O céu estava cinzento naquela manhã de quinta-feira, e uma brisa úmida parecia anunciar que algo prestes a acontecer seria irremediável. Alice passava um pano sobre o balcão da pequena cozinha, mas sua mente estava a quilômetros dali — ou, mais precisamente, de volta ao instante em que os olhos de Daniel encontraram os seus, no cemitério, dois dias antes.
Desde então, o tempo parecia escorregar entre os dedos. Cada minuto era uma lembrança e, ao mesmo tempo, uma fuga.
A presença de Daniel havia balançado as estruturas que Alice, com tanto esforço, tentava reconstruir. Ele não havia dito nada que ela já não soubesse, e ainda assim, cada palavra vinda dele parecia conter um veneno doce: o tipo que a alma não rejeita de imediato, mas que lentamente intoxica a razão.
"Está tudo bem, filha?" — a voz fraca de Dona Elvira rompeu o silêncio da cozinha.
Alice se apressou em enxugar as mãos e foi até a mãe, que descansava na cadeira de balanço encostada à janela. Apesar da saúde frágil, Dona El