Inácio Amorim não sabia ler, mas não era burro. Nunca foi. O pescador era em si tão calejado quanto suas mãos, sabia que aqueles engravatados não seriam os últimos a tentarem comprar Santa Clara, seu lar, seu pequeno paraíso. E mesmo não sabendo ler, ele era capaz de ler coisas mais importantes do que documentos, ele lia pessoas. Sabia que aquela dondoca desbocada era mais um urubu rodeando seu lugar. Inácio jamais cederá sua casa, e sua família não está à venda. Júlia é empresária do ramo imobiliário, que quer algo diferente para a rede paulistana Mermaidy Resorts. Ela queria um projeto mais brando, algo com simplicidade e rústico, nada que seus resorts luxuosos ofereciam até então. Uma pousada cinco estrelas era uma boa pedida, e ela já tinha um lugar especial em mente: A ilha de Santa Clara em Alagoas, lugar que pedia exatamente algo mais simplista. Ela já tinha um plano: comprar, construir e levar a Mermaidy Resort para fora do Brasil. Júlia sempre consegue tudo o que quer. Um pescador que protege o seu lar com a sua vida, e se sente satisfeito com um belo pôr-do-sol no fim do dia. E uma ambiciosa CEO decidida à conquistar um paraíso que nunca teve preço. Duas almas completamente diferentes, mas com ligações inexplicáveis. Um romance que têm tudo para dar errado, e dessa vez vai dar... se o amor não vier a nado e a sereia não ficar presa em sua rede. PLÁGIO É CRIME - livro completo desde 2018
Ler maisSanta Clara é um pequeno ‘paraíso secreto’ localizado na região de São Miguel dos Milagres, em Alagoas, Maceió. Reduto de uma dúzia de famílias de pescadores tradicionais é uma ilha adornada de águas cristalinas e de um azul celeste pouco explorado, apesar de seus moradores terem o ofício que têm.
Durante o dia, os barulhos dos pássaros, o vai-e-volta das lanchas e barcos, e os caldeirões com os pescados do dia nos fogões á lenha, remetem a um tempo longínquo, acolhedor e familiar, assim como a noite na vila de Santa Clara. Quando a noite cai só se podem ouvir os pios das Corujas-Pretas bem comuns na região, a cantoria típica, e os estalos das fogueiras que eles acendem para os jantares da tradicional congregação há muito tempo celebrados. Antes de irem para as redes descansar para estarem de pé às cinco da manhã, todos os pescadores e seus familiares dançam, cantam, conversam, contam histórias e se divertem ao redor da fogueira convidativa.
Só quem entra e sai da ilha são seus moradores, mas o empíreo nem sempre fora assim tão excluso. Inácio Amorim se lembrava muito bem da época em que empresários da capital tentaram colocar as mãos sujas em suas terras, e ao pensar nisso podia sentir o gosto do asco na boca. De temporada em temporada Maceió tentava se aproximar e lucrar com a ilha como havia feito com a — agora famosa. — praia do Patacho.
A pesca completamente artesanal de manjubas e sardinhas é o seu ganha-pão e seus inimigos são, além da degradação do meio-ambiente que cada vez mais o assustava, era também a especulação imobiliária. Todavia, assim como suas próprias mãos, Inácio era um homem calejado por inteiro. Era esperto, conhecia o mar como a palma de sua mão e o tempo perfeito para navegar, um ótimo líder na comunidade, trabalhador, o melhor pescador da vila, o mais experiente apesar de não ser o mais velho, — quem disse que trinta e três é grande coisa?! — forte como um touro em todos os aspectos de sua vida, ‘ogro ou ignorante’ para quem merecia, e apesar de não saber ler muito bem, — tirando claro, as notas fiscais improvisadas que emitia para os mercadores em Maceió. — ele sabia ler como ninguém a fisionomia das pessoas. Se tinha uma coisa no mundo que ele sabia como ninguém, era ler as pessoas e usava esse seu dom para decidir em quem confiar, em quem podia dar seus tapinhas de camaradagem nas costas, para quem ele podia ou não sorrir, e principalmente, para quem ele podia virar as costas sem correr o risco de ter um facão fincado nelas. Mas falando nisso... ele não fora dessa forma sempre, não foi à toa que ficara calejado. Inácio já confiou demais em quem não devia e uma dessas pessoas é Lora, sua ex-companheira, e hoje, “cunhada”.
Agora... Júlia Monteiro era completamente o oposto. Dona de uma das maiores redes de Resorts do país, é extremamente ambiciosa e não mede esforços para conseguir o que deseja, principalmente no mundo dos negócios; ela gosta de dinheiro e assume o fato. Mata um leão por dia e precisa lidar com todo o tipo de pessoa que você possa imaginar. Nascida e criada em uma região de classe média alta de São Paulo, nunca teve nada de mais quando menina, e conseguiu tudo o que tinha na base da raça. Mesmo teus pais tendo toda a fortuna que tinham. Júlia fora preparada para enfrentar o mundo.
Dotada de um belo corpo, cabelos negros, sex appeal de sobra e bom gosto, tinha um charme genuíno, títulos, diplomas, posses, e uma mania “irritante” de nunca confiar de graça, mas conquistar a confiança de qualquer um para ter o que quisesse.
Ao contrário de Inácio, seu “ganha-pão” era fiscalizar seus mais de dez mil funcionários direto de sua sala presidencial no último andar da sede paulistana Mermaidy Resorts. Mesmo amante do mar e da natureza, seu ‘point’ era o asfalto, os melhores restaurantes de São Paulo, e os eventos mais seletivos da Terra da Garoa.
Tinha em seu nome uma sede em cada estado do país... menos Alagoas. E como sendo sua “última conquista” ao realizar o sonho de levar a Mermaidy para o Brasil inteiro, — sempre fora metódica. Antes de levar a companhia pra fora, ela estava decidida a conquistar o país por completo. — o lugar tinha que ser O lugar. Seu checkmate não podia ser a capital alagoana, Maceió era repleta de resorts para tudo quanto é gosto e bolso. Sendo assim, com tantas opções em uma região nordestina maravilhosa como tal, aquele investimento seria com certeza a verdadeira definição de ‘dinheiro indo pro ralo’ mais por causa da concorrência... Júlia queria mais, queria o exótico, queria algo que as pessoas só encontrassem no Mermaidy... ela queria um paraíso, e mais, um paraíso com um significado um tanto familiar pra ela. E ela conseguiria, ou seu nome nunca fora Júlia Monteiro.
Um pescador completamente coração que protege seu lar com a sua vida, e se sente satisfeito com um belo pôr-do-sol no fim do dia, e uma ambiciosa CEO decidida á conquistar um paraíso que nunca teve um preço. Duas almas completamente diferentes. Um romance que têm tudo para dar errado. E vai dar... se o amor não vier á nado, e a sereia não ficar presa em sua rede.
— Tu se lembras da história que eu te contei sobre como nasceu, não? — Sim, papai! — meu bichinho soa desanimado. — Que a mamãe me pariu na água, quando foi tomar um banho de mar. — Pois então. Tu nasceu literalmente nadando, Bê, não precisa ter medo. Não estou dizendo que tu é obrigado a saber, que estou “te onrigando”... mas tu mora em uma ilha, pequeno, seu pai se sentirá bem mais traquilo se você souber. Estamos cercados por água, se Deus me livre tu cai de nosso barco ou qualquer coisa do tipo? Não!!! Tu tens que saber se virar, parceiro! — eu digo com paciência, mas ele mantém a cabecinha abaixada em desanimo. Tinha medo da fundura mesmo que eu tivesse garantido que ali nos pés do deck ele podia ficar tranquilamente. Ali a água quase nem balançava, era serena demais...— Só aqui? Sem ir pro fundão???— Sem ir pro fundão, só aqui! — eu garanto e o pequeno com seus sete anos recém completados afirma com a cabeça e me estende os braços. Pego-
— PLÍNIO! SEGURA! — eu grito e ele pega Cristiano praticamente pela cintura antes que o mesmo caia na rede. — EU TÔ BEM, EU TÔ BEM!!! — Cristiano grita da traineira azul e Simas ri no meu ouvido. — Esse é o irmão do pescador velho de guerra! — Não torra, tu também não nasceu sabendo! — dou risada só que por dentro e ele ri mais ainda. — Eu nasci aqui nesse marzão, dentro de uma traineira. Nasci pescando manjuba!— E de nada adiantou se aprendeu e não sabe ensinar. — Ele é aprendiz seu, não meu! — Valeime!!! — Deixem o rapaz! — Tico se diverte. — Ou ele aprende, ou vira comida de peixe. Nossa preocupação agora é se essa rede subirá pra superfície cheia. Odoiá tem que nos tirar do castigo, ainda mais agora que Simas está pagando essa promessa dele!— Ela é mãe misericordiosa! — Simas diz e como se pudesse ouvir, um estrondo no céu se faz presente. Sabíamos que ia chover, mas não sabíamos que seria tão rápido. Ali eu
O bar de seu Olivas estava lotado hoje. Entro de uma vez após fitar seu interior pela janela de vidro circular e o encontro sentado no bar. É claro que mesmo “rico” ele não sairia daquela vida dele de bebedeira e simplicidade. Só o que prendia Plínio àquela cidade portuária era que ficar ali, era o mais perto que ele podia chegar de dona Silvéria. — Boa noite! — eu falo e eu bufa. — Eu não a vejo tem mais de um ano, cabra, me deixe em paz!!! — Eu não vim pra falar de Júlia! Eu também não a vejo tem muito tempo. Só vim te entregar isso. — arrasto o convite que Anália topou fazer para o evento e ele encara o envelope verde-água. Sinalizo para seu Olivas e ele logo me oferece uma garrafa. Viro um gole grande só pra começar...— Veio até aqui para me entregar um papel? Nem navegando está, virou às costas para mãe, eu soube... — Entrei em um barco pela primeira vez hoje, para vir até aqui, então acho que você pode fazer a gen
— Jú... — Laís entra após bater e eu me apresso em secar o rosto. — Laís, só entre se eu autorizar, por favor. — Desculpe, isso não vai mais acontecer. É que você tem uma visita!— Quem?— Celina. — Laís diz seu nome como se tivesse medo de pronunciar e eu não posso conter o rosnado grosseiro na garganta. — O que essa ordinária quer aqui? — Disse que vai esperar o tempo que for necessário e que o assunto é particular. — Mande-a entrar. Não entre atrás nem se escutar gritos, não deixe ninguém nos interromper. Se ela sair daqui se arrastando você não viu nada! — Está bem, com licença. — ela murmura impactada e eu arrumo minha postura. Quando a vaca entra carregando consigo apenas uma bolsa e nada de bom senso, consigo sorrir. Aparentava estar mais arruinada do que sempre foi. — Boa tarde, Júlia. — ela parece tristonha, mas ignoro o fato. — Diga de uma vez. — Posso? — ela apont
UM ANO DEPOIS“... eita, homem, tu precisa reagir! O caos dela era teu cais. Aconteceu, vocês não puderam prever. Se martirizar não vai adiantar. Vá atrás dela ou esqueça que ela existe, faça alguma coisa, mas levante desse sofá...”— Nácio... Sou eu, Mirna! (...) Nácio, por favor... abra a porta. Eu trouxe uma marmita! É o sururu da vó! Já tem tanto tempo... por favor, Nácio... é a Mirna! Se lembra? Sua amiga... A menina chorosa mia, ouço-a depositando a marmita no chão, e quando sai, eu coloco os papéis que ela me enviou alguns dias após sua partida no sofá, ao meu lado. O documento de exame de DNA que comprovava ser a Ari, uns papéis do processo que abriu contra os caras que se fizeram passar por ela que de acordo com Mirna, estava escrito que ela havia ganho a causa e os caras foram presos, o documento da ilha registrado em cartório comprovando o fato de que havia devolvido o terreno pro meu nome, e o divórcio pra eu assinar. Divórcio esse que eu ja
Pela primeira vez em toda a minha vida achava que todo aquele paraíso, aquelas cores, o verde contrastando com o marrom, o azul-celeste com o anil e o amarelo... tudo aquilo era inútil naquele momento. Antigamente me ajudava a distrair, a ver beleza nos meus dias mais sombrios, mas agora ficar aqui, do jeito que estava, sentado na areia e deixando o balanço das ondas me hipnotizar, ou pelo menos tentar, não estava ajudando. Não estava dando certo, eu não estava esvaziando minha mente. Eu só pensava nela. Nela e no que eu fiz. Seu atentado contra mim pouco significava naquele momento, pelo menos ao descobrir recentemente que eu estava “deixando de ser pai” antes de saber que havia me tornado um. Nada parecia fazer sentido. Sua chegada, ou melhor, retorno, a paternidade de Simas, nosso envolvimento rápido demais... nada fazia sentido se no fim perderíamos nosso bebê. O bebê que tanto pedi a Deus. — Oi. — Mirna se aproxima silenciosa e se senta do meu la
Último capítulo