CALEB
O sol já estava um pouco mais baixo quando voltei para o estábulo. Tex relinchou assim que me aproximei, como se soubesse que eu ainda estava com a cabeça cheia. Passei a mão no pelo dele, tentando acalmar tanto a ele quanto a mim.
Puxei as rédeas, ajustei a sela e subi, pronto para mais uma ronda. A poeira levantava à medida que cavalgávamos, e o som dos cascos no chão batia no ritmo que eu conhecia desde menino. No caminho, encontrei alguns dos meus peões reunidos perto do curral.
— Está tudo certo com o lote novo? — perguntei.
— Sim, chefe — respondeu Derek. — Só precisamos reforçar a alimentação, porque alguns estão perdendo peso.
— Façam isso hoje mesmo. — dei a ordem sem pensar duas vezes. — E mantenham os bezerros separados.
Eles assentiram, e então segui adiante.
De cima do cavalo, avistei a casa-sede. A filha de Savana estava sentada no banco da varanda, balançando as pernas, com Apollo, aquele traidor, deitado a seus pés. Savana apareceu logo depois, trazendo dois copos na mão, provavelmente com algum refresco. Fiquei observando de longe, sem ser notado. A cena era simples e, ao mesmo tempo, era estranho para mim. Aquela casa tinha ficado em silêncio desde a morte de Clint. Agora, de repente, voltava a ter risadas infantis ecoando pelos corredores, nova vida ocupava aquela casa.
Suspirei fundo e toquei Tex para continuar a ronda. Eu não podia me dar ao luxo de perder tempo com lembranças ou distrações. A Estância Solar era grande demais para alguém que não soubesse o que estava fazendo, e por mais que Savana fosse a herdeira, eu sabia que, sem orientação, ela não duraria uma semana ali.
De volta ao estábulo, ajudei Hudson a lavar Pegasus depois do treino. O garoto ainda era novo, mas tinha uma grande vontade de aprender.
— Chefe, é verdade que a nova dona vai morar mesmo aqui? — perguntou, curioso.
— É sim. — confirmei, enxugando o suor da testa. — E você trate de mostrar respeito quando ela estiver por perto.
Ele ficou vermelho e assentiu rápido.
Quando terminei todo o serviço, já estava escurecendo e decidi ir até a casa-sede, precisava convidar Savana e a filha para o jantar sob insistência do meu pai.
Bati na porta duas vezes até Savana abrir, ela ficou parecendo surpresa ao me ver.
— Caleb. — disse seca. — Veio reclamar que minha filha ainda está brincando com seu cachorro?
— Não. — respondi, tentando manter a calma. — Na verdade vim te chamar para jantar... Um convite do meu pai, que fique bem claro.
Savana me encarou por alguns segundos, como se tentasse decifrar minhas intenções.
— Tem certeza de que é um convite? Não parece muito entusiasmado.
— É um convite. — confirmei, sério. — E meu pai ficaria ofendido se eu não trouxesse vocês.
Ela suspirou e assentiu.
— Tudo bem. Vamos sim.
— Segundo ele, não é bom que vocês fiquem sozinhas logo no primeiro dia, sem nada na despensa.
— Muito gentil da parte dele.
Minha parte estava feita, tinha feito o convite para Savana então voltei a montar em Tex, fingindo indiferença. Mas, por dentro, sentia um peso diferente. Não era só educação.
O cheirinho de pão de milho e frango assado já tomava conta da casa quando ouvi vozes na varanda. Terminei de arrumar a mesa, fui atender abrir a porta, ali estavam Savana e Amber.
— Boa noite. — ela disse, num tom educado, quase formal.
Amber, por outro lado, entrou como se a casa fosse dela.
— Nossa, que cheiro bom! — exclamou a garotinha, correndo direto para perto da mesa.
Meu pai apareceu na porta que dava para a cozinha, com o pano de prato jogado sobre o ombro e abriu os braços.
— Chegaram as minhas convidadas! Sejam muito bem-vindas, meninas.
Amber não se fez de rogada e o abraçou como se já o conhecesse há anos. Savana hesitou por um instante, mas logo estendeu a mão para cumprimentá-lo. Eu observava em silêncio, tentando não sorrir ao ver a desenvoltura da pequena.
— Por favor, sentem-se que já vou trazer o jantar.
Ajudei meu pai a servir toda a comida preparada e então nos sentamos. Amber ficou do lado esquerdo do meu pai, tagarelando sem parar sobre Apollo e sobre como tinha amado o passeio pela cidade de manhã. Ele ria, parecia encantado com a vitalidade da menina, servindo mais suco para ela.
Savana, que estava sentada ao lado da filha, parecia um pouco deslocada, mas mantinha a postura. Notei como seus olhos percorreram a casa, as fotos antigas na parede, os móveis de madeira maciça. Era como se cada detalhe despertasse lembranças que ela tentava esconder.
Meu pai, claro, não ajudou a suavizar a situação.
— Sabe, Savana… parece que foi ontem que você corria por essa varanda atrás do Caleb, implorando pra ele brincar de casinha com você.
Amber arregalou os olhos, curiosa.
— Mamãe, é verdade?
— Não era bem assim… — Savana corou, desviando o olhar.
— Era exatamente assim. — retruquei, deixando escapar um sorriso debochado. — Eu tinha que me esconder pra ter um pouco de paz.
Ela me lançou um olhar afiado por cima da mesa, e por um instante voltei a ser o garoto implicante de antigamente.
Meu pai, rindo da troca de farpas, tentou mudar o rumo da conversa.
— E agora vocês estão de volta, sentados juntos na mesma mesa. A vida é engraçada, não acham?
Amber apoiou o queixo nas mãos e soltou:
— Eu acho que a gente devia jantar assim sempre.
O silêncio que se seguiu foi pesado. Savana ajeitou a toalha de guardanapo no colo, evitando me encarar. Eu me limitei a passar a travessa de frango adiante, mas por dentro… algo em mim se mexeu com as palavras da garotinha.
O jantar continuou entre risos e histórias contadas por meu pai, mas a tensão entre mim e Savana seguia firme, como brasas escondidas sob a cinza, prontas para reacender a qualquer momento.
— Amanhã você pode me ensinar a andar de cavalo? — Amber me perguntou.
— Se sua mãe deixar, eu posso te ensinar sim.
— Você deixa mamãe?
— Vou pensar sobre o assunto.
— Savana, você já montava perfeitamente na idade dela, deixa a menina aprender também. — Meu pai se intrometeu.
— Você tem razão.
— Então você vai deixar, mamãe?
— Sim, você pode aprender a montar.
— Eu te amo mamãe.
Depois do jantar, Savana e Amber foram embora e eu fui lavar a louça enquanto meu pai ia assistir seu jogo de beisebol.