“Ela tem a marca da besta. É amaldiçoada.” Amelie teve seu destino traçado ao nascer devido uma marca incomum, por isso, ela cresceu sob regras e cuidados intensos tanto do seu pai quanto da igreja. Então, ela aprendeu a ser obediente e a reprimir seus desejos. No entanto, depois de se casar, ela descobre segredos que não poderiam ser revelados e que, a regra que seu marido impôs de não sair de seu quarto à noite, tinha uma razão bem real: os enteados Willian e Arthur. Uma atração arrebatadora e proibida entre os três a coloca frente a frente com o maior dos pecados, desafiando a moralidade e suas crenças. E quando chega a lua cheia, ela se vê diante do inimaginável e cruel destino. Romance trisal Lobisomens
Leer másInglaterra, século XIX
Amelie
— Hmm…
Que barulho irritante…
Forcei-me a abrir os olhos. Que barulho insistente é esse essa hora da noite? Será algum vizinho?
— O que… Arthur? Willian? — Chamei, eu estava sozinha na cama.
Estava frio, o braseiro perto não estava sendo suficiente. Arrastei-me para a beirada da cama, o quarto estava escuro, a vela já tinha acabado.
— Willian? Arthur? — Chamei mais uma vez e apenas escutei novamente aquele barulho que parecia vir da cozinha.
Descalça, apenas coloquei o robe grosso por cima da camisola, a madeira deixava o chão menos frio nessa época de inverno. A casa feita de tijolos não tinha revestimento, então, era um pouco mais úmido, mas já havia um tempo que não desfrutava de conforto.
Era o preço a se pagar pelo meu pecado.
O pecado era tentador e, às vezes, não se conseguia mais sair dele, eu já não pensava tanto a respeito.
O barulho insistente vinha da cozinha, a porta dos fundos estava aberta, o vento a levava e trazia com força. Um pouco de neve tinha entrado, mesmo assim, pisei em cima dela para poder fechar a porta, mas a noite clara pela lua cheia me mostrou pegadas recentes que iam para os fundos.
Voltei para dentro e calcei as botas. Antes de sair, puxei o casaco grosso com capuz do gancho ao lado da porta. A neve tinha parado e o céu estava limpo, mas o vento continuava forte e gelado. Arrepiei-me ao sentir, ninguém em sã consciência saía de casa em um tempo como esse.
Willian e Albert estavam estranhos, silenciosos, trocavam olhares cúmplices, eles eram gêmeos, tinham uma união mais fortalecida, principalmente, devido ao passado, mas eu precisava saber o que estava acontecendo.
Minhas botas afundavam na neve fofa, meus dedos das mãos estavam frios, eu deveria ter calçado as luvas, mas a pressa e ânsia de descobrir para onde eles tinham ido era maior que os cuidados.
Por que não foram para a rua? Entrar na mata era perigoso, há tempos que esse lugar era assombrado por criaturas noturnas. Alguns diziam que eram lobisomens, outros afirmavam que eram demônios que viam castigar os pecadores, afinal, só desapareciam aqueles que erroneamente saíam de suas casas no meio da noite.
Não se sabia. Os moradores viviam aterrorizados, mas confiavam nas palavras do padre da pequena igreja no centro da vila. Ele dizia: “apenas tranquem bem suas casas e coloquem uma cruz na porta que espantará todo o mal”.
No fim, isso pareceu funcionar, contudo, ainda se ouvia sons aterrorizantes em algumas noites de lua como essa.
Eu estava temerosa por Willian e Arthur, eu os amava e não tinha mais ninguém além deles. O que farei se perdê-los? Graças a eles não sucumbi a loucura e as atrocidades desse mundo. Nós lutamos para escapar daquele lugar e foram eles que me fizeram enxergar um mundo novo, sentir o amor de verdade.
A fumaça se formava quando o ar saía da minha boca e nariz, as pegadas entravam na mata e segui, nessa época as árvores quase não tinham folhas devido ao frio severo, então a claridade entrava facilmente.
Assustei-me quando um barulho ecoou, olhei para trás e os lados, mas não havia nada próximo, depois de mais alguns passos, peguei uma roupa caída no chão, era de Arthur, estavam amontoadas e suas botas caídas mais na frente. Meu coração acelerou e apressei meus passos, logo encontrei outro monte de tecidos, eram de
— Willian...
Não estavam rasgadas e nem havia sangue, era como se… apenas tivessem sido tiradas.
O que está acontecendo?
Um vento frio mais uma vez atingiu minhas bochechas, ali entre as árvores e galhos finos ele fazia um barulho assombroso.
Minha capa engatou em um galho e ouvi o tecido rasgar quando puxei com força, meus dedos já estavam dormentes e de repente ouvi um grunhido seguido de um rosnado.
Olhei na direção que veio, os passos também iam para lá.
Hesitei, algo em meu íntimo me dizia para não prosseguir. Talvez fosse meu instinto de sobrevivência, porém, eu não podia simplesmente retornar depois de chegar até aqui.
E se fossem eles as vítimas?
Meus pés se comandaram ao ir. Eu estava com medo e senti falta do meu rosário que ficou para trás no dia que fugi, talvez Deus tivesse misericórdia de sua filha pecadora ao menos nesse momento.
Os sons ficaram mais altos à medida que eu me aproximava, de repente me vi andando em cima de um rastro de sangue que desejava desesperadamente que não fosse deles.
Foi então que vi.
Um pouco mais na frente havia uma mulher jogada no chão, suas vestes estavam rasgadas e o sangue manchava a neve ao redor. Eles…
Levei as mãos aos lábios para conter o grito, mas eles já estavam olhando para mim. As duas bestas cobertas de pelos escuros, focinho alongado, orelhas pontudas... O sangue escorria por seus dentes longos e afiados, mas os olhos brilhantes e estranhamente familiares olharam diretamente para mim.
O rosnado saiu da boca de um deles e dei um passo para trás, mas tropecei em algo. Apertei a neve ao cair e rapidamente me levantei.
Eles vieram e me desesperei mais.
Willian… Arthur…
Meu pé engatou em uma raiz e eu caí, antes de tudo escurecer senti a dor na cabeça e o cheiro de sangue.
AmelieMais uma pessoa tinha sido encontrada morta. Foi uma mulher jovem, seu corpo estava nas portas da igreja como se fosse uma afronta.Um mês havia se passado desde que o primeiro corpo foi encontrado e descobriram um padrão. As vítimas estavam ocas, sem os órgãos internos e algumas outras partes faltando. Elas tinham sido rasgadas.Heitor contou com riquezas de detalhes quando veio deixar o litro de leite diário. Ele estava assustado, porém, a curiosidade também o deixava eufórico e ansioso, afinal, era apenas um garoto com a mente fantasiosa. Ele não parecia ter noção do que estava acontecendo.Certamente, depois de mais uma vítima, a cidade estava mergulhada em terror. Se isso não fosse resolvido logo, esse lugar ruiria e logo a miséria tomaria conta. Respirei fundo antes de forçar-me a tomar o leite morno, além de estar em uma xícara pequena, estava pela metade, porém, meu estômago estava se recusando.Arthur ainda dormia, mas eu tinha a sensação de ter acordado no meio da no
Amelie— Não precisa ficar assustada, eu não estou julgando e nem comentei com ninguém. É apenas algo que observei.— E-eu não sei do que está falando. Arthur é meu cunhado. — Bom, se é assim, aconselho que sejam mais discretos. — Discretos? Por quê?— Eu percebi isso há um tempo, eles têm personalidades distintas quando se observa com mais atenção. E constatei várias vezes seu cunhado se passando pelo seu marido. Vocês se beijam igualmente.Meu coração ainda batia forte, aquele frio na espinha subia e se concentrava em minha nuca. Eu tinha sido descoberta, era uma questão de tempo para outras pessoas notarem, se é que já não tinham.— Oh, querida, não fique assim, estás pálida. Victória puxou-me e fui sem nenhuma resistência. Ela me fez sentar na poltrona e saiu por um tempo, quando voltou, trazia uma xícara de leite quente.— Eu pensei que conseguiríamos esconder — desabafei e bebi um gole do leite, estava adoçado com mel.— Acho que você ainda esconde bem e o fato deles serem pr
AmelieDois meses depois.Despedi-me de Willian em frente ao trabalho, Ele beijou meus lábios de forma casta, e depois de breves palavras, subiu no cavalo e partiu.Estava elegante, botas bem lustradas, roupas passadas e limpas. Eu já não me queimava tanto e nem as sujava de carvão ao passá-las. De certa forma, me orgulhava dessa tarefa bem feita.Mas eu também estava orgulhosa dele, há alguns dias, ele foi promovido, porém, agora ele trabalha por mais tempo, por isso, Arthur saiu e por enquanto cuida da casa e de mim. Não é o que desejo, seria justo que ele também crescesse como seu irmão, mas não negava o apreço por suas preocupações e cuidados.A cidade também está bastante agitada e perigosa. Vem acontecendo desaparecimentos, estamos todos preocupados. Além disso, existem muitas especulações e teorias infundadas. Alguns ousam dizer que se trata de um monstro que vive na floresta. Suspirei antes de entrar, havia nevado um pouco, as ruas estavam molhadas, mas ainda era muito pouc
AmelieA ponta do lápis deslizou bem pelos riscos já feitos. Desenhar era algo automático, eu não precisava me forçar para que os traços fossem feitos.A imagem na minha cabeça era nítida, meus sentimentos também. Dificilmente, sonhos eram tão lembrados e sentidos como esses que, de alguma forma, tinha algum significado.Mas eu não sei qual. Não entendo o que eles querem me dizer.O vento frio entrou pela janela, hoje eu tive coragem de sair da cama e sentar à pequena mesa da sala. Eu devia estar trabalhando, mas Willian decidiu que uns dias de descanso seria bom.Eu não o questionei tanto. Talvez ele tivesse razão, eu poderia cometer erros por estar distraída e Victória ficaria desapontada. E eu não gostava de decepcionar as pessoas.Continuei preenchendo aquela imagem, lembro-me que a última vez que desenhei, também fiz algo perturbador, tanto que ainda poderia reproduzir o mesmo desenho, apesar do tempo que se passou.Senti mais uma vez o vento bater em minha bochecha, faltava pouc
WillianJá era noite quando finalmente terminei o que tinha pra fazer. Segurava firmemente o caderno e os lápis, havia uma livraria em uma ruela mais escondida.Amelie certamente gostaria de ir lá, em um canto, tinha uma mesa com cadeiras confortáveis para tomar um chá durante uma leitura. Não comprei nenhum livro porque não sei sobre seus gostos.Em cidades maiores tinham teatros, restaurantes e outros lugares para levar uma mulher em passeios, eu não gostaria que vivesse como minha mãe, uma mulher enclausurada pela maldição dos seus filhos e marido opressor.Eu ainda iria lhe proporcionar conforto e felicidade, mesmo que custasse. Não serei como meu pai.Também avisei à aquela mulher sobre a necessidade de alguns dias de folga para Amelie, ela concordou, é claro, até se ofereceu para uma visita, mas dispensei. Não gosto dela.Essa mulher tem um cheiro estranho e um nariz empinado, ela não abaixa a cabeça como Amelie. Mulheres assim parecem ser perigosas. Além disso, ela vive sozinha
ArthurDepois daquele pesadelo, ela demorou para se acalmar. Eu acariciei seus cabelos e a mantive deitada em meu peito assim que Willian precisou se afastar. Antes disso, nós a mantemos acolhida entre nós.Ela pediu que abrisse a janela e permaneceu olhando para fora durante muito tempo. Estava frio, mas aquecido embaixo da coberta.Willian retornou para o quarto trazendo a sopa em um prato fundo. Estava cheirando bem, mas não despertava meu apetite.— Vamos comer, querida esposa. Levantei devagar e a ajudei a sentar. Ela estava de camisola, foi a primeira coisa que pediu quando se acalmou. Depois que acomodei as almofadas em suas costas, tomei o prato de Willian, ele que não se atravesse a me contrariar.Era sopa de… Não dava para saber, devia ser de vários legumes, estava tudo amassado e misturado.Sentei na beirada da cama e soprei um pouco antes de dar em sua boca. Para meu alívio, ela aceitou.Não gostava de ver seus olhos claros sem vida, eram tão belos, mas não sabia o que
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