Cerberus finalmente estava livre, depois de anos na solidão, na angústia e nos maus tratos, ele agora era um homem livre, bom... Ele tinha certeza de que era livre, mas talvez não fosse exatamente um homem.
Cerberus também cresceu no internato, sua ida para lá foi conturbada e triste. Ele foi arrancado de seu lar quando tinha apenas 13 anos, trancado por dias sem água, comida ou luz, sentiu medo, fome e vontade de morrer.Depois ele foi transferido para uma sala que possuía uma cadeira, um colchonete e uma pequena janela com grades e claro, correntes, ele foi mantido acorrentado por muito tempo. Sempre que gritava, que batia em quem entrava na sala era punido, lhe tiravam a comida ou o colchonete.Ele passou a odiar tomar banho, não era uma prática muito frequente, mas sabia que era um banho quando o caçador, como era chamado, entrava com um balde frio, jogava sobre ele e saía. O caçador era o pior de todos, gostava de torturar Cerberus e não sabia o motivo. Cerberus não teve amigos, regalias, ou aulas para se distrair, não teve nada do que ele Helena teve.A Cerberus cabia os trabalhos pesados, ele gostava de estar ao ar livre, mas só era levado para fora quando tinha que cortar lenha, carregar algo pesado ou tiras os espinhos que cresciam nos muros atrás do internato. Ele fazia isso com as próprias mãos, geralmente a noite e sob a mira de uma arma. Se tivesse chance, usaria o machado na cabeça de seu algoz.Os gritos, os sons que as moças ouviam eram dele, era Cerberus tentando se libertar e ser humano. O menino que outrora uma das jovem viu correr, também era ele, quando pela primeira vez um de seus algozes deixou uma porta aberta, ele correu, correu por sua vida, mas deu de cara com a mulher perversa que comandava esse lugar, ele não teve para onde correr, foi pego e mais uma vez castigado.-------O caçador, como era chamado, voltou para seu posto, tinha que informar que Cerberus havia fugido.— Então, senhora diretora, é isso... Acho que o perdemos de vez.— Maldição! — Ela gritou e bateu na mesa, se levantou e começou a andar pelo espaço. — Tantos anos o treinando, o educando e quando estamos perto, ele foge. Isso não é bom! Nada bom.— O que faremos agora? — O homem perguntou com medo.— Temos o material genético, vamos usar antes que se perca, precisamos de alguém do sangue dele. Esse é o combinado.— Mas como faremos isso?A mulher coçou a cabeça e seu olhar parou em um bilhete, uma anotação lembrando-a de que na semana seguinte todas as meninas passariam por uma consulta de rotina.— Temos algumas meninas mais velhas aqui, estão esperando o dia do casamento, sairão daqui direto para o altar. — A diretora pegou as fichas das meninas e folheou algumas. — Essa aqui... Ela tem 18 anos, mas ainda não tem um noivo, será perfeita.-----------Helena passou por aquilo que acreditava ser uma consulta ginecológica, não era a primeira e com certeza não seria a última.Ela continuou indo semanalmente aos estábulo, levava em sua bolsa um lanche e uma maçã. Agora era tinha um motivo forte para fazer isso.A rotina já durava um mês, Helena chegava na clareira no meio da floresta que era aos fundos do internato, sentava na pedra grande e aguardava.Naquela tarde ela estava ali fazia muito tempo, e nada de seu novo amigo aparecer.— Acho que hoje ele não vem... — Helena disse a si mesma e se levantou. Estava fazendo um carinho no cavalo antes de desamarra-lo, quando ouviu os passos fortes atrás de si.Ela se virou e sorriu para ele.— Cerberus, você demorou! — Helena disse e pegou na bolsa o sanduíche e a maçã.Cerberus comeu de costas para ela, parecia envergonhado que ela o visse naquele momento, talvez tivesse noção de que não tinha modos como ela.A própria Helena deu a maçã a égua que ele levou, acariciou a crina que agora estava sem brilho, o animal precisava de cuidados.— Ela está magra, e você também... Estão se alimentando?— Pouco... — Cerberus disse baixo.— Da próxima vez trago mais comida, eu deveria ter pensado nisso antes... Bom, tenho que ir. Estou proibida de montar, mas não deixarei de vir.Helena pretendia pegar o cavalo e voltar, mas sentiu-se tonta e foi segurada por Cerberus.O coração dela disparou naquele momento, mais do que na primeira vez. Seus olhos fixaram nele, nos cabelos desalinhados, no olhar escuro e ao mesmo tempo encantador.— Cerberus... — O nome dele saiu em um sussurro, ela por um instante fechou seus olhos, pensou que se fosse beijada ali por ele, seria perfeito.Mas Cerberus não o fez, ele não entendeu o que Helena queria, apenas a levantou e ela ficou tímida, sentindo-se rejeitada por ele.Um vento gélido soprou naquele momento e Helena olhou as roupas de Cerberus, ela sabia que ele tomava banho no rio ali próximo, pois algumas meninas relataram ter visto um homem, grande ali, mas ao ser notado, ele subiu no cavalo e partiu.— Fique com isto, vai te aquecer a noite. — Helena entregou sua capa para ele, que primeiro cheirou o tecido.— Vamos por aqui, ele foi visto por aqui. — Uma voz se aproximava naquele momento.Cerberus colocou a capa nos ombros e pegou sua égua, fugiu, refugiando-se entre as árvores ali.— Helena? — Era a diretora do internato. — Eu já lhe disse que na sua condição não pode andar a cavalo, o que faz aqui?— Senhora, eu só vim tomar ar, eu...— Escute aqui mocinha! — A diretora disse segurando forte o braço de Helena. — Não me desobedeça, tenho muito a perder se fizer isso! Se colocar em risco...— Meu braço, está me machucando! — Helena disse com a voz dolorida.Ela olhou Cerberus entre as árvores com os dentes cerrados e negou com a cabeça, ele não deveria intervir, ou seria pego novamente.— Vamos, acho que que cavalo que ouviram é dessa fujona! Ficarei de olho na senhorita de agora em diante!Helena partiu e Cerberus tinha que fazer o mesmo, pois ali não era mais seguro para ele.Cerberus resolveu ir mais longe, sairia da floresta para a cidade, buscaria refúgio entre os homens, homens esses que ele odiava, pois só lembrava da maldade causada por eles.Ele pensou se alguém o reconheceria, se reencontraria alguém de seu sangue, sua mãe, pai ou talvez quem ele mais amava, seu irmão. O irmão mais velho, era seu exemplo, Cerberus desejava ser como Hades quando crescesse, não esperava ser afastado dele por tanto tempo.Cerberus chegou a parte mais movimentada da cidade, era na verdade um pequeno vilarejo, onde as pessoas passeavam pelo centro da cidade.Parecia improvável alguém o socorrer, mas ele precisava de ajuda e aprendeu a acreditar no improvável... Pois também era improvável que conseguisse fugir, mas ali estava ele.Cerberus perambulou pela cidade até o anoitecer, com o cair da noite, ele estava com fome e frio, precisava se alimentar, e de um lugar para deixar a égua que lhe ajudou na fuga.Ele passava na frente de um restaurante muito elegante, as pessoa
Cerberus surgiu do meio das árvores, e Helena sorriu, ficou feliz de ver Cerberus bem.— Eu disse que voltaria e você está lindo! Seu cabelo está muito bonito... — Ela estendeu a mão para tocar, mas Cerberus recuou um passo.Helena pegou o sanduíche e deu a ele, Cerberus comeu de costas como sempre, limpou a boca com o braço e seu olhar se voltou para ela.— Cerberus, onde está o meu cavalo? Você a perdeu? — Helena perguntou com as mãos na cintura.— Em casa... — Aquilo era bom, Cerberus agora tinha uma casa, um lar.Um barulho foi ouvido dentre as árvores e Helena se assustou, ela pulou para trás de Cerberus no mesmo momento em que Apollo surgiu a sua frente.— Calma moça, não precisa ter medo de mim. — Apollo disse de onde estava, não se aproximou muito para não assustar Helena.— Amigo, Apollo é amigo. — Cerberus disse e Helena relaxou.— Se conhecem faz muito tempo? — Apollo perguntou.— Faz algumas semanas, nos conhecemos aqui... Eu sempre venho e agora tenho um ótimo motivo. — O
O restante do dia, Helena passou em seu quarto, não teve fome ou vontade de nada, passou seus dias isolada no lugar destinada a ela.— Ela está aqui, a isolamos para que as outras internas não pensem em fazer o mesmo, sua filha é uma má influência para as outras. — A diretora dizia ao abrir a porta.Logo em seguida, passaram a mãe e o pai de Helena. Ela se levantou prontamente e tentou abraçar a mãe, mas o pai a impediu.— Não toque em sua mãe, garota imunda! Se deitou com um rapaz qualquer e carrega agora o preço de sua vergonha. Diga Helena, quem? Com quem se deitou? — O pai gritou cada palavra, deixando Helena assustada.— Com ninguém papai, eu juro! — Ele dizia a verdade, mas em sua condição era difícil acreditar.— Acha que é uma virgem santa? Que vou acreditar que esse bebê é um milagre? Não sou bobo Helena, se está grávida é porque um homem teve, diga quem é para que eu exija uma reparação.Helena chorou alto, ninguém acreditaria nela, nem mesmo seus pais. Como explicar uma gra
Cerberus chegou bravo, mais bravo e inquieto do que nos últimos meses. Diferente dos outros dias ele se trancou no quarto, não comeu e mal dormiu.No dia seguinte, nem mesmo Apollo conseguiu fazê-lo abrir a porta, bateu e até ameaçou arrombar, mas nada fez Cerberus ceder.Por fim, o irmão de Cerberus foi chamado. Hades se manteve distante, não interferia no tratamento ou nas atitudes do irmão, pensara até que o carinho outrora nutrido por ele estava também perdido.— Cerberus, é o Hades... Abra e converse comigo! — Hades tinha nas mãos uma garrafa de vodka, se o irmão nunca tinha bebido, hoje teria o seu primeiro porre.Cerberus abriu e antes que Apollo também passasse, Hades fechou a porta.— O que quer? — Cerberus disse e voltou para sacada, sentou-se no chão e olhava o horizonte, na verdade, olhava em direção ao internato, sentindo-se ferido por Helena.Hades não respondeu, ele abriu a garrafa e deu um gole longo, sentou-se na cadeira ao lado de Cerberus que estava no chão. Estende
Morar em um lugar afastado era bom, ninguém o viu chegar coberto de sangue, ser levado por Apollo para um banho e depois se deitar exausto em seu tapete.Apollo por um momento ficou preocupado, o olhar perdido de Cerberus o lembrou os primeiros dias sem Helena, parecia um animal, alguém sem alma vagando em busca de consolo.Seria muito ruim se esse consolo fosse matar, se Cerberus encontrasse sua alma arrancando as dos outros.Por sorte, não foi assim que as coisas aconteceram. Cerberus aprendeu sim a matar em meses e tinha agora uma profissão, um ganha pão, não dependeria da família rica, apenas de si e das armas que aprendeu a usar.------Durante esses meses em que Cerberus exercia sua maldade, Helena vivia alheia e solitária, voltava algumas vezes a floresta disposta a implorar que Cerberus a levasse com ele caso ele aparecesse, mas ele não apareceu.Com a chegada do inverno, chegou também o fim da gestação de Helena, era hora de uma criança vir ao mundo.Era cedo e Helena estava
Enquanto isso o homem alto e forte que acompanhava as consultas de Helena estava lá, ele foi avisado pela diretora do nascimento e precisava ter certeza de que a criança era saudável.— Deixe-me vê-lo! — O homem pediu.Ele segurou o bebê em seus braços e sorriu, sorriu pensando que seu plano estava completo, que aquele menino belo e pequeno lhe daria tudo que um dia ele quis.— Senhor, e agora? O que fazemos com a mãe? As mensalidades pagas pelos pais já acabaram. — A diretora perguntou.— A jogue na rua, o bebê fica, pois preciso dele.— Terá que pagar alguém para cuidar da criança aqui.— Faça o que tem que fazer, esse menino não vai viver muito tempo, tenho apenas uma ponta solta e depois poderei executar meu plano como se deve. — Ele devolveu a criança a enfermeira e depois partiu.Helena recebeu de volta seu filho, mas tinha que se recuperar rápido, pois sua estadia ali estavam com os dias contados.-------O primeiro mês de Helena foi uma tormenta. A diretora não a mandou embora
Na semana seguinte tudo estava pronto, Helena tinha sua documentação em dia e estava casada com Cerberus sem nenhum dos dois saberem.Hera foi pessoalmente no sítio e o fez assinar diversos documentos, alguns dizia ser referente a empresa, outros de cunho pessoal, pois o filho perdido ainda tinha documentos pendentes. Entre eles estava lá papéis do casamento, Cerberus confiava demais na mãe para ler antes de assinar.Helena foi forçada a assinar o documento de sua parte, primeiro a diretora disse que era um contrato de trabalho, mas assim que iniciou a leitura soube que se tratava de um casamento. Por fim, Helena tinha que escolher, ou se casava ou era jogada no olho da rua.A tarde Hera estava lá, na porta do internato, pronta para levar a esposa de Cerberus para o seu destino.— Helena, isso não faz parte do contrato, já disse! O bebê fica! — Era a voz da diretora, alterada esbravejando.Hera se aproximava do quarto quando ouviu a gritaria.— É meu filho, meu! Não posso deixá-lo.—
As malas de Helena foram levadas para um quarto menor, ali havia uma cama de casal, um banheiro e um guarda-roupa. Para ela era mais do que o suficiente.Enquanto isso Apollo tentava inutilmente falar com Cerberus.— Se acalme, ela pode não ter culpa, e o menino é mais inocente ainda.— Aposto que o pai é o cavalariço, por isso ele a deixa sair mesmo sem permissão, era gentil com ela sem pedir nada em troca, ou no caso, ela já dava a ele algo. — Cerberus se corroía com as especulações de sua mente. — Mas se ela pensa que lhe darei paz, que viverá aqui sem problemas, está muito enganada, desejará partir depois do que vou fazer com ela.— Cerberus, não pode machuca-la, culpada ou não, você não tem esse direito. — Apollo era a voz da razão naquele momento. Tentava chamar Cerberus a realidade.Quase a noite o motorista da mãe de Cerberus voltou, ele trouxe alguns itens de bebê. Roupas quentes para Helena e para o menino. Trouxe também um carrinho de bebê e um pequeno berço, conhecido como