A escada estava quase vazia, apenas a vibração abafada da música escapando pelas portas fechadas. Meus pés doíam dentro dos saltos, e tudo o que eu queria era chegar ao camarim, tirar a maquiagem, trocar de roupa e desaparecer dali.
Respirei fundo, tentando ignorar a sensação familiar de alerta que sempre surgia nesses momentos. Mas então eu o vi. Encostado em um dos pilares, como se tivesse todo o tempo do mundo, estava ele: Gabriel, o sócio sobre quem todas as meninas falavam. Um homem que parecia alheio ao ambiente, mas impossível de ignorar. O terno escuro moldava seus ombros largos, a gravata estava perfeitamente alinhada, e o relógio caro refletia a pouca luz do corredor. Mas o que realmente prendia meu olhar eram os olhos dele, fixos em mim com uma intensidade quase predatória. Meu corpo travou por um instante. — Nora — disse, a voz grave deslizando pelo meu corpo como uma carícia indesejada. Arqueei a sobrancelha, surpresa. — Como você sabe meu nome? — Não costumo me interessar por alguém sem saber o mínimo a respeito. — Ele deu um passo lento à frente, suficiente para que a luz atingisse seu rosto. Um sorriso discreto surgiu em seus lábios. — Interessar? — repeti, tentando manter firmeza, mas minha voz saiu baixa demais. — Você me entende. — O olhar dele percorreu meu rosto, descendo sem pressa até os ombros. — O que vi lá na sala VIP não foi só uma dança. Foi… algo raro. — Eu estava apenas fazendo meu trabalho. — Apertei a alça da bolsa contra o ombro, tentando criar uma barreira invisível. — É isso que você chama de trabalho? Fascinar, hipnotizar? — Ele riu baixo, quase irônico. Aproximou-se mais, diminuindo a distância entre nós. — Confesso que nunca vi alguém executar tão bem. Desviei o olhar, tentando ignorar o calor que subia pelo meu pescoço. — Se for elogio, já ouvi muitos iguais. — Não. — Ele balançou a cabeça, firme. — Nunca ouviu nada igual, porque nunca causou isso em alguém como eu. A ousadia da resposta me deixou muda por alguns segundos. Respirei fundo, tentando recompor-me. — Escute, não sei o que você acha que está acontecendo, mas eu não… — hesitei, procurando as palavras certas. — Eu não atendo fora da boate, se é isso que está insinuando. — Não foi uma insinuação. — Um sorriso lento surgiu nos lábios dele. — Foi uma pergunta direta. — A resposta continua sendo não. — Cruzei os braços, tentando proteger-me da tensão que ele trazia. — Dinheiro não seria problema. — A voz dele era calma, mas havia uma firmeza que me deixou desconfortável. — Pagaria bem. Meu estômago revirou. — Você é muito presunçoso! — falei cada sílaba com clareza, tentando manter a indignação acima do nervosismo. — Então, se eu reservasse outra sala privada… você dormiria comigo de graça? — Ele arqueou a sobrancelha, com um ar divertido. — Não sou prostituta! — A firmeza da minha resposta era mais por mim mesma do que por ele. Ele não negou, apenas manteve aquele olhar fixo, penetrante, atravessando qualquer máscara que eu tentasse usar. — Só estou acostumado a conseguir o que quero. — Respondeu simples, quase como se falasse sobre o tempo. O silêncio que se seguiu foi quase sufocante. Eu podia ouvir minha própria respiração acelerada, o coração batendo forte. E ele continuava ali, imóvel, apenas me observando, como se tivesse todo o controle da situação. — Pois comigo vai ser diferente. — Murmurei, tentando recuperar a firmeza. — Eu não estou à venda. Gabriel inclinou a cabeça, avaliando minha expressão como se quisesse gravar cada detalhe. O sorriso dele transformou-se em algo mais sério, quase enigmático. — É exatamente isso que te torna interessante. Aquelas palavras me atingiram como um soco silencioso. Parte de mim quis responder, parte quis simplesmente fugir. Escolhi a segunda opção. Desviei o olhar e continuei descendo a escada. Atrás de mim, ouvi a voz dele, baixa, clara o suficiente para alcançar meus ouvidos. — Ainda vamos nos ver de novo, Nora. E quando isso acontecer, quero ver se ainda vai resistir desse jeito. Meu corpo inteiro estremeceu.