cardíaco da Kira e os suaves suspiros da leoa.
O ator, agora mais calmo, segurava a lanterna enquanto ela ajustava os últimos detalhes para garantir que o parto acontecesse da maneira mais natural possível. Léo, parado à porta, ainda com uma expressão fechada, não conseguia desviar os olhos da cena. Por mais que não quisesse admitir, estava impressionado com a calma e a habilidade daquela mulher.
A tensão no ar finalmente se dissolveu quando a leoa emitiu um rosnado baixo, seguido pelo choro delicado de um filhote ecoando pela sala. A primeira cria estava ali, em segurança. Ela olhou para o ator e sorriu suavemente:
O ator, impressionado, não conseguiu esconder o sorriso ao presenciar aquela cena. A leoa, agora exausta, segurava o filhote com cuidado, que balançava a cabecinha em busca do calor da mãe.
O silêncio que se seguiu foi dos mais profundos que ele já experimentara. Não era o silêncio de um set de filmagem, nem de estúdios vazios. Era um silêncio cheio de significado, de vida, de natureza.
Léo se aproximou, agora com um olhar diferente. Algo em seu rosto suavizou — talvez orgulho por testemunhar aquele nascimento, talvez admiração pela mulher que fazia o impossível parecer simples.
— Ela vai ficar bem, não vai? — perguntou o ator, ainda observando a leoa e o filhote.
Ela assentiu, sem desviar os olhos, mas com uma resposta clara e tranquila:
O momento foi interrompido pela leve vibração do rádio que Léo segurava, mas ninguém se apressou em falar. Estavam todos absorvendo aquele milagre.
Lá fora, o sol começava a se pôr, tingindo o céu de laranja e roxo. Ela olhou pela janela, admirando a paisagem, e pensou em como o mundo poderia ser perfeito em instantes como aquele.
— Vamos sair — disse, quebrando o silêncio.
Caminhou até a porta, parou e se virou para os dois homens:
Léo, ainda um pouco reticente, olhou para o ator, que permanecia absorto na visão do filhote e da mãe. Ele não soube dizer o que o havia tocado mais — se a cena em si ou a pessoa ao lado dele.
Ao saírem, a tranquilidade do fim do dia envolveu todos. O refúgio, agora vazio de turistas, parecia mais íntimo, como um segredo compartilhado apenas por aqueles dispostos a ver a vida em seus momentos mais simples e puros.
O ator olhou para ela, sem palavras, mas com um olhar que dizia tudo. Ela, como sempre, não precisou responder. O dia havia sido longo, mas terminara de um jeito que ele jamais imaginara.
Ele se virou para Léo, com um sorriso leve:
Léo balançou a cabeça, sorrindo.
Quando chegaram ao prédio principal, o sol já havia desaparecido, e o refúgio estava completamente em silêncio, dominado pelos sons suaves da natureza ao redor. A noite começava a se aproximar, trazendo uma sensação de encerramento.
O ator caminhava ao lado dela, as mãos nos bolsos, e um silêncio confortável entre eles. Estavam prestes a seguir caminhos diferentes, mas o momento parecia suspenso, como se algo mais estivesse por vir, embora ainda fosse cedo para saber.
Ao chegarem perto da saída, o ator hesitou, então perguntou, a voz suave e curiosa:
Ela balançou a cabeça, um sorriso discreto se formando:
Deu um passo em direção à saída, mas parou, olhando para ele com sinceridade:
Ele sorriu, levantando uma sobrancelha, tentando entender se ela estava se despedindo ou apenas sendo educada. Deu um passo descontraído em sua direção, parecendo querer dizer algo, mas sem saber o quê.
— Talvez outro dia? — sugeriu, sem pressionar.
Ela olhou para ele, com um leve sorriso, mas algo no olhar permanecia distante, uma barreira invisível. Não queria se deixar levar por um encantamento fácil, não ainda. Talvez não fosse o momento certo.
— Quando precisar de uma babá de novo, quem sabe — respondeu, com um sorriso confiante, mantendo a distância sutil. Era a forma dela de controlar a situação, sem deixar que a aproximação fosse mais rápida do que desejava.
Ele riu baixinho, a tensão entre eles quebrada por uma troca leve.
Ela acenou com a cabeça, pronta para seguir em frente. Ele a observou por um instante, antes de entrar no carro.
Enquanto ele dirigia, uma sensação de antecipação permaneceu no ar. Não sabia quando a veria de novo, mas algo lhe dizia que aquela história estava longe de terminar.
Enquanto o carro se afastava, ela permaneceu ali, sentindo o eco daquele dia pulsar no peito. A vida no refúgio seguia seu curso — implacável, silenciosa, mas cheia de pequenas revoluções. E, no fundo, sabia que algo novo começava a se desenhar, como o primeiro raio de sol antes da aurora.