Ele estava parado próximo à cerca onde a vira com a onça mais cedo, observando o vai e vem dos visitantes e funcionários, quando ouviu o ronco discreto de um motor se aproximando. Virou-se a tempo de vê-la chegar num Jeep envelhecido pelo sol e pela poeira dos caminhos do santuário, ela desceu e o deixou estacionado.
Ela parou ao lado dele, abriu um leve sorriso — mais por educação do que simpatia — e disse:
— Pronto para a visita guiada, Sr. Bennett? — ela pergunta quando se aproxima, a voz carregando um tom levemente provocador.
— Achei que tivesse me esquecido — ele responde com um sorriso tranquilo — mas ainda estou aqui. Comportado. Sem assustar nenhum filhote.
— Ainda é cedo pra te dar um selo de bom comportamento — ela diz, virando-se para guiá-lo pela trilha — mas quem sabe até o fim do passeio...
Eles caminham por entre árvores altas e passarelas de madeira. Jade fala dos animais, das histórias de resgate, do trabalho da equipe — mas sem floreios. Ela não tenta impressioná-lo, apenas compartilha. E isso o cativa ainda mais.
Em uma clareira, ela para diante de um cercado maior, onde um lobo-guará caminha lentamente, atento ao ambiente.
— Esse é o Inácio. Resgatado de um cativeiro ilegal. Chegou assustado, sem confiar em ninguém. Ainda está se adaptando.
— E agora? — ele pergunta, observando o animal com respeito.
— Agora... ele observa antes de se aproximar. Mas tem dias em que ele vem até a cerca só pra ficar perto da gente, em silêncio. Acho que, às vezes, só estar ali já é o suficiente.
As palavras dela o tocam mais do que ele esperava. Talvez porque ele entenda, agora, o que significa esse tipo de aproximação — lenta, silenciosa, construída aos poucos.
— Sabe... — ele começa, virando-se levemente para ela — quando te vi ali com o filhote, mais cedo... teve algo que mexeu comigo. A forma como você estava presente. Como se não existisse mais nada além daquele momento.
Ela se surpreende, mas não desvia o olhar.
— É isso que os animais nos ensinam. A estar de verdade. Sem máscaras, sem roteiros.
— Faz tempo que eu não me sinto assim — ele confessa, a voz mais baixa — inteiro num lugar.
O silêncio que se segue não é desconfortável. É como se ambos precisassem daquele espaço para digerir o que sentem. E então ela interrompe o silêncio.
— Vamos, a partir de agora a visita será com o Jeep — ela dá um sorriso e pergunta enquanto caminham em direção ao Jeep —
— Já comeu alguma coisa? Se eu sou babá de celebridade, preciso cuidar dos mínimos detalhes, imagino.
Ela levantou uma sobrancelha, sem responder, apenas balançando a cabeça enquanto se virava para o volante.
Ele assentiu com a cabeça e subiu no Jeep, se ajeitando ao lado dela, enquanto o motor voltava a roncar, engatado no caminho de terra batida.
O Jeep avançava devagar pela trilha de terra, entre árvores altas e sons naturais que pareciam abafados pelo silêncio entre eles. Ela mantinha os olhos à frente, mãos firmes no volante, enquanto ele olhava para o lado de fora, absorvendo cada detalhe como se quisesse memorizar o lugar.
— Esse é um dos nossos corredores principais — ela disse, finalmente quebrando o silêncio. — Os animais circulam livremente por aqui em certos horários, então evite sair do carro, por mais fotogênica que pareça a paisagem.
Ele assentiu, mantendo o tom leve:
Ela soltou um som quase risada, abafado, como se tivesse se arrependido no meio do caminho.
Um grupo de cervos atravessou o caminho mais à frente, fazendo-o se inclinar levemente para o lado do carro, observando com atenção.
Ela franziu o cenho, lançando um olhar rápido para ele.
— Algo montado, talvez. Mais show, menos essência. Mas aqui... é diferente.
Ele virou o rosto para ela, estudando sua expressão, mas ela continuava focada na estrada. Havia algo nela que ele ainda não decifrava — uma força calma, quase bruta, mas não fria.
— Acho que é por isso que eu quis voltar hoje — ele disse. — Era só curiosidade ontem, mas agora... acho que estou tentando entender o que tem aqui.
Ela não respondeu, mas dessa vez o silêncio parecia menos distante. O Jeep continuou seu caminho, com o som dos pneus esmagando a terra seca misturado ao canto dos pássaros. E, mesmo sem palavras, havia um começo de conexão ali — frágil, sutil, mas real.
Ela virou ligeiramente o rosto para ele, arqueando uma sobrancelha.
Ele sorriu de canto, como se tivesse deixado escapar mais do que pretendia.
Ela soltou um suspiro, como quem já estava acostumada a ser lembrada por aquilo.
Ela lançou um olhar breve na direção dele.
Ele sorriu, dessa vez mais genuíno.
Ela não respondeu, mas uma leve tensão na mandíbula denunciava que não estava totalmente à vontade com o rumo da conversa.
Ele a observou por alguns segundos antes de responder, agora mais sério:
Ela olhou de relance para ele de novo, mas dessa vez com menos dureza no olhar.
Ela desviou o olhar para a trilha adiante e disse, quase num sussurro:
— A confusão era toda sua, se quer saber.